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Hedging agrícola: entenda o que é e como funciona


Frederico Franco

No Brasil, a Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros (BM&FBOVESPA), instituída em 2008 pela união da Bolsa de Valores de São Paulo e a Bolsa de Mercadorias & Futuros, é o ambiente no qual são intermediadas as operações de compra e venda de contratos futuros.

Nos mercados futuros, são realizadas operações formais de compra e venda de ativos ou commodity por meio de contratos padronizados, por lote, quantidade, data de compra e venda, moeda e forma de cotação, bem como por um preço futuro pré-estabelecido. É importante ressaltar que o mercado futuro tem o objetivo de cobrir os custos de produção, minimizando o risco do preço à vista, o qual está diretamente ligado a especulações, ou provendo lucros.

Assim sendo, é nesse mercado que ocorre a junção de interesses de compra e venda de contratos futuros entre agentes econômicos, tendo os especuladores a função vital de dar liquidez ao mercado, e o hedger, agente vinculado ao ativo ou commodity, busca manter-se seguro contra os riscos de preço que o mercado à vista oferece, por meio do hedge.

Nessa conjuntura, o hedging envolve as operações de compra ou venda dos contratos futuros em substituição à posição no mercado físico (à vista), com objetivo de gerenciar o risco do preço contra as incertezas relacionadas ao mercado da commodity.

Há de se destacar, que as operações de hedge são afetadas pelas variações da base, a qual consiste no resultado da diferença entre o preço à vista na praça produtora e o preço no mercado futuro, na data do vencimento do contrato. Pesquisas apontam que a base sofre variações devido às incertezas que afetam diretamente cada região, ou seja, esses valores diferem-se em virtude das particularidades das praças produtoras

Nesse sentido, a operação de hedge envolve a troca do risco de preço no mercado à vista pelo risco de base gerado pelo hedging no mercado futuro. Dessa forma, quanto mais confiável for a utilização do risco de base em substituição ao risco de preço, mais evidente é a importância do mercado futuro.

Pesquisa sobre o hedging agrícola

No Brasil, vários estudos sobre efetividade de hedging de commodities agrícolas foram realizados, tendo os principais se concentrado na efetividade do hedge sobre o boi gordo, a soja e o café.
Sobre o hedge com a commodity café no Brasil, destacam-se os estudos de Fileni, Marques e Machado (1999), Pinto e Silva (2001), Nogueira, Aguiar e Lima (2002), Silva, Aguiar e Lima (2003), Fontes, Castro Júnior e Azevedo (2005) e Müller, Moura e Lima (2008). Importante ressaltar o estudo de Fileni, Marques e Machado (1999), que analisou os preços do café produzido nas principais regiões do estado de Minas Gerais, com dados diários entre janeiro de 1995 e dezembro de 1998. Nesse estudo, constatou-se a baixa efetividade na cobertura do risco para a região da Zona da Mata e um nível significativo de redução do risco, de 75% e 80%, respectivamente, para o café comercializado no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba.

Nessa mesma linha de investigação, é importante destacar, ainda sobre a commodity de café, o estudo de Fontes, Castro Júnior e Azevedo (2005) realizado entre setembro de 1994 e julho de 2001, em regiões de Minas Gerais e São Paulo, utilizando-se dados diários. Verificou-se, na região de Três Pontas (MG), um baixo risco de base se comparado a outras regiões, ressaltando-se que a efetividade do hedging depende das particularidades de cada região. 

A commodity boi gordo também é objeto de pesquisa de inúmeras investigações sobre hedge realizadas no Brasil. Dentre essas investigações, destacam-se as de Perobelli (2005) e Bitencourt, Silva e Sáfadi (2006).

Em particular, Bitencourt, Silva e Sáfadi (2006) afirmam que se deve considerar, nas estratégias de hedge do boi gordo, a dinâmica das estimativas e suas respectivas alterações ao longo do tempo. Os autores ressaltam ainda que, caso se subestimem as variações da razão de hedge, posições futuras podem ser tomadas, levando à baixa efetividade e consoante redução da proteção do risco das carteiras.

Entre as pesquisas de hedge para soja e milho no Brasil, destacam-se os estudos de Silva, Aguiar e Lima (2003), Martins e Aguiar (2004), Santos, Botelho Filho e Rocha (2008), Tonin, Braga e Coelho (2009), Oliveira Neto, Figueiredo e Machado (2009), Maia e Aguiar (2010). 

