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Novo código florestal divide produtores e ambientalistas

Relatório não é consenso nem entre os produtores nem entre ambientalistas


O novo código florestal aprovado pela comissão especial da Câmara dos Deputados deve ir a plenário após as eleições. Amplamente debatido com a sociedade, o relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) não é consenso nem entre os produtores nem entre ambientalistas. Questões cruciais como reserva legal, Áreas de Proteção Permanente (APPs), proteção de rios e nascentes parecem não aplicáveis a todas as regiões do Brasil, diante da diversidade de modelo agrário do imenso território brasileiro. Para debater o tema, o Jornal do Comércio reuniu em seu estande na Expointer o advogado e ambientalista Gustavo Trindade, a bióloga da Fundação Zoobotânica Luiza Chomenko, o representante da Farsul Ivo Lessa e o deputado federal Luis Carlos Heinze (PP-RS).

JC - A respeito do novo código florestal, de que forma isso interfere na vida do produtor e de que forma afeta o meio ambiente?

Gustavo Trindade - As alterações na legislação florestal estão na contramão da história, enquanto todo o planeta busca uma série de medidas para evitar e emissão de dióxido de carbono e o Brasil assume compromissos internacionais no que tange à redução de suas emissões, a proposta de alteração do código florestal leva a possibilidade de um aumento considerável da reversão de áreas naturais por áreas desmatadas. Isso sem uma necessidade econômica qualquer, pois já temos a possibilidade de uma expansão da fronteira agrícola sem que haja necessidade de qualquer flexibilização na legislação ambiental. As introduções e as modificações trazidas no projeto de lei que altera o código florestal consolidam e legitimam a ilegalidade, permitem a manutenção de uma série de atividades muito prejudiciais à agricultura em área de preservação permanente, consolidam ocupações em nascentes e margens de cursos de água. Da mesma forma, a redução e as condições para a manutenção da reserva legal, em especial com os grandes prazos para a sua composição, com a possibilidade de ocupação de 50% com espécies exóticas, também vão trazer prejuízos para a agricultura.

Luiza Chomenko - Inicialmente, quero reiterar que no Rio Grande do Sul, diferentemente do resto do Brasil, já se discute meio ambiente na área rural há muito tempo, enquanto nos outros estados esse parece ser um tema novo, que foi um tabu durante muito tempo. Entretanto há questões que acho importantes trazer para essa discussão. Por exemplo, a questão de que a discussão do código florestal se restringe apenas ao meio rural. Isso é um erro, ele interfere na vida de todo cidadão brasileiro, esteja ele no meio rural ou urbano. Aí nós podemos falar inicialmente na ocupação das áreas de proteção permanente (APPs). Nas áreas urbanas também se observa agressão às APPs, permitindo-se a implantação de empreendimentos, de obras e de ocupação humana. Isso não está sendo discutido nas cidades, parece que não tem nada a ver. Estamos produzindo o maior retrocesso das últimas décadas. Aí sim, vamos discutir bem a questão agrícola. Estou vindo de um evento em Uruguaiana que envolveu Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai, e lá o tema centrado era a conservação da natureza e produção rural. Vimos que os representantes dos outros países estão muito preocupados com o mercado internacional e, para a minha surpresa, um representante do Uruguai, que é do setor produtivo, não da área ambiental, trouxe um manual de boas práticas que o Uruguai está implantando no setor rural, com várias regras já visando a questões de mercado. Ele deixou bem claro que o mundo inteiro está pedindo produtos mais limpos, ambiental, social e economicamente mais viáveis. Os representantes do Brasil que falaram - até levamos um susto - se colocaram na contramão daquilo que os outros estavam falando, acho que alguns dos que estiveram lá não se deram conta de que o discurso mudou.

