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Mais moinho, mais trigo, menos importação

Porém, falta uma política de incentivo e estímulo à triticultura brasileira



A inauguração de mais um moinho de trigo, na semana passada, em Ponta Grossa, região dos Campos Gerais, vem ao encontro à necessidade de o Brasil diminuir a dependência externa do cereal. Mais uma indústria deveria, em tese, representar mais segurança ao produtor e liquidez ao trigo nacional, em especial à produção regional. Mas nem sempre é isso que acontece. Tem produtor no Paraná que deixou de plantar o cereal mesmo morando ao lado do moinho. Cansou de ver o trigo importado chegando enquanto o seu produto perecia no armazém por falta de preço.

A indústria, infelizmente, não é garantia nenhuma de preço e mercado ao produto interno. É preciso mais do que isso. Ainda falta uma política de incentivo e estímulo à triticultura brasileira. Não dá para admitir, e o mundo também não consegue entender, como é que um país como o Brasil, o celeiro do mundo, não consegue ser autossuficiente em produção. Ter de importar praticamente a metade do consumo é no mínimo uma heresia para um país com as características e o potencial agronômico do Brasil.

No ano passado, por causa de problemas climáticos, a produção caiu a 5,5 milhões de toneladas e ampliou a dependência externa para mais de 70% do consumo. Em 2014, com área maior e clima favorável, a expectativa é alcançar mais de 7 milhões de toneladas. Num primeiro momento, parece que vamos importar menos trigo, já que a produção é maior. Na prática, porém, tudo vai depender de preço. Porque se estiver mais interessante trazer o cereal de fora, os moinhos não hesitarão em fazê-lo.

Os moinhos, então, são bem vindos. Mas eles precisam vir acompanhados de uma política de preço e valorização do produto nacional. Se a questão é qualidade, argumento fortemente usado pela indústria para trazer o trigo de fora, que se invista em pesquisa e melhoramento. Quando a produção é menor, importo para garantir o abastecimento. Quando a produção é maior, importo porque preciso de qualidade. O produto e o produtor nacional pouco importam. O que manda aqui é preço, em um discurso mascarado na qualidade.

Se o trigo argentino ou norte-americano chega aqui mais competitivo que o nacional isso tem a ver não apenas com os moinhos, mas com o governo, que favorece a entrada do cereal estrangeiro. Ou seja, continuamos importando ao invés de atacar o problema na base, em sua essência. Por interesses outros, o Brasil não tem e parece que não quer ter uma política para o trigo. Para a autossuficiência é preciso, primeiro, vontade política. Produzir trigo é de ordem pública. O interesse primeiro deve ser com a segurança alimentar e não exclusivamente comercial, dos moinhos.

A indústria inaugurada na semana passada é fruto da intercooperação entre as chamadas cooperativas do ABC: Batavo, Capal e Castrolanda. O moinho mais tradicional do sistema é o da Cotriguaçu, em Cascavel. Na última década, porém, surgiram vários projetos, como da antiga Corol, da Coopavel e da Coamo (em construção). Tem ainda as indústrias da Agrária e da Coagru. A natureza das cooperativas sugere que esses moinhos devem valorizar a produção e o produtor cooperado, dar liquidez e garantir mercado ao cereal da casa. O que elas não garantem é preço.

As cooperativas do ABC informaram que 90% da matéria-prima do novo moinho virão dos cooperados e apenas 10% serão de fora. Ao produtor é esperar para ver. Ao moinho é pagar para ver. O modelo cooperativo é tudo de bom à triticultura. Mas não será fácil ser competitivo no campo e na indústria, garantir resultado à indústria e rentabilidade ao produtor. O êxito da estratégia cooperativista terá, necessariamente, que vir acompanhada de um esforço na implantação de política pública de apoio ao setor. Não será nem um pouco interessante à imagem das cooperativas se, por motivos econômicos, daqui a pouco, elas tiverem que importar mais trigo em detrimento do produto de seus cooperados.

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