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Conjuntura nacional: tema em debate no Conselho de Economia da SNA

A preocupação com o legado a ser deixado para as próximas gerações foi a tônica do discurso de Tulio Arvelo Duran


A preocupação com o legado a ser deixado para as próximas gerações foi a tônica do discurso de Tulio Arvelo Duran

O Conselho de Economia da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), em reunião realizada na sexta-feira (9), na sede da instituição, analisou o atual cenário político e econômico do Brasil.

Abrindo o encontro coordenado por Rubens Novaes, o economista Paulo de Tarso Medeiros enfatizou que o ‘impeachment’ de Dilma Rousseff não foi a solução para resolver os problemas econômicos do país. “A prova de que o problema não era a presidente é que, com o final da política do ‘quanto pior melhor’, a recessão continuou firme e forte, o que a meu ver se deve em certa parte às políticas do governo Temer”, ponderou.

Segundo Medeiros, a política implementada pelo ministro Joaquim Levy agravou a recessão. “É de se esperar que uma política de ajuste macroeconômico tenha efeitos negativos no crescimento. Mas com a economia em recessão não se fazia sentido reduzir ainda mais a demanda agregada, via aumento de juros – aumento esse tão grande como o realizado”.

CRISE

De forma geral, a atual crise brasileira, na opinião do economista, pode ser explicada por diversos fatores, entre eles, o esgotamento de um modelo baseado no consumo – que constitui um componente do PIB; a redução da competitividade da indústria pela valorização do câmbio; o impacto do setor petrolífero nos investimentos e na renda; os cortes nos gastos do governo Dilma, e a operação Lava-Jato, que, para Medeiros “foi positiva no médio prazo, pelo efeito na ética dos negócios e na atuação dos políticos, mas teve efeito danoso no PIB, por agravar ainda mais redução dos gastos da Petrobrás, com impacto sobre as grandes empreiteiras envolvidas no esquema”.

Para o ex-ministro Márcio Fortes, a crise também envolve a perda de credibilidade dos três poderes. No judiciário, em particular, ele criticou a “falta de decisão para que seu papel seja cumprido”, acrescentando que “o Supremo Tribunal Federal deveria ter atitudes mais duras para manter sua posição”.

Fortes salientou ainda que faltam mais discussões em torno das propostas de lei do governo. “É preciso analisar, debater para aperfeiçoar. Defender a lei dentro da lei e não acima da lei. Hoje em dia o que existe é ausência de autoridade”.

Outro ponto em questão, destacado por Paulo Medeiros, é de que a crise afetou as expectativas de consumo, causando retração; diminuiu os investimentos empresariais; gerou indisposição, por parte dos bancos, para a realização de financiamentos e também afetou os investimentos em infraestrutura que, segundo o economista, “sofreram com a incapacidade do governo de tocá-los e com a pouca disposição de investidores privados de assumir riscos”.

MANUTENÇÃO E PLANEJAMENTO

Presente ao debate na SNA, Roberto Castello Branco afirmou que, apesar de o Brasil precisar de muito investimento em infraestrutura, “é necessário examinar as oportunidades de manutenção das obras já realizadas, e isso não ocorre no país”. Para ele, “é muito mais barato manter uma infraestrutura existente do que deixar uma construção sem manutenção por dez anos e depois reformá-la”.

“Investimento em infraestrutura é importante porque contribui para aumentar a produtividade na economia e o crescimento econômico”, afirma Castello, “porém, é preciso saber, por exemplo, se a obra é pública, se há um projeto de engenharia detalhado, para evitar que não caiba no orçamento e que a obra atrase”.

CÍRCULO VICIOSO

De forma geral, a falta de investimentos constitui um dos fatores que alimentam a atual crise. “Um processo recessivo quando se instala, se auto-alimenta. A queda de produção, o consequente aumento do desemprego, a perda de renda dos trabalhadores e a queda de investimentos acarretam em mais queda de produção e mais desemprego. É o que estamos assistindo. A saída desse círculo vicioso requer que alguns dos componentes do PIB se recuperem. Mas qual teria condições de fazê-lo? ”, questiona Paulo Medeiros.

“O país está numa recessão profunda, em situação difícil, mas isso vai acabar. É um ciclo. A preocupação deve ser com o futuro das novas gerações. Nos últimos 25 anos, o PIB per capta do Brasil cresceu 1,2 % ao ano. Outras economias latinas como Peru, Chile e Uruguai dobraram o PIB per capta nesse período, crescendo a quase 3% ao ano, e ficamos muito para trás”, observa Castelo Branco. “Essa é a mais longa recessão do Brasil desde o início do século 20, e esse quadro foi piorado pelos últimos governos brasileiros”.

INTERVENÇÃO

Na visão do vice-presidente da SNA, Tito Ryff , a intervenção do Estado, nesse momento crítico, é fundamental tanto para evitar o colapso do sistema econômico e financeiro como para melhorar a distribuição de renda e eliminar a pobreza absoluta.