Ivo Lessa - Há um desconhecimento muito forte daquilo que acontece no Rio Grande do Sul, nós temos uma situação totalmente diferenciada do resto do País na questão de produção. No Rio Grande do Sul eu não conheço nenhum rio que tenha morrido em uma propriedade rural. É necessário trazer ao debate a questão jurídica acompanhando a questão técnica. Em 2004/2005 nós discutíamos aqui mesmo na Expointer a mortandade no Sinos, e quais foram as ações? Na semana passada teve outra mortandade de peixes no Vale do Sinos. Questão do prazo: o que é curto ou médio prazo na questão ambiental? Cinco? Dez anos? Como dizer a um produtor rural com seus 50 ou 60 anos de atividade na região da colônia, por exemplo, que ele vai ter que mudar a sua cultura? Há muita coisa a ser discutida, mas vou deixar uma coisa bem clara, o maior inimigo do bom é o ótimo, nós estamos insistindo no péssimo ou no ótimo? Temos que encontrar condições de atingir o bom.

Ivo Lessa:
"No Rio Grande do Sul, nós temos uma situação totalmente diferenciada do resto do País na questão de produção."

Luis Carlos Heinze - Sou agrônomo, tenho curso técnico agrícola e além disso sou produtor rural e ninguém mais do que o produtor quer preservar. O importante é todos entenderem que, se a gente for partir para essa legislação da forma que os ambientalistas querem, fica mal. Os americanos não fazem o que dizem, os europeus também não, e a preconização que vem de determinadas fontes preocupa. Eu tenho ojeriza por organizações como a WWF (World Wildlife Fund). Por que eles não vão cobrar da Inglaterra e dos seus países o que eles vêm preconizar aqui dentro do Brasil? Idem para o Greenpeace e outras ONGs. Vemos alguém como Al Gore, ex-vice-presidente dos Estados Unidos, ganhando dinheiro com best-seller e filmes querendo interferir aqui, e isso nos deixa preocupados. Como é na Europa? Quero saber se eles têm margens preservadas. Não têm. Tudo que eles preconizam para o Brasil lá eles não fazem.

JC – Da proposta do deputado Aldo Rebelo aprovada pela comissão especial da Câmara que introduz o novo código florestal o que poderia ser modificado ou aperfeiçoado?

Heinze - O início da “conversa” dessa comissão especial era para tratar do meio rural e do meio urbano, mas tiraram fora o urbano. Nós queríamos também discutir o meio urbano; a discussão ficou mais centrada no rural, porque não quiseram modificar a outra parte.

Trindade - Algumas considerações devem ser feitas para debater o código florestal. Primeiro é retirar o tom ideológico. Reserva legal, por exemplo, não é uma área onde não se possa ter produção agrícola, reserva legal não é uma área em que não se possa ter uma produção sustentável. Pode-se produzir, pode-se ter renda, inclusive defendo que na área do Pampa se possa ter gado em reserva legal.

JC – Existe um levantamento de quanto se perderia em área com a aplicação do novo código florestal?

Trindade - O ônus da degradação ambiental não vai ser sofrido só pelo agricultor, mas por toda a sociedade. Um estudo da Embrapa e da Universidade de Campinas, chamado “Aquecimento global e a nova geografia da produção agrícola no País”, faz uma análise das maiores culturas do País: algodão, café, arroz, cana-de-açúcar, feijão, girassol, mandioca e soja. Ele refere que com as alterações causadas pelas mudanças climáticas e impulsionadas pela possibilidade de aumento de áreas degradadas, se teria uma perda de grãos na ordem de R$ 7,4 bilhões em 2020 e de R$ 14 bilhões em 2070. Isso é um dado da Embrapa e do Ministério da Agricultura. No Rio Grande do Sul, onde a soja representa o maior valor de produção, o estudo refere que será a cultura que mais deve sofrer com a elevação da temperatura. Esse estudo técnico demonstra que o Rio Grande do Sul vai deixar de ser um território de soja, passando a ser um território para plantio de café e cana-de-açúcar, em razão do aquecimento.

Lessa - Como existem pesquisas que afirmam que o mundo está esquentando, também existem estudos que dizem que o mundo está esfriando, então não se deve levar tão a sério (os dados). Na semana passada, assisti a uma audiência na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que concluiu que a reserva legal e a APP são passíveis de indenização. A conclusão é que, desde que legalizadas, são passíveis de indenização.

JC - A União teria que indenizar?

Lessa – Claro, existe essa posição também.

