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CÂMBIO: fora da realidade e perigoso


Argemiro Luís Brum

A moeda brasileira registrou R$ 4,27 por dólar nesta semana, acusando uma desvalorização muito além da conta. E essa não é apenas uma situação conjuntural. Se olharmos um período de pouco mais de 20 anos, entre junho/99 (quando o Brasil consolidou o câmbio flutuante) e outubro/19, o Real sofreu uma desvalorização de 40,5% considerando a Paridade de Poder de Compra.

Por esta metodologia, no final de outubro passado nossa moeda deveria estar valendo R$ 2,91 por dólar e não os R$ 4,09 que foi a média daquele mês. Tomando-se um período mais curto (janeiro/09 a outubro/19), o Real deveria estar valendo, no final do mês passado, R$ 3,32, ou seja, 23,2% a menos do que estava na média de outubro passado e 28,3% a menos do que o seu valor atual. Portanto, nossa moeda está “anormalmente” desvalorizada.

Há motivos externos e internos, dentre eles a possibilidade de impeachment do presidente dos EUA; a fragilidade geral da economia mundial, com ameaças de nova recessão; e as recentes dificuldades da economia nacional (em 2020 estaremos fechando a maior década perdida dos últimos 120 anos em nossa economia). Ora, o quadro cambial é extremamente nocivo e deve chamar a atenção do governo.

Se no curto prazo o setor exportador ganha, enquanto o importador perde, no médio prazo a situação se complica de forma geral. Primeiro, porque os exportadores, necessariamente, precisam importar componentes para a fabricação de seus produtos (e o Brasil importa de tudo um pouco), fato que deixará sua produção mais cara.

Em segundo lugar, mais dia menos dia os preços internos começarão a subir, refletindo tais importações. A situação somente não estourou ainda no Brasil porque a crise é tão grande que impede aos produtores repassarem a desvalorização cambial aos preços finais, pois os consumidores não têm renda para consumir.

Por enquanto, quem pode vai “se defendendo” com as exportações, a ponto de se incorrer em riscos de desabastecimento em alguns setores. Ao mesmo tempo, as medidas de disponibilidade de crédito e de renegociação de dívidas, atualmente adotadas, ao buscarem uma retomada do consumo, mesmo que tímida, ironicamente podem potencializar o problema.

Com maior liquidez, o setor produtivo tende a aumentar preços visando recuperar margens perdidas pela desvalorização do Real. Aliás, a situação começa a atingir os alimentos (carne bovina, por exemplo), pois a exportação se torna a cada dia mais interessante, sem falar em questões pontuais de demanda (crise da peste suína na China) que nos favorecem no mercado externo. Neste contexto, a equipe econômica precisa olhar com mais atenção o que se passa com o câmbio.

Afinal, um choque inflacionário pode vir rapidamente, obrigando a uma reversão na política de juros, onde a Selic voltaria a subir, interrompendo os efeitos positivos em favor de uma retomada econômica. 

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