“A ideia de que a solução para o mercado seria deixar a economia quebrar porque as pessoas aprendem com as experiências e não voltam a correr riscos excessivos, é um pouco ingênua”, afirma. “É uma ação individual. Quem assume esses riscos não está pensando em macroeconomia.” Em consonância com o diretor da SNA, Castello Branco afirma que “a intervenção do Estado é bem-vinda”.

Ryff disse ainda que o crescimento econômico não necessariamente melhora a distribuição de renda. “No caso do Brasil, esperar que o crescimento da economia cause os efeitos necessários para a distribuição de renda, pode levar décadas e ter impacto negativo sobre a própria economia. Temos de ter compromisso com a nossa responsabilidade fiscal”, ressalta.

Por sua vez, Castello Branco questionou as políticas de redistribuição de renda: “Elas envolvem políticas fiscais, regulação de mercados e isso cria uma classe de ‘capitalistas inimigos do capitalismo’, com políticos corruptos, lavadores de dinheiro, etc. que extraem recursos da sociedade”.

VÍNCULOS

O vice-presidente da SNA também acredita que a esquerda brasileira, neste momento pelo qual o país atravessa, deve “associar-se ao processo de responsabilidade fiscal; estabelecer vínculos maiores com a iniciativa privada, e incentivar o crescimento econômico por meio de políticas de fomento ao desenvolvimento industrial e de incentivo à inovação tecnológica”. E reforça: “o Estado tem papel fundamental nesse sentido”.

Já para Castello Branco, o Brasil tem uma história de fracasso com as políticas industriais. “São focadas na substituição de importação e preocupadas em barrar a exposição para a competição externa. Não têm prazo definido e não exigem nenhuma contrapartida de eficiência por parte de seus beneficiários”.

AÇÃO DOS EUA

Outro aspecto influente, na visão de Paulo Medeiros, está relacionado ao comportamento do novo governo dos Estados Unidos. Segundo ele, existe uma certeza de que os juros vão subir, pelo vigor da economia americana, mas por outro lado há uma dúvida se vão aumentar mais ainda pelas ações de Donald Trump.

“Se partir para uma política efetivamente protecionista, isto afetará os níveis de comércio. Quanto a preços das commodities, depois de expressivas perdas, já tiveram boa reação. Difícil esperar mais. E podemos ter queda, na hipótese de ação mais radical do governo Trump. Condições externas não devem nos ajudar. Maiores juros nos Estados Unidos irão afetar o fluxo de recursos para o Brasil, aumentando o risco país na visão dos investidores estrangeiros. Tudo o que não queremos”, enfatiza Medeiros, que também analisou o desempenho dos governos de Dilma Rousseff e Michel Temer.

CRÍTICAS

Para o economista, o principal erro do governo Temer está na política de taxa de juros por parte do Banco Central (BC). “O presidente quer chegar ao centro da meta de inflação em 2017 e faz da taxa de juros o instrumento para atingir essa meta. Com a recessão se profundando, poderia reduzir essa taxa, até porque as expectativas de inflação se mantinham relativamente estáveis e bem abaixo dos índices correntes”.

Por outro lado, Castello Branco avalia que, “se o BC deseja chegar a um nível de meta de inflação, ele tem de subir muito mais a taxa de juros que subiria na ausência do crédito direcionado, porque a capacidade deste crédito afetar o mercado diminuiu”.

O analista disse ainda que “as taxas de juros para empréstimo não são muito altas”, e teceu críticas ao BC por sua “falta de independência e perda de credibilidade, diante do grande desequilíbrio fiscal (aumento desenfreado de gastos)”.

Quanto às recentes medidas do governo Temer, Paulo Medeiros considerou “lamentável” a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do Teto dos Gastos, aprovada esta semana pelo Senado, e disse que a reforma da Previdência deverá sair do papel, porém, com pequeno impacto positivo em curto prazo, “ou talvez nenhum impacto”.

De acordo com o analista, “a necessidade política e legal de preservar os direitos adquiridos, e a criação de mecanismos de adaptação às novas normas farão com que os efeitos maiores só se façam sentir a médio prazo”.

GERAÇÕES FUTURAS

Citando o professor Max Bazerman, de Harvard, o economista enfatizou: “O aumento da dívida pública de tal forma que possamos gastar mais sem a necessidade de aumentar a carga tributária, é uma forma parasita de obter recursos jogando o débito em gerações futuras. O mesmo acontece, de forma similar, na exploração de nossas florestas, oceanos e solos. A sociedade atual deve ter maior consciência sobre esses aspectos”, destacou, também fazendo menção ao novo governo dos EUA.

“Trump deve respeitar o imperativo de não prejudicar as gerações futuras, e certamente precisa incluir um parêntesis na redução das mudanças climáticas globais, que certamente é uma enorme ameaça ao presidente”.

“A arte de governar tem o seu fundamento na honestidade”, concluiu o economista.

Também estiveram presentes à reunião do Conselho de Economia o presidente da SNA, Antonio Alvarenga; o vice-presidente Hélio Sirimarco; os diretores Francisco Villela, Antonio Freitas, Márcio Sette Fortes e Sérgio Malta, e os economistas Arnim Lore, Antonio Meirelles, Carlos Von Doellinger, Ralph Zerkowsky, Sérgio Gabizo e Hélio Portocarrero.

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