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Economia de privilegios (I)


Argemiro Luís Brum

Um livro recentemente publicado, de grande profundidade, confirma o que há anos estamos alertando neste espaço: precisamos mudar a estrutura de nossa economia, cultura e instituições. Para isso ocorrer o país precisa deixar para trás algo que vem desde o Descobrimento, independente da ideologia que nos governa: a economia de privilégios (“O flagelo da economia de privilégios: Brasil 1947-2020”, de Fernando de Holanda Barbosa, FGV Editora). Temos uma nefasta tradição, impregnada em toda a sociedade nacional, de tentar usar o Estado para a apropriação de recursos.

Ou seja, quem pode trata o Estado como se fosse seu proprietário, usando recursos públicos para fins privados, inclusive manipulando leis. Grande parte dos empresários se beneficiam de renúncias fiscais, muitas vezes sem nenhuma justificativa econômica. Os trabalhadores se organizam em associações em busca de privilégios, no contexto de um sistema dual em que 50% dos mesmos são informais, ou perto disso, sem nenhuma regra de apoio.

E uma casta importante de empregados do Estado ganha mais do que os trabalhadores privados em ocupações similares. Sem falar nos grupos que possuem o direito de auxílio habitação (e outros auxílios), como forma de burlar o teto dos salários. Em muitos casos, os brasileiros usufruem de privilégios sem sequer se darem conta disso. Politicamente, e as eleições deste ano mais uma vez o comprovam, as pautas das chamadas elites nacionais não têm nada a ver com os problemas concretos que enfrentamos.

Aliás, vamos em sentido inverso: no contexto de uma crise fiscal enorme, que paralisa o país há anos, faz-se uma emenda constitucional para aumentar gastos, quando não se tem recursos nem para pagar as despesas correntes já existentes. Não é uma questão de regime ou de ideologia política, pois todos fazem a mesma coisa. Trata-se de um problema da cultura brasileira, que “tem um comportamento predador, e que as instituições permitem e, às vezes, até facilitam”. As regras não valem para todos de forma igual, e o famoso “jeitinho brasileiro”, para burlar as leis, é a máxima. Portanto, o governo que assumir o país em 2023 deverá fazer um tratamento de choque para tirar o Brasil da “UTI fiscal” em que se encontra (Conjuntura Econômica, FGV, fev./2022). O que e como fazer veremos nas próximas colunas. (segue)

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