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Agricultura do século XXI não deve ser focada em produzir mais, mas melhor, defende professor da UFRGS

Sérgio Schneider palestrou sobre segurança alimentar e a produção agrícola do século 21


O futuro da agricultura não deve ser o foco no aumento da produtividade e a especialização em uma única cultura, como vem ocorrendo com a soja, mas sim a busca pela diversidade de culturas e de uma produção rural de valor agregado, essa foi a mensagem passada pelo professor Sérgio Schneider, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural da UFRGS, na Palestra Magna que abriu os debates do seminário Agricultura e Desenvolvimento – Segurança Alimentar, realizado na manhã desta quinta-feira (7) na PUCRS.

Na palestra, intitulada “Perspectivas da Agricultura e Segurança Alimentar do RS: Desafios frente aos cenários nacional e global”, ele destacou que há um novo cenário internacional na produção de alimentos que modifica a relação da agricultura com outros setores. Segundo ele, a agricultura do século 21 não poderá mais seguir as mesmas bases da chamada “revolução verde”, que buscava um aumento da produção para atender a demanda alimentar – objetivo que já teria sido cumprido -, mas deve focar em produzir boa alimentação, se relacionando de forma sustentável com questões como as mudanças climáticas, saúde e nutrição e a maior urbanização das cidades, especialmente em países ainda em desenvolvimento. “Nós não necessariamente precisamos produzir mais, precisamos produzir melhor”, afirmou.

Na opinião do professor, a humanidade vive atualmente um momento de transição nutricional em que o grande problema do mundo não é mais a fome, mas sim o fato de que as pessoas estão consumindo alimentos de baixa qualidade, o que levaria, por exemplo, ao sobrepeso. No Brasil, em 2010, 57% dos adultos estavam em condições de sobrepeso ou obesidade, o que gerava um gasto público em saúde estimado entre R$ 2 bilhões e R$ 5 bilhões, segundo Schneider. “O mundo vive hoje uma situação paradoxal: por um lado, tem 800 milhões de pessoas em condições famélicas e, por outro, 2 bilhões com deficiência de nutrientes”, disse.

Em uma palestra voltada para engenheiros agrônomos e pessoas que trabalham na área, que abriu o evento promovido pelo Sindicato dos Engenheiros do RS (Senge-RS), Schneider destacou que, dentro desse contexto, organismos internacionais, como a FAO Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), já relacionam a agricultura com o desenvolvimento sustentável, inserindo entre as metas para que isso seja alcançado questões como a necessidade de mudança da base energética para a produção — substituindo energias fósseis por renováveis — e da utilização da terra sem destruir a biodiversidade.

Atualmente, o principal indicador que mede o sucesso de uma lavoura é a produtividade por hectare, mas isso estaria prestes a mudar. Segundo Schneider, em duas ou três décadas, os principais indicadores da agricultura serão aqueles que avaliam a saúde alimentar da população. Para isso, ele defende que será necessário ocorrer um reposicionamento da matriz agrícola — no caso do Brasil, voltada atualmente para especialização na produção de grãos, notadamente da soja, e de carnes –, em que será necessário buscar um enfoque agroalimentar, que busca o estabelecimento de sistemas e redes que desenvolvam estratégias e metas para incrementar os indicadores de segurança alimentar, saúde e nutrição. Segundo ele, isto pode ser alcançado justamente com a diversificação das culturas.

Dependência da China

O professor destacou que o Rio Grande do Sul vem passando por uma mudança demográfica que trouxe, está trazendo e continuará a trazer grandes alterações para o setor agrícola, notadamente o fato de as taxas de ocupação na agricultura estarem em constante queda, enquanto a população está envelhecendo rapidamente — em 2040, estima-se que 25% da população terá 60 anos ou mais.

Por outro lado, segundo ele, o Estado está trilhando um “caminho suicida” de “sojicização” da agricultura. Schneider destacou que alertar para isso não se trata de demonizar a soja, mas sim de apontar que o RS está perdendo em competitividade ao se especializar para exportar para o mercado chinês, enquanto perde oportunidade de acessar outros mercados mais interessados na diversificação, o que acaba criando uma relação de dependência que poderá ser muito prejudicial aos produtores gaúchos quando ocorrer uma queda no consumo chinês ou a desvalorização nos preços internacionais.

“Eu não acredito no conto do vigário de que o Brasil terá um caminho de aumentar a oferta de alimento no futuro”, disse, salientando que a demanda chinesa deve crescer sim nos próximos 10 anos, para depois desacelerar. “Esse caminho como organização do nosso sistema agroalimentar é perigoso”.

Além da palestra de Schneider, o 18º seminário do Senge contou com painéis sobre os desafios tecnológicos da produção, políticas públicas para a agroindústria familiar e mercados para os produtos da agricultura familiar.

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