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Diretor-presidente da Abraltec ressalta que barreiras para importar agroquímicos paralisam pesquisas no país


*Álvaro Vargas

Em todo o mundo, as amostras de pesticidas para pesquisa são importadas livre de qualquer barreira burocrática. No Brasil criou-se uma barreira não tarifária de nome “Registro Especial Temporário” (RET). Isto beneficiou apenas algumas poucas indústrias já estabelecidas, pois dificultou a entrada de possíveis concorrentes. Mesmo assim, no passado, obtinha-se o RET com relativa facilidade no Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Entretanto, com a publicação do Decreto 4.074 (DOU 04/01/2002), além do Mapa, tornou-se necessária também uma autorização da Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto de Meio Ambiente (Ibama). Embora protocolados simultaneamente nos três órgãos, a agilidade na análise e a liberação não ocorrem na mesma velocidade. Até que o Mapa, órgão responsável pela emissão do RET, possa receber as avaliações da Anvisa e do Ibama e emitir um parecer, o prazo pode chegar a mais de seis meses.

Mas além do RET, ainda existe a exigência da Licença de Importação a ser emitida pelo Ministério da Agricultura (após a obtenção do RET, no próprio Mapa), que pode levar até 45 dias. Na prática, a importação de uma simples amostra de pesticida para pesquisa pode levar até 11 meses. Um grande contraste comparando com qualquer país tanto na Europa como nos EUA, onde a liberação de amostras de pesticidas para pesquisas é imediata, sem nenhuma exigência como a existente no Brasil.

Uma das causas desta demora é que estes órgãos não estão aparelhados para esta função. Foi criada uma exigência, mas sem as condições para cumprirem os prazos. Os técnicos responsáveis apenas cumprem uma determinação legal. Mesmo que tenham boa vontade em agilizar um processo, perde-se muito tempo no preenchimento de guias e formulários sem qualquer utilidade prática.

Além disso, os órgãos de governo (Ibama, Mapa e Anvisa) já se encontram sobrecarregados com as tarefas pertinentes a estas instituições. Sobrecarregá-los com esta demanda de serviço desnecessário, além de dificultar o setor produtivo, prejudica outras áreas de interesse. No final, o parecer da “suposta” avaliação técnica, baseada apenas em literatura sobre a molécula a ser importada, é sempre a mesma, “CLASSE-I, ALTAMENTE TÓXICO”. Não importa a natureza da molécula nem que sejam inseticidas, herbicidas ou fungicidas. Um parecer único é sempre fornecido para as amostras a serem pesquisadas. Por que então a necessidade desta avaliação?

As amostras para pesquisa são manuseadas por cientistas em condições controladas com registro de todos os procedimentos executados, desde a pesagem até o descarte dos resíduos. Os centros de pesquisas são inspecionados anualmente e estão habilitados e credenciados tanto por agências do governo brasileiro (Anvisa, InMetro/Ibama, Mapa), como por órgãos internacionais da União Européia (OECD) e dos Estados Unidos (EPA) para as Boas Práticas de Laboratório. As informações geradas pela pesquisa propiciam a elaboração de um dossiê toxicológico que é apresentado para a Anvisa, Ibama e Mapa.

Portanto, despender vários meses avaliando se pode ou não autorizar a pesquisa de um agrotóxico demonstra um total desconhecimento de sua finalidade, principalmente quando essa amostra já está sendo inclusive comercializada há vários anos em diversos países e também no Brasil. A lógica seria facilitar a importação da amostra para pesquisa a fim de avaliar o dossiê toxicológico gerado pelos laboratórios de pesquisa nacionais, decidindo com base realmente científica liberar ou não o seu registro do produto para comercialização e uso na agricultura brasileira. Lamentavelmente, o Decreto n° 4.074 não permite isto, e os órgãos de governo no cumprimento da legislação complicam desnecessariamente uma simples importação de amostra para a pesquisa.

Esta opinião é compartilhada pela maioria das indústrias de defensivos agrícolas através de suas associações Andef, Aenda e Sindag, que registram uma espera pelo RET ainda mais elevada que os laboratórios prestadores de serviço em pesquisa toxicológica, ou seja, 11 meses em média. O reflexo e prejuízo não são somente para os centros de pesquisa no Brasil, mas também às indústrias de defensivos, e, principalmente, os agricultores que não terão acesso fácil aos insumos mais modernos e ficam impossibilitados de utilizar agroquímicos menos tóxicos, frutos dos avanços tecnológicos já obtidos e em uso em outros países. E em última análise o próprio consumidor, que pagará mais caro pelos produtos agrícolas.

Consideramos ser desnecessário este excesso de zelo que obriga a duas avaliações dos pesticidas: primeiro quando estes são importados para a pesquisa, e, posteriormente, quando os laboratórios concluem estas pesquisas e fornecem o dossiê para as avaliações toxicológicas. Em nenhum país do mundo é exigida esta duplicidade de trabalho.

Com este procedimento, os centros de pesquisa em toxicologia de agroquímicos no Brasil ficam praticamente impedidos de trabalhar e mesmo exportar serviços. Indústrias de pesticidas no exterior têm cancelado contratos para buscar outros laboratórios fora do Brasil, já que não podem aguardar tanto tempo para o início destas pesquisas. Assim, toda uma infra-estrutura laboratorial no país perde com esta limitação ocasionada pelo RET.

Sem dúvida, a criação do RET foi um equívoco. Pode ter beneficiado alguma indústria de agroquímicos, mas prejudicou todo o setor produtivo brasileiro que está pagando um custo muito alto por esta decisão lastimável. Um triste resultado prático deste RET, e que centenas de postos de trabalho já deixaram de existir desde a publicação do Decreto no. 4.074, além das perdas de divisa para o país.

A melhor solução para este problema seria uma modificação no decreto interministerial, que envolve os ministérios da Agricultura, Saúde, e Meio Ambiente. Com isso, eliminaria a necessidade do RET para pesquisas em condições controladas, no caso, os laboratórios. A exigência, se mantida, seria apenas para os produtos formulados a serem testados no campo. Mas que esta liberação do RET seja de forma mais ágil para não comprometer o setor produtivo, conforme já mencionado. Para isto, é necessário um esforço ainda maior de muitos colegas que trabalham neste três órgãos de governo, para superar este impasse.

*Ph.D., Eng. Agrônomo e diretor-presidente da Associação Brasileira de Laboratórios de Toxicologia e Ecotoxicologia (ABLATEC)

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Fax: (19) 3429-7713

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