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É possível aliar defensivos e controle biológico?

Pesquisador afirma que com monitoramento de pragas uso de agrotóxicos deve ser pela metade


Foto: Marcel Oliveira

Um trabalho realizado há anos pela Embrapa Soja, de Londrina/PR, traz importantes sugestões para o manejo de pragas na lavoura. O chamado MIP (Manejo Integrado de Pragas) sugere que se aplique a metade do inseticida necessário na cultura de soja.  O restante seria feito com controle biológico de pragas. A economia ao produtor rural chega a cerca de R$ 157 por hectare, levando em consideração se ele fazia cinco aplicações de inseticida como sugere o manejo convencional. O pesquisador Samuel Roggia conversou com o Portal Agrolink e explica como é possível aliar economia com produtividade.

Portal Agrolink – A pesquisa defende que um conjunto de práticas pode reduzir em até 50% os gastos com defensivos. Como isso é possível?
Samuel Roggia -
Tudo depende de como é feito o manejo da lavoura. A gente se refere, principalmente, ao uso de inseticidas. A Embrapa desenvolve um trabalho em parceria com Emater, Senar e universidades no Paraná que mostra os efeitos, principalmente sobre a cultura da soja. É possível reduzir a aplicação pela metade através do uso racional. Quando um agricultor vai na lavoura fazer o manejo de pragas ele deve levar em consideração duas informações importantes para controlar ou não controlar: quanto de praga tem e que espécie é? Antigamente se usava pouco produto ou nenhum produto para diversas pragas da lavoura. Hoje é diferente. A gente faz todo um esforço de amplo espectro de mercado  com produtos químicos inovadores mas  a característica é que eles controlam poucas espécies de pragas. São bons para algumas lagartas mas não tão bons para outras. Por isso é fundamental para o agricultor saber qual espécie está atacando a lavoura dele, fazendo o monitoramento constante. Às vezes acontece de mais de uma espécie estar atacando a plantação  e ele tem que tomar a decisão por aquela que predomina, que oferece maior risco ou maior dificuldade de controle. Quando ele faz o acompanhamento de lavoura através da amostragem ele consegue ter uma determinação muito boa de qual praga está ali. Isso orienta a escolha do melhor produto e saber se é mesmo necessário aplicar um defensivo. Todo esse cenário é embasado em um esforço grande de pesquisa, o que a gente chama de nível de ação . É importante que se diga que todas as culturas elas têm um determinado nível de tolerância às pragas e isso está na capacidade dela de compensar as perdas causadas por essas pragas.  Varia de acordo com a época de ataque e com a estrutura que é atacada. No caso da soja se o prejuízo é na vagem a tolerância da planta é menor. Agora se esse ataque ocorre na folha a planta tem uma tolerância maior. Se for o caso de folhosas como a alface ou na cultura do tabaco é o contrário. Se o dano é na folha o prejuízo é maior. É preciso levar em conta que o produtor de soja tem lá uma tabela de quanto é tolerável de infestação. Se passa disso ele deve aplicar o produto químico para evitar que o ataque continue e gere perdas econômicas. Procedendo com esse conjunto de práticas é possível essa redução de 50%. 

Portal Agrolink: De que forma o produtor faria essa análise para definir o manejo e para que pragas é mais eficiente no caso da soja?
Samuel Roggia:
A dúvida maior dos produtores é se não aplicar inseticida não vai ter perda de produtividade? Os dados de pesquisas mostram que mesmo reduzindo a aplicação a produção se mantém dentro do desejado porque a gente conta com monitoramento e a tolerância da própria planta.  Esperando o momento correto e esperando que a planta reaja a essas pragas dentro do nível de tolerância.  Uma outra coisa importante dentro desse processo todo é a ação dos agentes de controle biológico como predadores, uma grande variedade de insetos até mesmo aranhas e outros bichos que se alimentam das pragas, ovos, pulpas, larvas e até mesmo adultos, uma série de parasitoides como moscas ou vespas que colocam seus ovos ou em cima ou dentro dos insetos como, por exemplo, dentro de lagartas ou na superfície do corpo delas causando a morte delas . Existem também doenças causadas por fungos que atacam os insetos de acordo com as condições ambientais. Todos esses agentes naturais são eliminados quando se aplica um produto químico na lavoura. Então quanto mais a gente puder esperar para aplicar melhor é a concentração desses agentes, que agem gratuitamente a favor da cultura.  Já existem empresas que produzem e comercializam agentes de controle biológico. Isso auxilia os agentes que já existem na natureza e aumenta o esforço.  Os mais comuns são bactérias, vírus e parasitoides que podem ser adquiridos pelo agricultor. Ao esperar a planta combater se dá espaço para esses agentes. Se a gente ganha tempo combatendo as pragas de uma lavoura de forma natural reduz a aplicação de agroquímicos.

Portal Agrolink: A Embrapa Soja chegou a fazer testes em relação a isso? Quais foram os resultados?
Samuel Roggia:
Desde a fundação da Embrapa Soja (1975) a equipe de Entomologia tem trabalhado nisso. Desenvolvendo as bases de conhecimento necessário e atualizando, porque ao longo desse tempo a produção comercial de soja no brasil teve mudanças importantes. Hoje temos resultados práticos colhidos a campo. Anualmente são 200 resultados em lavouras do Paraná, onde o agricultor tem trabalhado com assistência técnica. Temos programas que qualifica o produtor e transmitem esse conhecimento junto com nossos parceiros, formar quem trabalha no campo, como fazer amostragem, identificação de pragas e como agir. Tem toda uma parte científica. O MIP está numa fase onde esse conhecimento já é aplicado e tem tido bons resultados.

Portal Agrolink: O programa está disponível somente para soja?
Samuel Roggia :
O MIP ele existe para todas as culturas. A diferença é que para algumas houve um esforço ao longo do tempo do ponto de vista da pesquisa, de desenvolver, adequar e investigar as técnicas, conhecendo a biologia das pragas, a tolerância das plantas e o ambiente. Toda essa base para a soja é fruto de um grande esforço do Brasil nisso. A soja tem sido um modelo desse sistema em grande escala e um exemplo para outros países.


Portal Agrolink: Você acredita que o futuro está em manejo sustentável, controle biológico ou a cabeça do produtor ainda projeta sucesso somente com uso somente de agrotóxicos?
Samuel Roggia:
Os agricultores têm perfis muito diferentes. Tem aquele mais resistente a métodos alternativos.  Apesar de que o MIP não é não aplicar inseticidas e sim aplicar de forma racional. Têm agricultores que estão conscientizados mas  não tem conseguido sucesso  na implementação por questões gerenciais da propriedade ou por não terem um bom ambiente para isso. Tem outro grupo que está consciente. Busca informação e tem aplicado uma parte da área que é mais controlável. E tem os que usam plenamente o MIP e tem obtido os benefícios. E isso se reflete ano a ano.  Estudos mais controlados, em área ampla, mostram que ao longo do tempo a quantidade de inimigos naturais está aumentando nas lavouras. O objetivo é não perder produtividade. A gente tem visto alguns casos de pragas já resistentes aos inseticidas e isso e um risco ao controle químico. Esse uso racional auxilia a combater essa resistência. É a mesma coisa que uso indiscriminado de antibióticos. Mesmo sendo eficientes a Medicina percebeu que uma grande exposição de bactérias aos remédios tornava a bactéria resistente. Na agricultura é o mesmo se você não faz rotação e manejo correto. O controle biológico aumenta a vida dos inseticidas, entrando como aliado. Eles não são inimigos um do outro.
 

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