Heinze - Dizem que o Brasil é um dos maiores poluidores do mundo. Mentira! Ninguém fala da Inglaterra, ninguém fala de quantos milhões de automóveis tem lá, alguém fala disso? Por que eu, que sou agricultor, tenho que pagar essa conta. Vou acrescentar dados de um estudo que a Embrapa fez: se apertarem a legislação brasileira, eles (produtores norte-americanos), vão faturar US$ 280 bilhões de 2012 a 2030, porque aqui existe todo esse rigor da legislação e lá eles não têm. Vão ganhar em cima do nosso mercado. Isso é interesse econômico. Eu não discordo da exigências do código, desde que eu (produtor) não tenha que pagar a conta sozinho. Se todos pagarem, não tem problema.

Luis Carlos Heinze:
" Por que só eu, que sou agricultor, tenho que pagar essa conta?"
(...)
Eu não discordo da exigências do código, desde que eu (produtor) não tenha que pagar a conta sozinho. Se todos pagarem, não tem problema.

JC - O ônus ao produtor pode ser mensurado?

Heinze - Estudos indicam que a aplicação (do código) inviabilizaria em torno de 100 mil propriedades no Rio Grande do Sul. Notadamente as pequenas propriedades. As maiores vão ter prejuízo, vão fechar as porteiras se aplicarmos a lei como está posta hoje.

Luiza - O Brasil tem seis biomas: Mata Atlântica, Caatinga, Cerrado, Pantanal, Amazônia e o Pampa. O Pampa é o único bioma do Brasil em que a vegetação dominante é campestre, com pequenos capões de mata. Isso significa que se seguirmos a lógica de que temos de ter reserva florestal (no Pampa), então vamos acabar com o bioma Pampa, que faz parte de um ecossistema mundialmente colocado. Se seguirmos a lógica de que o código tem que ser florestal, acabemos com todo o Pampa, com as reservas e com as áreas úmidas; vamos encher tudo com eucalipto, pinus, grãos e tudo o que quiserem, sem levar em consideração as questões naturais. Não vou ser louca em sugerir que acabemos com a produção de arroz no Estado que está toda em APP. Realmente está, mas foi em outro momento, nós não tínhamos APPs naquela época. O que podemos é tentar conciliar, não expandir essa plantação.

JC - Todos concordam que o que já foi degradado não tem que ser reposto?

Luiza - Tem uma questão que acho importante e não sei por que ela também não está sendo discutida. Por exemplo, a questão da indenização por serviços ambientais.

Heinze - Ela está sendo discutida, já existe projeto.

Luiza - Mas o que quero dizer é que a população de uma maneira geral não está nem sabendo dessa discussão. Todo mundo sabe que apareceu o código florestal, considerado o horror do meio ambiente, mas ninguém fala sobre os serviços e os bens que o meio ambiente presta. Trabalho também como professora em curso de pós-graduação em gestão ambiental e o desconhecimento é muito grande. As informações não chegam de uma maneira certa na população. Chegam sempre com um viés, como se fosse uma questão política e ideológica.

Heinze - Como nacionalista, quero proteger o Brasil, não como um Al Gore ou uma WWF. Imagina alguém daqui ir lá na Holanda ou na Inglaterra e fazer o que eles (as ONGs) fazem aqui no Brasil.

Luiza – Morei anos no exterior e voltei porque acho que posso contribuir para o meu País, porque podia ter ficado muito bem vivendo na Alemanha. Mas não posso comparar uma situação de países que têm 2 mil anos de história, isso significa 2 mil anos ocupando todas as áreas possíveis, com o Brasil que tem 510 anos. Se lá deu errado e hoje eles estão cobrando de nós exatamente porque eles fizeram errado, será que preciso primeiro fazer o erro para depois corrigir?

Heinze – Acredito que será feito em cada estado um zoneamento pela academia, com participação de biólogos, agrônomos e botânicos. Eles vão dizer quantos metros de distância é preciso preservar nas margens dos rios. Por que as ONGs não querem que a gente descentralize o tema de Brasília? O Ministério do Meio Ambiente só escuta o Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente). Queremos que cada estado tenha a sua legislação. Assim como existe deputado safado, vejo gente safada de ONGs também, a serviço do capital e ganhando dinheiro.

