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Como está a tecnologia no campo?

Para gestores de fazendas esse é um caminho sem volta e até os pequenos produtores terão que se adaptar


Foto: Pixabay

Nos últimos anos, especialmente os dois últimos, o agronegócio assistiu a expansão das tecnologias no campo: aplicativos das mais diversas aplicações, softwares de gestão, mapas e imagens de infestações de pragas e doenças, pulverização acertiva com drones, sistemas de meteorologia, máquinas conectadas e que trabalham até sozinhas, sementes e defensivos com eficiência acima da média, a chegada dos biológicos. Se era impossível imaginar esse cenário há pouco tempo, hoje já é impossível imaginar o setor sem tecnologia no Brasil. 

Segundo pesquisa TIC Domicílios 2018, do Comitê Gestor da Internet no Brasil, 7 em cada 10 brasileiros estão conectados. Levando em consideração que 40% da população brasileira está no campo, de acordo com o IBGE, faça as contas. Especialistas, donos de fazendas e a Syngenta se uniram para discutir as tendências digitais no agronegócio, nesta quinta-feira (28), em um Webinar. O debate foi mediado por Ronaldo Giorgi, Head de Agricultura Digital da Syngenta, que deixou claro que a “missão é proporcionar tecnologia no campo e formas de acessá-la”. 

O que está em uso nas propriedades?

Na Agropecuária Reunidas do Papagaio, em Sapezal (MT), que se dedica à criação de gado e plantio de grãos como milho, a adoção de tecnologias têm feito a diferença. São utilizadas ferramentas de performance que monitoram em tempo real as máquinas; monitoramento e manejo de pragas e doenças com captação de dados no campo por tablets e imagens de satélite que geram mapas de calor e se transformam em tomada de decisão e a climatologia que é considerada fundamental, sendo lincada com a operação de cada setor. “Vejo isso hoje como muito comum na agricultura atual e não dá para dispensar”, conta o diretor técnico, Eduardo Godoi.

Na Algar Farming, que atua com produção de grãos como soja e milho e criação de gado em fazendas de Minas Gerais e Mato Grosso, a situação é semelhante. No dia a dia são adotados manejos de pragas e doenças, ferramentas de gestão agronômica que auxiliam a acompanhar orçamentos em tempo real para sementes, defensivos e permite ajustar os gastos. Como a produção é focada em irrigação também fazem a gestão de energia e água. As fazendas têm ferramentas de acompanhamento personalizado de clima, com até cinco estações por fazenda; agricultura de precisão que permite interações com outras variáveis, como adubação, além de fatores de fertilidade de solo e ferramenta de imagens em NDVI para buscar alternativas para manchas de plantas daninhas e manejo de aplicações em taxa variável. “Nossa aposta hoje em inovação é o manejo de biológicos. Estamos observando o desempenho desse tipo de produtos em custos e desempenho”, conta o diretor presidente, Marlos Alves. 

Para Luís Otávio Fonseca, global head agribusiness da IBM, o Brasil está em um momento bom, inclusive para o digital. “O que vejo hoje é que o Brasil adotou muito rápido a tecnologia dentro da porteira, coisa que não acontece nos Estados Unidos, Canadá e Austrália, por exemplo, pela limitação da expansão de fronteiras agrícolas. Avançamos em eficiência, custo e tecnologia. O Brasil não vai ser só exportador de soja mas de algoritmos que levam aos bons resultados: clima, solo, manejos, fatores de sucesso da produção. Temos também capacidade de digitalizar processos na cadeia em trading, por exemplo, conectando produtor e comprador”, projeta.

E os desafios?

O cenário parece favorável: agricultura em alta, exportações fluindo, números positivos mesmo dentro da pandemia. Os gestores de fazendas ainda observam alguns obstáculos para a adoção de tecnologias e o pleno funcionamento nas propriedades.

A principal é a falta de conectividade. Para ter internet em fazendas distantes são necessários muitos equipamentos: torres, rádios, satélites. E isso é custo na conta do produtor. Godoi aponta outro fator muito importante: a questão cultural. Na escolha de cultivares ou defensivos o agricultor vê ensaios de campo e decide qual compra vai de acordo com o que deseja em sua lavoura. “Na tecnologia não é possível demonstrar quanto vou investir e quanto vai me dar de volta, tem que estar aberto a ela. Você testa uma coisa e não funciona, então tem que testar na outra safra. Isso é diferente de uma indústria, por exemplo, onde se possibilitam testes diários”, enfatiza. 

Outro ponto está na falta de mão-de-obra qualificada para operar essas soluções. Como tudo é muito novo a maioria dos trabalhadores não sabe extrair todo o potencial. Godoi ainda aponta que a maioria dos sistemas não se conversam e alguns são de difícil entendimento. “É fundamental que com uma olhada eu consiga gerir os dados e entender eles para poder aplicar e, às vezes, isso não é fácil”, diz.

Alves aponta outra dificuldade: a agricultura tropical. “Temos muitas pragas, doenças na agricultura dos trópicos. As plataformas atuais ainda são dependentes da inteligência agronômica e esse ajuste muitas vezes acontece no andamento da safra. Existe uma ansiedade de ver plataformas que atuem de forma colaborativa, integradas, onde as diferentes ferramentas se unem e tiram o que tem de melhor. Integração de fábrica seria o ideal”, orienta.

No debate, o especialista da IBM, acrescenta que há necessidade de uma padronização dos dados, uma vez que, cada fabricante faz de sua forma, gerando diferentes resultados. “O digital é como uma cultura. Tem que investir a cada ano. Não vai acontecer de uma hora para outra. É gradual e já estamos vivendo. A agricultura digital vem de fora pra dentro da porteira”, completa Fonseca.

Pequenos produtores terão que se adaptar

“Para o pequeno agricultor acho que vai ser praticamente impossível ele não se conectar porque num futuro breve comercialização de insumos, venda de produtos, da safra não vão ser da forma tradicional que temos hoje”, projeta o diretor da Reunidas do Papagaio.

A principal necessidade para os pequenos produtores vai ser se manter competitivo no mercado e, para isso, a tecnologia parece ter vindo para ficar. Para Alves uma solução para o pequeno pode ser a associação em cooperativas, trazendo ganho de eficiência, poder de barganha e facilitação logística. “É uma conta fácil: às vezes o que tem sobrando de produtos da agricultura familiar em um lugar, está faltando em outro. As ferramentas de agricultura digital vem para conectar isso”, explica.

“A próxima onda vem do produtor levando isso pra fora. Vai precisar de operadoras fornecendo crédito para aquisição de tecnologias e democratizando o pequeno produtor nesse processo”, finaliza Fonseca. 


 

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