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Inspeção diária em frigoríficos do País pode acabar em 2019

Tereza Cristina disse que essa será uma de suas primeiras medidas


A futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina, quer alterar o processo de inspeção de carnes e derivados produzidos no País, acabando com a fiscalização diária do governo. A medida beneficia principalmente os frigoríficos, hoje submetidos a auditorias diárias feitas pelo servidores públicos do ministério. As regras de vigilância sanitária determinam que é função do governo - e não do produtor de carne - fazer a inspeção sanitária diária da carne, desde antes do abate dos animais até a sua produção para consumo. O plano da nova ministra da Agricultura é fazer com que o setor adote "práticas de autocontrole", com protocolos de segurança estabelecidos pelo governo, mas sendo auditados pelo poder público apenas "de tempos em tempos", sem a necessidade de ter um agente do ministério presente fisicamente, todos os dias, nos frigoríficos do País.

Tereza Cristina disse que essa será uma de suas primeiras medidas. "Simplificação não é precarização. Com responsabilidade e seriedade, vamos dar agilidade e reduzir custos. Com o autocontrole, a responsabilidade é do produtor, seja sobre os equipamentos, seu pessoal ou a qualidade do que tem de sair dali. Ele deve cumprir a regra, o que ele terá de fazer é seguir um protocolo detalhado", declarou a ministra. "A fiscalização do ministério será uma auditoria feita de tempos em tempos. Se achar que não está bom, vai lá toda semana."

O modelo atual, segundo ela, limita a autonomia dos frigoríficos. Hoje, a produção não pode ser ampliada para o fim de semana porque os fiscais do ministério não trabalham sábado e domingo, e não podem receber hora extra. "Com essa medida, não tem problema nenhum, pode trabalhar sábado, domingo, à noite, três ou quatro turnos", disse. "Isso é o que esse governo novo quer implantar, onde puder. Cada um tem de tomar conta do seu pedaço, com responsabilidade."

O autocontrole, afirma, já é utilizado em várias partes do mundo. "É um processo usado em parte da Europa. O ministério faz a fiscalização do animal vivo, para ver se ele está em perfeita condição de saúde para ser consumido. Mas, internamente, o controle é da empresa, do frigorífico."

O processo de inspeção de carnes brasileiro esteve no centro das investigações da Operação Carne Fraca, realizada pela Polícia Federal em março de 2017. As investigações apuraram a atuação de auditores fiscais sanitários e suas relações com grandes frigoríficos, levando ao fechamento de algumas plantas pelo País. Delatores confessaram que empresários pagavam mesadas para funcionários do Ministério da Agricultura para que pudessem escolher os fiscais do governo que atuariam dentro das unidades fazendo vista grossa na vigilância.  

Estado é vital na fiscalização de carnes e derivados, alega Blairo Maggi

O atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, um dos principais produtores rurais do País, não acredita na possibilidade de a proposta da nova ministra da pasta, Tereza Cristina, ter efeito prático. Para o consumidor brasileiro, disse Maggi, o governo pode aplicar a regra que quiser, mas, quando o assunto é exportação, a situação torna-se completamente diferente. Tereza Cristina quer alterar o processo de inspeção de carnes e derivados produzidos no País, acabando com a fiscalização diária do governo.

De acordo com Maggi, é o mercado internacional que exige a presença física e diária, nos frigoríficos, de um auditor sanitário ligado ao poder público, e não um funcionário da própria empresa. "Quando cheguei ao Ministério da Agricultura, eu também tinha a ideia de limpar tudo e deixar a responsabilidade apenas com os frigoríficos. O tempo e a experiência da Operação Carne Fraca (em março de 2017) foram me mostrando que isso não é possível. Se o Estado sair lá de dentro, vai dar confusão. A presença do Estado ainda é necessária lá."

Maggi citou imposições feitas ao exportador brasileiro pelos EUA e pela Europa. "Os norte-americanos não aceitam, hoje, que funcionários de inspeção sejam vinculados ao frigorífico. Eles exigem que se tenha algum agente público ali, fisicamente, inclusive depois do abate do animal", disse. "Quando você abre uma carcaça, você tem de ter alguém ali que não seja da empresa para verificar se há algo que possa fazer mal para o consumo humano. É muito difícil uma mudança sobre isso, porque isso está vinculado aos nossos certificados de exportação. São exigências de mercado comprador."

Sobre os consumidores europeus, o ministro declarou que as medidas têm sido ainda mais duras, exigindo não apenas que os auditores sejam servidores públicos, mas também seus ajudantes. Hoje, há cerca de 2,5 mil auditores fiscais federais em todo o País, sendo que, na área de inspeção animal, atuam, aproximadamente, 800 profissionais. O quadro de ajudantes desse time, porém, chega a 12 mil pessoas, as quais são contratadas pelos frigoríficos.

CRMV-RS defende garantia da segurança alimentar da população

O Conselho Regional de Medicina Veterinária do Rio Grande do Sul (CRMV-RS) divulgou nota oficial a respeito da polêmica sobre a inspeção de carnes e derivados. O texto destaca a importância do controle de qualidade dos alimentos e aponta que, quando esse controle é realizado pela própria empresa que lucrará com a venda dos produtos, gera um grande conflito de interesses. "Nosso compromisso é garantir que o interesse econômico da indústria e do comércio não se sobreponha aos interesses da saúde pública", diz o documento, assinado pela presidente do CRMV-RS, Lisandra Dornelles.

A nota busca orientar médicos-veterinários e zootecnistas que, independentemente do modelo de inspeção adotado pelo governo, os profissionais devem continuar zelando pela excelência dos serviços prestados à sociedade. "Nossa preocupação vai além da economia ou das políticas internacionais: queremos, antes de qualquer coisa, a garantia da segurança alimentar da população", defende o CRMV-RS, ao apontar que seguirá fiscalizando a atuação dos profissionais responsáveis, sejam eles servidores públicos ou não.

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