Lessa - Nós estamos discutindo a questão científica, nesse ponto tenho certeza de que ninguém aqui analisou mais do que eu o censo agropecuário de 2006 do IBGE. Mais de 50% da população do meio rural não é alfabetizada, essa é a realidade. Então, vamos discutir uma legislação científica feita em cima desse produtor, dessa realidade? No último inventário florestal, o Rio Grande do sul, que tinha 17,5% de área florestada, hoje está chegando a 19%. O Pampa tem 41,3% de área preservada.

Trindade - Corrigindo, tem 36% de área preservada.

Lessa - Ok, nós precisamos de 20%.

Luiza - Área remanescente está longe de ser área preservada, isso é menos de 1%. Eu estou dando o valor de vegetação nativa remanescente, mas isso não quer dizer que ela esteja preservada. Eu sou partidária de que nós tenhamos, por exemplo, a utilização do campo, do Pampa, com agropecuária extensiva. Isso é alguma coisa que temos que nos preocupar porque estão começando a discutir para o Brasil gado confinado. Estamos querendo nos matar, gado confinado para o Brasil é o suicídio total, por causa de toda questão do balanço de carbono. Gado a campo é o gado nobre de ?toda a carne e quem é da área rural pecuária sabe do que eu estou falando. Pecuária intensiva, confinada, mata a pecuária do Brasil. Espero que os gaúchos tenham o bom-senso de não cair nessa balela. O pessoal do cerrado está começando, vi que os criadores de ovelha no Rio Grande do Sul estão pensando em fazer isso.

Trindade - Não tenho dúvidas de que deva haver alterações no código florestal, na legislação que ao longo do tempo não foi aplicada e começou a ser aplicada muito menos por imposição de uma penalidade, mas por uma exigência de mercado. Se a gente pegar os grandes frigoríficos do Norte, Mafrig, Betin, Friboi, todos já assumiram o compromisso de só adquir carne de áreas que não tenham sido desmatadas até 2009. Na própria questão de produção de cana, diretivas da Comunidade Europeia só permitem comprar etanol brasileiro de áreas que não foram convertidas a partir de janeiro de 2009. É uma questão de respeito a uma legislação ambiental e a regras de sustentabilidade, deixa de ser uma exigência meramente legal para ser uma exigência de mercado.

JC - Seguindo métodos ambientais corretos o produtor se beneficia com melhor preço, para a exportação, por exemplo? Onde está a vantagem de mercado?

Luiza - O pessoal da soja perdeu um mercado internacional que tínhamos chance de conquistar com produção não transgênica.

Trindade - Não vejo grandes vantagens em função de preço, mas condições para vender. A Comunidade Europeia não compra etanol de áreas que não seguem preceitos aceitos. São regras cunhadas internacionalmente que possuem interferência em nossa economia. Se quisermos ter mercado, o mundo exige que tenhamos mercado voltado para a sustentabilidade. O mercado exige isso.

Lessa – Da soja que estamos produzindo, o maior comprador é a China, e o que eles querem é preço. No ano passado, os Estados Unidos produziram arroz transgênico, o que aconteceu no mercado mundial de arroz? Onde está a resistência europeia ao arroz transgênico americano? Existem outras relações comerciais que são extremamente fortes e, felizmente ou infelizmente, o Brasil consegue dar respostas produtivas. Esse é o grande medo do mundo, o Brasil hoje é uma potência em crescimento.

JC - A questão da moratória de cinco anos é consenso entre todos? Quem já desmatou não será punido, mas não se avança em novas áreas?

Lessa - No Rio Grande do Sul não tem a menor diferença, porque o Estado tem uma área agrícola estabilizada há 20, 30 anos. Houve um erro estratégico muito grande, os decretos do Carlos Minc (ex-ministro do Meio Ambiente) foram horríveis para o Brasil. E o ambientalismo defende o ministro Minc. Se há um culpado nessa história, é o ministro Minc. Precisamos avançar na questão cultural, porque se consolidarmos a área produtiva do Rio Grande do Sul, se conseguirmos tratar APP e reserva legal de uma forma conjunta no Estado, vejo pouca dificuldade. Na Metade Sul não há nenhuma dificuldade para implantação. A questão da averbação é outra a ser discutida. A propriedade rural no Rio Grande do Sul deve ter em média hoje de 12% a 15% de APP.

Trindade - Mas o produtor rural admite respeitar os 20% de reserva legal?

