CI

Avanço agrícola brasileiro já inquieta os EUA


Em dez anos, o agronegócio foi responsável pelo saldo de US$ 147 bilhões; valor deve saltar para US$ 170 bilhões este ano. Depois de uma estagnação, por muitos anos, no patamar de 80 milhões de toneladas, o País poderá atingir, neste ano, 115 milhões de toneladas de grãos, mais 19% em relação a 2002.

De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), nos últimos dez anos, o agronegócio foi responsável por um saldo líquido de US$ 147 bilhões, valor que poderá saltar para US$ 170 bilhões até o final do ano.

"Nó da Alca"

"O nó da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) é a agricultura", diz Pedro de Camargo Neto, responsável pela área internacional da Sociedade Rural Brasileira e ex-secretário de Produção e Comercialização do Ministério da Agricultura. Como o Brasil é mais competitivo que os Estados Unidos, a Trade Promotion Authority (TPA) - autorização do Congresso para o presidente dos EUA negociar a Alca, obriga que todas as concessões em produtos agrícolas passem antes pelos deputados e senadores americanos. "Estão na lista carne e açúcar, por exemplo", diz Camargo Neto. Segundo ele, o Brasil é tão competitivo, que uma empresa da Carolina do Norte começou a comprar farelo de soja brasileiro para engordar frango. Na Alca, a TPA americana, que amarra as negociações agrícolas, "é uma sinalização negativa. Significa que há um país na Alca que é mais competitivo que os EUA. Eles acordaram e agora enviaram Penn para conhecer de perto o que está acontecendo na agricultura brasileira", comenta o especialista da Sociedade Rural Brasileira.

Críticas aos subsídios

A competitividade agrícola do Brasil seria maior se fossem derrubados os subsídios concedidos nos EUA - US$ 19 bilhões de apoio interno e US$ 1 bilhão para exportações - e na União Européia - US$ 50 bilhões - autorizados pela Organização Mundial de Comércio (OMC).

No total, o apoio agrícola concedido no ano passado, segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), foi: União Européia (US$ 112,6 bilhões ou 1,3% do PIB); EUA (US$ 90,3 bilhões ou 0,9% do PIB); Japão (US$ 55,7 bilhões ou 1,4% do PIB).

O Brasil iniciou duas queixas na OMC relacionadas com subsídios: contra os EUA (algodão) e contra a União Européia (açúcar). No caso do algodão, o Brasil perdeu a oportunidade de liderar um movimento com os países africanos produtores, diz Camargo Neto. Há poucos dias, o presidente de Burkina Fasso, Blaise Compaoré, representando países como Mali, Chade e Benin, apresentou à OMC uma proposta para que os países ricos reduzam seus subsídios.

De acordo com fontes brasileiras, os produtores de algodão norte-americanos vão receber, neste ano, US$ 3,7 bilhões em subsídios, o que contribuirá para baixar os preços. A proposta africana pede uma redução dos subsídios a partir da 5ª reunião ministerial da OMC em Cancún, no México. A proposta também pede compensação equivalente a US$ 1 bilhão, se os países desenvolvidos (Estados Unidos e União Européia) não eliminarem subsídios ao algodão.

Expansão da soja

A agricultura brasileira impressiona bem o governo norte-americano pelo que se nota, também, no trecho do relatório do USDA sobre a soja: "Muitas especulações foram feitas nas duas últimas décadas sobre o futuro da agricultura brasileira, e particularmente sobre até que ponto poderia crescer a produção com a expansão da fronteira agrícola. Isso é especialmente verdade em relação ao futuro da produção de soja, dado o crescimento sem precedentes da área cultivada no Centro-Oeste e na região do Cerrado (incluindo os estados de Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul, Bahia e Maranhão). Somente nos últimos sete anos, a área cultivada de soja expandiu-se em aproximadamente 5 milhões de hectares ou 114% nesses estados, enquanto em nível nacional cresceu em 7 milhões de hectares ou 65%".

Uma expansão gradual da área agrícola no Brasil ocorrerá inevitavelmente nos próximos 50 a 100 anos, mesmo que sem a introdução de inovações tecnológicas significativas. A taxa de crescimento da área ocupada com soja - a cultura que mais contribui para a expansão agrícola - foi estimada em 3% a 4% ao ano, nas condições atuais. Mas essa taxa tem aumentado recentemente graças à desvalorização do real e aos preços relativamente altos das commodities, segundo destaca o relatório do governo norte-americano.

Mesmo a uma taxa de crescimento modesta de 3% a 4%, a área com soja pode aumentar 200% nos próximos 50 anos, o que elevaria a área de 18 milhões de hectares, em 2002, para 54 milhões em 2052, prevê o relatório do USDA.

O peso das exportações

De acordo com o relatório, uma série de fatores poderia contribuir para uma expansão mais lenta da agricultura, ou limitar a sua extensão futura, mas nenhum dos fatores limitantes estão no horizonte imediato: solavancos da economia doméstica; criação de novos impostos sobre exportações agrícolas; séria redução do desenvolvimento de infra-estrutura na área de transporte; queda significativa nos preços internacionais das commodities agrícolas; aparecimento de doenças, que atacam as safras; geração de superávits na produção que excedam a demanda global); obtenção do status de país livre da febre aftosa, o que levaria a um aumento das exportações de carne; novas leis ambientais ampliando restrições de preservação; mudanças climáticas que alterem a quantidade, a distribuição e a periodicidade de chuvas.

A soja é de longe o produto que mais traz divisas para o Brasil - de 1993 a 2002, respondeu por US$ 42,6 bilhões de exportações. No ano passado, o segundo produto na pauta externa foi o açúcar (com receitas em torno de US$ 2 bilhões). Carne é outro item importante. A carne de frango é a mais expressiva em termos de receita, porque o Brasil "trabalhou melhor" na solução de problemas fitossanitários, diz Camargo Neto.

As exportações de suínos são as mais recentes, e as de carne bovina também estão crescendo. Em couro o Brasil exporta perto de US$ 1 bilhão. Outros itens importantes: café em grão e solúvel, fumo, madeira e derivados, celulose e papel, frutas, pescado e leite. Nos últimos dois anos, o Bra

sil passou a exportar leite e milho.Produtividade em alta

Além do avanço tecnológico no campo, a produtividade agrícola melhorou com os incentivos da Lei Kandir, que isentou as exportações de Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). No caso do açúcar, houve a privatização do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) e investimentos privados em portos, destaca Pedro de Camargo Neto.

O Brasil enfrenta ainda muitos gargalos - o principal é o frete. "Precisamos construir mais estradas e melhorar as que já existem. O frete alto segura o potencial produtivo, principalmente no milho", diz.

Outro obstáculo ao crescimento da produção é o poder aquisitivo, ainda baixo, do brasileiro. "Se a renda melhora, as pessoas começam a se alimentar melhor".

Assine a nossa newsletter e receba nossas notícias e informações direto no seu email

Usamos cookies para armazenar informações sobre como você usa o site para tornar sua experiência personalizada. Leia os nossos Termos de Uso e a Privacidade.