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Em extinção - Um aceno para garantir trabalho

O chapa precisa chegar cedo no ponto; pode trabalhar o dia todo ou ficar várias horas à espera de serviço


Moacir, Valdecir e Paulo. Os três são personagem de uma história comum. Diariamente, acordam de madrugada e vão para a beira da rodovia com a esperança de conseguir trabalho e levar para casa dinheiro para o sustento da família. Os três têm tempo de estrada diferentes, histórias de vida diferentes, opiniões diferentes sobre o serviço que escolheram, mas dividem a esperança de que as coisas melhorem.

Moacir Luciano, de 58 anos; Valdecir Gomes de Oliveira, de 49; e Paulo Silva, de 50, são "chapas" na rodovia BR-369, em Londrina. Uma atividade sem garantias, informal, e que com a automatização dos processos de carga e descargas, chegada do GPS e aplicativos de trânsito e evolução da legislação trabalhistas e de segurança do trabalho, corre o risco de entrar em extinção.

A vida de um chapa é cheia de incertezas. Ele precisa chegar cedo no ponto, normalmente por volta das 5 ou 6 horas, e aguardar os caminhoneiros contratarem seus serviços. Um dia pode trabalhar o dia inteiro. No outro, pode passar o dia sentando no ponto só esperando. A cada caminhão que passa, um aceno. Sinal que estão disponíveis para o trabalho.

Luciano é um dos mais antigos chapas da BR-369. Está na atividade há 28 anos. Ele fica em um ponto próximo da entrada do Parque de Exposições Ney Braga (zona oeste). Chega lá por volta das 6 horas e fica até as 16 ou 17horas, dependendo do movimento. Antes de virar chapa, trabalhava em um empresa com carteira assinada, mas conta que o salário mal dava para pagar as contas. Então, resolveu ir para a beira do asfalto. Durante o período de " vacas gordas" chegou a ganhar R$ 3 mil por mês. Hoje, consegue tirar em torno de R$ 1 mil. .

"Tenho ganhado pouco, passado apertado. Mas sempre que posso ainda ajudo minhas filhas", comentou, informando que criou as seis filhas carregando e descarregando produtos.
Luciano começou trabalhando em um posto na zona norte, e depois mudou para o ponto onde está. Aprendeu o ofício com os trabalhadores mais antigos. "Eu ia com os chapas mais velhos e marcava os endereços", recordou. Já pensou em sair da beira da estrada várias vezes, mas cita a dificuldade de encontrar trabalho formal. "Antes eu ia na empresa e perguntava se tinha vaga, levava currículo. Mas ninguém chama para entrevista. As pessoas não querem contratar gente mais velha. Para mim isso é um erro, porque o mais velho trabalha melhor."

Em quase 30 anos de atividade, ele fez amizade com os caminhoneiros, que até hoje lhe oferecem serviço. "Trabalhei 10 anos com uma mesma empresa lá de Nova Esperança. Vinham uns dois ou três caminhões deles para cá por semana. Eles me ligavam e já deixavam agendando."

Muitas vezes o trabalho é insalubre e, para se garantir, ele recolhe o INSS. Uma vez teve pneumonia depois de fazer uma descarga em um frigorífico. "Você sai daqui com o corpo quente e fica entrando nas câmeras frias, com a carga congelada no ombro, o corpo não aguenta. Mas não dá para escolher carga. Se ficar escolhendo fica sem serviço."
A crise não tem reduzido apenas o volume de trabalho, mas também o preço. "Os caminhoneiros têm chorado muito. Muitas vezes, você tem que aceitar o preço que eles oferecem. Até porque tem muito homem na pista. A pessoa fica desempregada e decide virar chapa."

REGRAS
Apesar de não existir uma liderança entre os chapas, eles seguem algumas regras. É preciso ter amizade com os chapas mais antigos e respeitar o ponto de cada um. Cada chapa cobra o seu preço pelo serviço. Não existe uma tabela. Eles levam em consideração o tipo de mercadoria, o local de entrega, se tem escada, o tempo que vai demorar. E o valor final vai depender de muita negociação com o caminhoneiro. Às vezes, a carga consome o trabalho de mais de um chapa, então eles chamam os colegas de outros pontos.

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