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Inflação dos alimentos: algumas razões


Argemiro Luís Brum

O Brasil vive uma inflação dos alimentos, isto é inquestionável. Porém, o Brasil não vive uma inflação geral. Tanto é verdade que o índice oficial de inflação (IPCA) está abaixo do piso da meta para este ano (2,5%). Inflação em um país é a alta generalizada e constante dos preços durante um longo período de tempo.

Ora, a inflação dos alimentos se dá em um segmento da economia em particular. Este segmento tem apenas uma participação de 19% na formação do índice geral da inflação. Dito isso, a inflação sobre os alimentos é uma das piores que existe para um país, especialmente em países subdesenvolvidos como o nosso, pois ela atinge especialmente os mais pobres, que são a grande maioria dos cidadãos. O que está ocorrendo com os alimentos, tendo o arroz como símbolo? Algumas atividades tiveram uma quebra de safra, porém, de forma geral a produção de alimentos foi normal (exceção no Rio Grande do Sul e Santa Catarina neste último verão).

Mas, enquanto a oferta era normal, a pandemia obrigou muita gente a ficar em casa por um longo tempo no primeiro semestre, gerando uma demanda por alimentos acima do normal, especialmente arroz e feijão. O consumo é maior quando se faz as refeições em casa. Isso foi possível graças ao auxílio emergencial do governo aos mais pobres. O mesmo forneceu liquidez para a compra de alimentos, pois colocou no mercado, até o momento, cerca de R$ 200 bilhões adicionais, dinheiro que, em sendo para os mais pobres, foi destinado preferencialmente aos alimentos.

Mais dinheiro, sem produção na mesma proporção, preços em alta. Enfim, e o mais importante, houve um erro grave de avaliação da área econômica brasileira: estimular uma redução de juro básico para além do aceitável e uma desvalorização do Real desproporcional. Na verdade, juro assim tão baixo (somado aos problemas políticos internos) levou à saída de dólares do país, a qual acelerou a desvalorização do Real, sem provocar recuperação econômica. Resultado: as importações de arroz e outros produtos, que naturalmente equilibravam o mercado, ficaram mais caras. E mais importante, a forte desvalorização do Real elevou as exportações de produtos primários acima de qualquer volume razoável, inclusive arroz.

Hoje está faltando até mesmo soja no país, o maior produtor mundial da oleaginosa já há alguns anos. Este fato central, somado aos demais, provoca esta disparada de preços internos em praticamente todos os alimentos. Agora, para segurar os preços, importa-se mais, inclusive retirando as tarifas de importação destes produtos, estabelecidas no âmbito do Mercosul. Tal realidade, por outro lado, está sendo a bonança dos produtores rurais, especialmente os arrozeiros, que vinham enfrentando dificuldades de mercado há alguns anos. Porém, ela ocorre sobre um quadro econômico insustentável. Em 2021 o mercado deve se recompor, na medida em que o auxílio emergencial terminará, sem que os mais pobres tenham outra alternativa para recuperar tal renda (o emprego ainda irá demorar para surgir com intensidade), enquanto as safras, se o clima deixar, caminham para recordes a julgar pelo aumento das áreas a serem semeadas no país. Ao mesmo tempo, o governo terá que rever urgentemente sua política de juro e câmbio, provavelmente elevando um pouco a Selic, e trabalhar para trazer o Real a níveis “normais” de R$ 4,00 a R$ 4,50 por dólar. Sem ignorar que, no meio disso tudo, ainda há a incógnita da duração dos efeitos nocivos da pandemia da Covid-19.

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