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Exportações de frango halal a países muçulmanos crescem 14,5% em 2016

Rio Grande do Sul vendeu 138 mil toneladas de aves de janeiro a maio


A fidelização de importadores que fazem exigências específicas, como os países muçulmanos, é um caminho que tem sido percorrido pelo setor de proteína animal para ampliar cada vez mais os embarques. Formado por consumidores islâmicos de dezenas de países, o maior desses mercados é o de produtos halal, que permanece em crescimento. Tanto que, nos primeiros cinco meses de 2016, adquiriu 883 mil toneladas de frango do Brasil. O volume é 14,5% maior que o de 771 mil toneladas do mesmo período do ano passado. Os principais compradores são Arábia Saudita, Emirados Árabes e Kuwait.

“O Brasil sempre foi muito fiel ao cumprimento das práticas”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, referindo-se ao atendimento das exigências dos importadores. Se o produto for temperado, não é permitido o uso de ingredientes que não sejam halal. O mercado muçulmano proíbe o abate mecânico dos animais, como é o padrão na indústria brasileira, e requer o manual, com uso de utensílios adequados, como faca suficientemente afiada para evitar o sofrimento e causar a morte rápida. Além disso, todo o processo deve ser acompanhado por inspetor muçulmano treinado para a função.

No Rio Grande do Sul, os embarques para os países do Oriente Médio, onde predomina o islamismo, cresceram 17% de janeiro a maio de 2016, saltando de 118 mil toneladas no mesmo período do ano passado para 138 mil toneladas. No Estado, pelo menos quatro indústrias trabalham com abate halal: a JBS, de Montenegro, a Minuano, de Lajeado, a Languiru, de Westfália, e a Agrosul, de São Sebastião do Caí. “É um mercado de extrema importância e que vem crescendo”, ressalta o diretor executivo da Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav), José Eduardo dos Santos, lembrando que o abate halal representa, em média, 30% das exportações de frango do Estado.

Para o executivo, o diferencial do Rio Grande do Sul está na flexibilidade da indústria para atender às normas e na larga escala de produção. É o caso da Agrosul, que diariamente abate, em média, 75 mil aves dentro dos padrões halal. Embora a produção não seja toda destinada a este público, todos os animais são abatidos manualmente, respeitando os preceitos halal. É assim desde 2003, quando o frigorífico passou a atender a esse mercado.

Presidente da Agrosul, Nestor Freiberger explica que é “muito difícil separar” as linhas de produção. Por isso, a decisão de unificar o sistema pelo padrão halal. Outro fator que influenciou foi o crescimento das comunidades muçulmanas locais, decorrente da chegada de trabalhadores estrangeiros. O movimento mais recente já dá reflexos positivos. De janeiro a junho de 2016, 3% da produção média para o período, que chegou a 19,8 mil toneladas, foram destinados a clientes do mercado interno que exigiam certificação de comunidade muçulmana. No primeiro semestre do ano passado, 1,2% da produção foi destinada à comunidade muçulmana já instalada no Brasil.

No acumulado de janeiro a junho de 2016, a Agrosul exportou 6 mil toneladas de carne de frango. Deste total, 2,2 mil toneladas, ou 37%, foram produtos halal destinados a países muçulmanos como Arábia Saudita, Emirados Árabes, Líbano e Omã. O volume dobrou se comparado ao mesmo período do ano passado, quando a empresa embarcou 1,1 mil toneladas em frango halal — 21% de um total de 5,2 mil toneladas de carne exportada.

Pesquisador em Relações Internacionais da Fundação de Economia e Estatística (FEE), Ricardo Leães destaca que a participação dos países muçulmanos no destino das exportações vem crescendo nos últimos cinco anos. Um dos motivos, explica, é que as sanções dos Estados Unidos, que dificultavam o acesso ao crédito internacional, foram levantadas, permitindo que estes países voltassem a negociar. Como exemplo, cita a participação da Arábia Saudita nas exportações gaúchas, que cresceu de 1,32% em 2014 para 1,94% em 2015. Segundo Leães, são países para os quais o Brasil não deu importância por muito tempo, mas que têm potencial. “Não são produtores de alimento e têm renda significativa”, destaca o pesquisador.

Curiosidades

• Halal, segundo o Alcorão — livro sagrado do Islã —, é aquilo que é permitido para o consumo;

• A primeira exportação de carne halal do Brasil ocorreu em julho de 1975, quando um pool de empresas catarinenses embarcou 650 toneladas para a Arábia Saudita e o Kuwait;

• Das 4,3 milhões de toneladas de frango exportadas pelo Brasil, em 2015, 48% ou 2,08 milhões de toneladas foram de frango halal, segundo dados da ABPA. 

Os passos do ritual

Na Agrosul, de São Sebastião do Caí, os dez trabalhadores que atuam na sangria são senegaleses. Desta forma, além de dar oportunidade aos estrangeiros, a empresa atende à exigência, que prevê que os sangradores sejam, preferencialmente, muçulmanos. Os sangradores, como são chamados os profissionais que fazem o abate manual, têm o trabalho vistoriado pelo inspetor muçulmano Said El Moutaqi, que visita as indústrias da região uma vez por semana, em média. Nascido no Marrocos, Said é formado em Biologia e atua no setor desde 1994, quando mudou-se para a região do Vale do Caí. O inspetor trabalha para a certificadora CDIAL — Centro de Divulgação do Islam para América Latina, de São Paulo.

Um dos princípios a serem seguidos é a oração. A frase “em nome de Deus, Deus é maior” deve ser proferida sempre antes de iniciar o abate de cada lote, que tem, em média, 5 mil aves. “É uma forma de pedir perdão por estar sacrificando aquele animal, que será transformado em alimento”, explica Said. O inspetor destaca que o abate manual proporciona o bem-estar animal. “O coração continua bombeando sangue e, assim, o animal não contrai os músculos”, explica o inspetor muçulmano, acrescentando que desta forma é possível garantir a qualidade da carne. Estudos indicam que, causando a morte instantânea do animal, é eliminada qualquer possibilidade de liberação de toxinas que contaminem a carne.

A posição do frango no momento da degola é outro detalhe do ritual islâmico. A ave precisa estar direcionada a Meca – cidade da Arábia Saudita considerada a mais sagrada do mundo para os muçulmanos. Para tanto, Said carrega consigo uma bússola. Após a degola, o frango passa pelo túnel de sangria durante pelo menos três minutos e meio para que todo o sangue seja removido. A retirada do sangue garante quem se o animal estiver com alguma moléstia, as chances do ser humano ser contaminado são menores.

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