Nos estudos relacionados ao mercado da soja, a análise realizada por Maia e Aguiar (2010) inclui a verificação do resultado das estratégias de hedge para as dez principais regiões produtoras de soja do Brasil, com contratos futuros de soja da BM&F e CBOT (Chicago Board of Trade), abrangendo os anos de 2001 a 2004. As diferenças entre os mercados foram calculadas para os distintos vencimentos para cada região. Os resultados demonstraram que os hedgers de compra têm maiores oportunidades de retornos, mas os riscos envolvidos nas operações de hedge de compra também são maiores. Identificou-se ainda que os contratos de soja em grão da CBOT apresentam diferentes retornos em virtude do período de hedging e do contrato utilizado.

Nessa mesma linha de análise, mas tendo como objeto de estudo o mercado do milho, Oliveira Neto, Figueiredo e Machado (2009) concluíram que as operações do hedge na BM&F para a commodity milho do estado de Goiás alcançaram uma efetividade em minimização do risco em torno de 70%, apesar da maior variabilidade dos preços durante a safra. Esse estudo abrangeu o período compreendido entre maio de 2002 e outubro de 2006.

Apesar de ser um dos principais mercados agrícolas do Brasil, o mercado sucroalcooleiro é um dos que apresenta menor volume de estudos relacionados à gestão do risco preços. No que tange à commodity açúcar, o trabalho de Raabe, Staduto e Shikida (2006) estimou e comparou a razão e a efetividade de hedge para o açúcar brasileiro na BM&F, na London Stock Exchange (LSE) e na New York Board of Trade (NYBOT). O estudo abrange o período compreendido entre janeiro de 2000 e setembro de 2003. A estimativa da razão de hedge ótima foi conseguida pela aplicação do Modelo de Myers e Thompson (1989).

Diante disso, os resultados alcançados pelos testes empíricos realizados por Raabe, Staduto e Shikida (2006) indicaram que a carteira protegida pelo uso dos contratos futuros da BM&F alcançou, aproximadamente, 67% de efetividade, com 0,52 de razão ótima, enquanto que, para LSE, foi de, respectivamente, 2,4% e 0,29. Na NYBOT, a efetividade de hedge computada foi de 6%.

Entre os pontos mais relevantes verificados na pesquisa de Raabe, Staduto e Shikida (2006), destaca-se a diferença significativa da redução do risco da carteira protegida pelo uso de contratos futuros da BM&F, quando comparadas com o uso de contratos futuros da LSE e NYBOT.

Sosnoski e Ribeiro (2012), em seu estudo, visaram a analisar estratégias de proteção de preços do etanol, açúcar e subprodutos, de acordo com as restrições de produção, entre julho de 2000 até fevereiro de 2006. O estudo concluiu que as operações de hedge podem ser utilizadas como instrumento para redução de risco para o preço de venda à vista e contratos futuros feitos com a BM&FBovespa.

Alguns estudos internacionais sobre efetividade de hedging de commodities agrícolas também merecem destaque, em particular, o estudo de Brinker et al. (2009), que apontou a importância da similaridade entre as especificações do contrato e as características do ativo a ser protegido, uma vez que a mitigação do risco pelo uso do contrato futuro do milho (principal matéria-prima destinada à produção de etanol nos Estados Unidos) foi em torno de 50%, o que foi superior ao atingido pelo uso do contrato futuro da soja da Chicago Board of Trade (CBOT).

Sob o mesmo ponto de vista da investigação de Brinker et al. (2009), Houston e Ames (1986) verificaram que a carência de contratos futuros não impedia que o gerenciamento do risco de preços fosse realizado por meio do hedging com contratos futuros de diferentes commodities agrícolas. Assim sendo, os resultados dos testes indicaram que a razão de hedge ótima com contratos futuros de farelo de soja permitiu uma mitigação do risco de preços do glúten de milho próxima a 92% no mercado à vista. 

A cobertura do risco estimada pelo hedging no estudo Houston e Ames (1986) é, inclusive, superior àquela atingida em mercados futuros agrícolas americanos, como verificado na pesquisa de Bera, Garcia e Roh (1997). Essa pesquisa estimou uma cobertura do risco de preços igual a 77% para o milho e 70% para a soja no Estado de Illinois, Estados Unidos, com a razão de hedge de variância mínima com contratos futuros dessas commodities na CBOT.

Ao fim, destaca-se, ainda que a quantidade de métodos que podem ser empregados para testar a efetividade das operações das operações de hedge possibilita que diferentes investigações venham a ser realizadas no futuro. Espera-se que novas pesquisas sejam desenvolvidas com a finalidade de tornar os contratos futuros das commodities mais efetivos para o gerenciamento do risco de preços de mercados, que atualmente são carentes de instrumentos de proteção.

 

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