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Fortalecer o ABC


Cons. Científico Agricultura Sustentável

Por Coriolano Xavier, Vice-Presidente de Comunicação do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), Professor do Núcleo de Estudos do Agronegócio da ESPM.

Desde que foi criado, em 2010, o Programa ABC para financiamento da agricultura de baixo carbono nunca apresentou 100% de desempenho, comparando recursos ofertados e contratados. Já bateu 90% em 2012/13, mas recuou depois: na safra 2015/16 a contratação foi de 68% (R$2 bilhões) e caiu mais em 2016/17, ficando em 63% (R$1,8 bilhão). Essa redução vem sendo atribuída às incertezas da crise brasileira, à elevação dos juros e à atratividade de outras linhas de crédito. Mas, é bem provável que seja tudo isso e mais um pouco.

Em abril deste ano, o Observatório ABC divulgou estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) que corrobora isso¹. O trabalho foi conduzido em área do Mato Grosso e pesquisou a percepção de produtores rurais, técnicos e agentes financeiros sobre as condições de acesso, pagamento e desenvolvimento de projetos dentro do Programa ABC. Nesse estudo, os pesquisadores detectaram vários pontos que podem estar alimentando certo desinteresse pelo programa.

Um dos fatores é sua perda de competitividade nos juros, que começaram em 5,5% ao ano e hoje chegam a 8,5% -- nível superior ao do Pronaf (agricultura familiar). Em áreas onde a maioria dos produtores já tem acesso a esta modalidade, automaticamente cai a atratividade do ABC, que também perde apelo para linhas como o FCO. Isso foi observado na região estudada pela FGV, em que o Pronaf era alternativa viável para cerca de 80% dos produtores.

Os agricultores também percebem o programa como complexo, burocrático, demorado, com muito vai e vem do processo. Vários mostram baixo conhecimento das características e benefícios do ABC, sem contar a natural instabilidade na margem dos produtores, que pode impactar sua capacidade de endividamento. Pecuaristas com falta de alternativa de vendas e suinocultores afetados pela crise dos grãos foram dois exemplos recentes deste fator inibidor.

Tais pontos já colocam de cara dois bons desafios para fortalecer o marketing educativo do ABC. Conciliar melhor sustentabilidade ambiental e econômica na difusão do programa, enfatizando bem esta última, pois sem ela não há sustentabilidade operacional. E também pensar em mecanismos mais eficazes de comunicação com todos os elos do sistema - produtor, técnico e agente financeiro, principalmente o primeiro, que é o cliente final.

Outros caminhos para melhorar o desempenho do ABC são apontados pela pesquisa. Por exemplo, resgatar o atrativo dos juros, criar modelos de projeto, dividir em etapas, ampliar o alcance do programa entre pequenos produtores, investir em multiplicadores, envolver mais as cooperativas, sindicatos, associações, prefeituras e escolas. A elas acrescentaria, ainda, a mídia. Um desafio a ser solucionado com ações integradas e conectadas de fato com as várias realidades de produção.

O Programa ABC é jovem. Precisa tempo para amadurecer. Tem por alvo mudar modelos de produção, algo diferente de custeio ou compra de bem específico, cujo financiamento já está assimilado pela cultura do campo.  O ABC é estratégico.  Importante para a competitividade futura do nosso agro, também para os compromissos do Brasil no acordo global sobre mudança do clima. Tem que ser levado adiante com equilíbrio e aperfeiçoamento contínuo.

(1)      “Identificação e Análise dos Desafios dos Produtores Rurais na Adoção de Tecnologias Voltadas à Emissão de Baixo Carbono, Via Programa ABC”, estudo de caso em Alta Floresta/MT, projeto do Observatório ABC, realização do Centro de Agronegócio da FGV (GV Agro).

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