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Mais camarão e menos atum na balança de pescados


Na balança comercial de pescados, mais uma vez o camarão cultivado teve um peso decisivo e impediu que o Brasil, com 8,4 mil quilômetros de litoral, amargasse déficit nas trocas internacionais do setor. Sobre o saldo positivo de US$ 129,2 milhões o crustáceo adicionou mais US$ 46 milhões, perfazendo US$ 175 milhões em divisas em 2002 - ou metade da pauta de pescados - conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex).

Em menor escala, outro crustáceo - a lagosta - também favoreceu o superávit. As vendas internacionais subiram de US$ 58,5 milhões, em 2001, para US$ 70,9 milhões, alta de 21%. Mas a grande força na alavancagem da balança é mesmo o camarão criado hoje nos estados nordestinos - sobretudo no Ceará, que responde 32% das exportações.

As estatísticas deixam bem claro que a carcinocultura, cultivo de camarão em viveiros, e não a pesca extrativista é que infla os números. O Pará, por exemplo, que se destaca pela captura do crustáceo no mar, assiste à decadência da atividade: as vendas externas recuaram de US$ 24,2 milhões, em 1999, para US$ 17,2 milhões, no ano passado, queda de 29%. No intervalo, a participação relativa caiu de 61% para 10%.

Entre 1999 e 2002, o camarão de cultivo aumentou em 353% as remessas ao exterior - saltou de US$ 40,2 milhões para US$ 175 milhões, apesar da acentuada queda no preço externo que recuou de US$ 7,9 para atuais US$ 4 o quilo.

Em 1999, quando a balança verificou déficit de US$ 150 milhões, o crustáceo trouxe em divisas US$ 40,3 milhões. No ano seguinte, as vendas evoluíram em US$ 64,9 milhões e o setor pesqueiro acusou o impacto - o saldo negativo recuou em US$ 91,3 milhões. É fato que a reação na balança teve forte influência da desvalorização do real ante o dólar nesse intervalo, mas grande parte do mérito precisa mesmo ser creditado ao camarão.

"Excluindo o camarão de cultivo e, em menor grau a lagosta, não se verifica nenhum dinamismo no setor pesqueiro", diz Sérgio Melo, gerente setorial de Pescados do Programa Especial de Exportações (PEE), ligado Ministério de Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior (Mdic). "Só o camarão sustenta o desempenho da balança comercial", afirma Célio Antônio, diretor da recém criada Secretaria Especial de Pesca e Aqüicultura.

Queda do atum

A grande frustração em 2002 é atribuída ao item "atum e afins" - cuja captura vinha em expansão, alimentado esperanças no governo de somar divisas às exportações. Após acumular alta de 97,5% entre 1999 e 2000, e continuar evoluindo no ano seguinte, houve diminuição dos embarques internacionais em 2002.

No ano passado, as vendas externas de atum caíram 16,2%, no comparativo com 2001, que somaram US$ 19,24 milhões. O mais preocupante, segundo analistas, é que o decréscimo não está associado a nenhuma mudança do mercado em termos de demanda ou queda da cotação internacional. "Houve redução no volume de captura", afirma Sérgio Melo, gerente do PEE.

Segundo Melo, a concentração do esforço de captura em áreas determinadas levou a um relativo esgotamento desses bancos de pesca. "Isso poderia ser compensado com o deslocamento da frota pesqueira para outras regiões, até porque o atum é espécie migratória." A solução aparentemente simples, porém, embute uma série de nuances que saltam da esfera técnica e econômica e resvala até na diplomacia.

Como não possui frota própria em quantidade ou tecnologicamente competente para realizar a pesca em águas profundas e acompanhar os deslocamentos dos cardumes, o Brasil recorre ao arrendamento de embarcações de outros países - estima-se que dos 90 atuneiros em atividade, 67 são estrangeiros. Na prática, isso reduz a autonomia do setor pesqueiro, que trabalha com equipamentos de eventuais concorrentes.

No final de 2001, quando o Brasil conseguiu, após árdua negociação, elevar de 2,3 mil para 4,7 mil a cota de captura da espécie espadarte, nas suas 200 milhas marítimas, a Espanha suscitou a possibilidade de recolher as embarcações arrendadas ao Brasil. No âmbito da Comissão Internacional para a Conservação do Atum Atlântico (Iccat), havia prazo para o Brasil atingir as novas cotas, sob pena de perdê-las.

À época, o então diretor do Departamento de Pesca e Aqüicultura do Ministério da Agricultura, pecuária e Abastecimento(Mapa), Gabriel Calvazara, ameaçava recorrer ao Tribunal Marítimo Internacional, ligado à ONU, para conter a manobra dos espanhóis, que possuíam 25 embarcações a serviço do Brasil. Também se cogitava a nacionalização das embarcações estrangeiras.

Decorrido mais de um ano, o problema do arrendamento, da nacionalização ou financiamento de frota nacional continua sem definição. "O arrendamento pode ter influenciado no resultado da pesca em 2002", diz. Este ano, a Secretaria Especial de Pesca suspendeu o arrendamento de embarcações estrangeiras.

A maior pretensão das autoridades ligadas à pesca é montar uma frota nacional. "Será que o Brasil não tem capacidade para construir 60 ou 70 barcos atuneiros?", questiona Célio Antônio, diretor da Secretaria de Pesca. No novo governo a pesca figura como "commodity prioritária", e estão sendo buscados recursos para financiar a construção de embarcações, cujo custo varia de R$ 2 milhões a R$ 4 milhões.

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