CI

ARTIGO: Já deveríamos estar preparados, por Luciano Z. Goldani*

Já deveríamos estar preparados, por Luciano Z. Goldani*


Os primeiros casos da gripe A H1N1 começaram a ser relatados no México em abril de 2009, posteriormente a infecção disseminou-se para todos os continentes do mundo, onde atualmente contamos com aproximadamente 100 mil casos confirmados e 500 mortes. No Brasil existem 1.175 confirmados com 11 mortes, sendo sete no Rio Grande do Sul. Um vírus introduzido no nosso meio a partir do encontro e união de fragmentos genéticos do vírus Influenza humano, aviário e suíno, provavelmente no porco, uma das espécies mais suscetíveis a se infectar ao mesmo tempo por diversos tipos de vírus Influenza existentes na natureza. Um vírus de moderada transmissibilidade, porém baixa virulência quando comparado com H5N1, o vírus da gripe aviária. A letalidade, nesse momento, número de mortes por pacientes infectados, tem sido de aproximadamente 0,5% (cinco mortes para cada mil pessoas infectadas), ocorrendo principalmente em pessoas vulneráveis ao vírus, com destaque para idosos e crianças afetadas. As mortes crescentes, relatadas principalmente na Argentina e agora no Brasil, parecem ser decorrentes do aumento crescente no número de pessoas infectadas. No momento, são errôneas e alarmistas as afirmações de letalidades superiores a 5%, baseadas apenas nos casos confirmados que são divulgados e que são bem inferiores, quando comparados com os verdadeiramente existentes. No entanto, devemos nos preocupar, pois a tendência é de termos um aumento substancial de indivíduos infectados e doentes, com aparecimento de casos graves no nosso meio. Nosso sistema de saúde, que inclui os postos de saúde, as emergências dos grandes hospitais e os leitos para internações para os casos graves já trabalham normalmente no seu limite máximo em decorrência do número altíssimo de infecções respiratórias que ocorrem nessa época do ano. Convém ressaltar que nossa população tem sido educada construtivamente com hábitos importantes de higiene, que incluem a lavagem de mãos preferencialmente antes das refeições, cobrir com lenços a emissão de gotículas produzidas por espirros e tosse, manter a distância de mais de dois metros de indivíduos possivelmente infectados e evitando ambientes fechados com grande aglomeração de pessoas. A manifestação clínica da gripe H1N1 é similar à da gripe sazonal, sendo que na maioria das vezes não é necessário procurar atendimento médico para os casos leves a moderados (febre, tosse, e dores no corpo) e que são medicados com medicações para os sintomas de febre e dores. Ao contrário dos caso graves, que apresentam complicações iniciais na gripe, que incluem principalmente forte dor no peito e a falta de ar.

Apesar dos alertas da imprevisibilidade do vírus Influenza por cientistas do mundo inteiro nos últimos 50 anos e exemplificada pelas pandemias de gripe espanhola e asiática no século passado, com mais de 20 milhões de óbitos, as autoridades de saúde de vários países desenvolvidos e em desenvolvimento no mundo não tomaram as atitudes necessárias e pertinentes para prevenção e contenção de futuras pandemias pelo vírus Influenza. Mesmo o temor de uma possível pandemia pelo H5N1, um vírus Influenza de alta letalidade que eventualmente tem causado a gripe aviária em humanos, não foi suficiente para estimular a estruturação de laboratórios específicos para o diagnóstico rápido e a disponibilização adequada de medicação contra o vírus para prevenção e tratamento dos grupos vulneráveis ao vírus como também dos casos graves que necessitam hospitalização. No Brasil, dispomos de apenas três laboratórios especializados para realização de exames para H1N1, insuficientes para atender à demanda e que tem levado mais de 10 dias para obtermos os resultados para confirmação dos casos.

Uma outra lição a ser observada inclui a demora em estruturarmos uma força de tarefa unificada com os países vizinhos com o objetivo de empregar critérios preventivos, principalmente nas nossas fronteiras, de diagnósticos e aspectos terapêuticos hegemônicos essenciais para o combate dessa epidemia.

Devido às constantes mutações e trocas de material genético de um determinado vírus Influenza para outro, não podemos cometer esses erros em uma possível próxima epidemia por esse imprevisível vírus. Um vírus Influenza mais letal e com alto poder de transmissibilidade poderia nos remeter às experiências de 1918, vividas com a catástrofe da gripe espanhola. Quem sabe, novos conhecimentos e as próprias críticas a um sistema inecifiente como o nosso nesse momento possam indicar metas e lições para enfrentarmos novas epidemias de grande magnitude no futuro.


LUCIANO Z. GOLDANI* | *PRESIDENTE DA SOCIEDADE GAÚCHA DE INFECTOLOGIA

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.