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Estagnação do preço leva produtores a abandonarem atividade leiteira no RS

Criação de gados para corte e cultivo de grãos se tornaram alternativa


Após atingir a autossuficiência e mais que dobrar a captação nos últimos 15 anos, o Rio Grande do Sul registra queda significativa na produção de leite. Um dos motivos, apontam técnicos do setor, é o abandono da atividade devido ao preço estagnado que não cobre o aumento dos custos. A crise vivenciada em 2015, ano em que indústrias menores fecharam as portas e produtores ficaram sem receber, agravou a situação e fez com que criadores de gado de leite buscassem alternativas de renda. Um dos caminhos encontrados pelos pequenos produtores foi a migração para a pecuária de corte. 

No primeiro trimestre de 2016, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as indústrias do Estado adquiriram 809,079 milhões de litros de leite cru, queda de 4,6% em relação ao mesmo período de 2015. Em volume, são 39,2 milhões de litros a menos. “Enquanto alguns criadores saem da atividade leiteira, os produtores que optam por permanecer estão reduzindo o rebanho”, avalia o assessor de Política Agrícola da Fetag, Marcio Langer. O técnico considera ainda o impacto das condições climáticas que prejudicaram a implantação e desenvolvimento das pastagens e, por consequência, a alimentação dos animais.

Pesquisa do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP confirma a percepção. “O desestímulo da atividade, ocasionado principalmente pelo custo do milho e do farelo de soja, está fazendo o produtor de leite migrar para o gado de corte”, avalia o agrônomo Wagner Yanaguizawa, pesquisador do mercado de leite do Cepea. De acordo com Yanaguizawa, o preço médio pago ao produtor em 2015 — R$ 0,93 por litro, considerando a inflação — foi o menor dos últimos cinco anos. Em contrapartida, o custo de produção, no acumulado desde janeiro de 2015, registra alta de 15,2% no Rio Grande do Sul.

O zootecnista Jaime Ries, assistente técnico estadual para a área do leite da Emater, acrescenta que valor pago ao produtor caiu 10% desde a metade de 2013. Em valores corrigidos pela inflação, o valor médio do litro foi de R$ 1,00 de junho de 2013 a dezembro de 2014 e recuou para R$ 0,90 de janeiro de 2015 a março de 2016. Ries pontua que o abandono da atividade tem ocorrido em regiões mais afastadas das indústrias, em propriedades com pouca estrutura e com pequena escala de produção. “Há um movimento forte na região das Missões”, avalia.

Presidente da Associação de Criadores de Gado Holandês do Rio Grande do Sul (Gadolando), Jorge Fonseca da Silva reconhece que o abandono da atividade é uma realidade no Estado. “Há muita gente desistindo, sim”, confirma o criador, destacando que a crise que o setor vem enfrentando nos últimos três anos é um dos motivos. “Os pequenos produtores têm sido muito castigados pois as empresas pagam bem para quem produz grande volume de leite”, avalia Silva.

O presidente do Sindilat, Alexandre Guerra, esclarece que a prática de pagar por volume é adotada não só pela indústria do Estado, mas em todo o Brasil. Entre os motivos, está o fato de que as cargas maiores implicam menores custos de logística e com análises, por exemplo. Sobre o preço pago ao produtor em 2015, Guerra pontua que o ano registrou grande oferta de matéria-prima e consumo retraído.

Migração tem diversas causas

Além do custo de produção alto e rentabilidade instável, a escassez de mão de obra e a falta de sucessores na família são fatores que também contribuem para o abandono da atividade leiteira no Estado. “Tudo depende de quem na família vai continuar a atividade”, pontua o chefe da Divisão Técnica do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural do Rio Grande do Sul (Senar-RS), João Augusto Telles, sobre a importância da sucessão rural. Daqui pra frente, acredita, a tendência é ter menos produtores, porém mais qualificados e produzindo mais leite.

A maioria dos que partem para outras atividades são criadores que entregam de 50 a 300 litros por dia. Entretanto, também há produtores maiores, que produziam mais de mil litros por dia. O próprio Telles, que tem propriedade em Pejuçara, está entre aqueles que deixaram a atividade. Há dois anos e meio, quando tinha 110 vacas em lactação e produzia 3,2 mil litros por dia, diante dos custos crescentes e da dificuldade para contratar mão de obra, optou por transformar os 50 hectares de pastagens em lavouras de soja. 

Na percepção do Senar, a maioria dos produtores que estão desistindo do leite migra para a agricultura, convertendo áreas de pastagem em lavoura de grãos, principalmente soja e milho. Estas duas culturas hoje são o carro-chefe da propriedade de Ivar Duarte, em Santa Rosa, que trabalhou com leite por 15 anos, chegou a produzir 1,9 mil litros por dia, em sistema de três ordenhas, e deixou a atividade há menos de um ano, em agosto de 2015, devido à instabilidade na renda e dificuldade de mão de obra. Duarte decidiu ampliar as lavouras de grãos e manteve o cultivo de tifton, gramínea utilizada para alimentar animais, hoje destinado à comercialização de feno, e ampliou o número de cabeças de gado de corte. “É um dinheiro que entra todo mês”, comenta sobre a estabilidade financeira que aumentou com as novas atividades. 

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