Negociadores do Mercosul e da União Européia iniciam hoje uma nova rodada de discussões sobre o acordo de livre comércio, em Assunção, sem nenhuma expectativa de tocar no ponto de maior interesse do bloco sul-americano e de maior sensibilidade dos europeus - o acesso a mercado de produtos agrícolas. A reunião do Comitê de Negociações Birregionais (CNB), que se desenrola até o dia 27 na capital paraguaia, trará como novidade a tentativa de um acerto entre a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e as montadoras européias, com o objetivo de liberalizar o comércio do setor o quanto antes.
Segundo o chefe da missão do Brasil junto à União Européia, embaixador José Alfredo Graça Lima, a perspectiva de discutir agricultura nessa rodada independe do processo interno europeu de definição sobre a proposta de reforma de sua Política Agrícola Comum (PAC), o arcabouço legal que permite ao bloco impor barreiras protecionistas e desembolsar anualmente cerca de US$ 67 bilhões em subsídios.
Para Graça Lima, os europeus "não iriam poder nem querer" discutir acesso a mercado em Assunção, mesmo que o projeto suavizado de reforma apresentado pelo comissário europeu para Agricultura, Franz Fishcler, tivesse sido aprovado na semana passada em Luxemburgo.
A proposta da PAC, flexibilizada nas reuniões ocorridas nas últimas semanas pelos 15 parceiros da UE mais seus dez novos sócios, ainda está sem definição. Novo embate entre os países que defendem a reforma e os que resistem até mesmo a uma versão suavizada - liderados pela França - deverá ocorrer somente depois da reunião de cúpula do bloco em Tessalonica, na Grécia, nesta semana.
Quanto mais suavizado for o resultado dessa reforma, mais entraves haverá nas discussões da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), onde a expectativa seria de pesadas negociações sobre o desmantelamento das estruturas de subsídio e de protecionismo agrícola, em prol do desenvolvimento e da inclusão ao comércio mundial de países emergentes e dos mais pobres. No caso do acordo Mercosul-UE, previsto para ser concluído em janeiro de 2005, as dificuldades de uma reforma minimalista não seriam menores.
Nesta semana, ambos os lados terão sua primeira rodada de negociações depois que os blocos apresentaram suas ofertas revisadas, em Bruxelas, no início de março. A expectativa é que as discussões envolvam temas técnicos relevantes, como as regras de origem, a facilitação de negócios e o mecanismo de solução de controvérsias. Mas os debates não alcançarão as ofertas de acesso a mercados.
A maior expectativa está na possibilidade de andamento do acerto entre as montadoras, uma iniciativa da Anfavea que poderá repetir a bem-sucedida experiência do acordo de preferências tarifárias entre o Brasil e o México.
Em março, o Mercosul havia melhorado consideravelmente sua proposta inicial de abertura de mercado para o comércio de bens, o que permitiu enquadrá-lo na exigência da OMC de abrangência de mais de 80% da pauta do intercâmbio e neutralizar as principais críticas dos europeus. Mas a UE praticamente não mexeu na sua oferta, que exclui produtos agrícolas de especial interesse do bloco sul-americano. No dia 30 de abril, ambos os lados trocaram suas ofertas para serviços, compras governamentais e investimentos. O Mercosul, entretanto, nada encaminhou no capítulo sobre compras governamentais.