Heinze - Esqueça a reserva legal, o que eu quero é reserva ambiental. Vamos estudar todas as bacias hidrográficas, clima, vegetação e solos do Rio Grande do Sul. Pronto. Em cima disso vamos fazer um desenho.

JC - Unificando APP e reserva legal?

Heinze - Isso. Aí vai ter também pagamento por serviços ambientais. É um crime hoje eu chegar para um pequeno produtor de Agudo, de Candelária, de qualquer lugar com 30 hectares de mato e dizer a ele (produtor) que ele não vai receber nada pela preservação e que não pode derrubar uma árvore sequer porque está dentro da reserva legal.

Trindade - É só dar assistência técnica para ele, consultar qualquer agrônomo, para ver se pode usar a área, se pode tirar proveito dessas terras.

Heinze - Participei de 176 reuniões esclarecendo e levantando informações para tentar fazer alguma coisa, mas a lei é tão absurda que não tem como.

Luiza Chomenko:
"Por isso que digo que no Rio Grande do Sul a situação é um pouco diferente, mas o código é nacional. Ele remete aos estados, mas também com os regramentos distintos. Alguns aspectos nossos aqui não estão contemplados. ."

Luiza – Há anos, quando eu fazia os licenciamentos na região de Agudo, Restinga - são todos pequenos produtores - cansei de atender a produtores cuja propriedade tinha 6 hectares, mas começava lá em cima do morro, ia até a bacia do rio e do lado tinha um arroio. Bom, se eu fosse destinar só a área do arroio como reserva legal, ele não teria nem casa para morar. Eu propus naquela época que todos os produtores da região se juntassem para ver quanto da área total seria reserva, porque um monte de propriedades pequenas correspondem a uma grande. Quase apanhei na região, porque eu disse que não iríamos fazer individual, que iríamos fazer no total e em algum local teríamos uma área que eventualmente compatibilizasse e compensasse o todo. Hoje estamos indo nessa discussão e vejo que esse talvez seja o caminho. Por isso que digo que no Rio Grande do Sul a situação é um pouco diferente, mas o código é nacional. Ele remete aos estados, mas também com os regramentos distintos. Alguns aspectos nossos aqui não estão contemplados. Nós temos uma linguagem, por exemplo, banhado não existe no resto do País. É a área úmida principal no Rio Grande do Sul, porque são as maiores no Estado. não adianta vir me falar de florestas no bioma Pampa.

Trindade - O código é carente de regramentos mais claros para cada região do País. Precisamos de regras mais claras e aí está uma crítica que eu faço. Não está claro aquilo que o produtor pode fazer em uma reserva legal.

Lessa - Estamos trabalhando com a questão das conceituações, das APPs e tudo mais. Concordo plenamente com essa questão da regionalização. Não podemos imaginar hoje uma área de preservação no Pampa sem pecuária, é impossível.

Trindade - A agricultura exige o mínimo de proteção da cobertura vegetal no local. Se temos silvicultura (pínus, eucalipto), temos que reservar um percentual mínimo da vegetação natural.

JC - É consenso que o código deveria prever objetivamente indenização aos produtores que o aplicarem?

Heinze - Lógico, o Brasil tem que perceber. Isso é um patrimônio que o País tem. De preservação da humanidade.

Trindade - Há uma série de acordos que possibilitam isso. A proposta do Brasil levada para Copenhague na questão de mudanças climáticas defende isso.

Heinze - As ONGs colocam aqui recursos para fazer fiscalização que servem para elas. Fazem extensos arrendamentos que amanhã terão algum valor. Eu enxergo que eles têm seus interesses aqui, não querem pagar, querem é lucrar.

Lessa - Os americanos fazem uma política de preservação ambiental para o mundo. Eles colocam bem claro: “produzimos aqui e protegemos lá”.

JC – O que podemos acrescentar ao debate?

Luiza - Temos que começar a planejar ações para o futuro e não podemos mais nos permitir não ter esse planejamento, ou efetivamente vai custar muito caro. O País está em um momento de inflexão, ou ele decide valorizar seus recursos naturais como um insumo para seu desenvolvimento, ou passaremos daqui a um tempo a ter uma cobrança em nível global e local. Temos que tomar uma decisão. Cabe ao País discutir o que acha que será melhor para si: se queremos ter um lucro imediato ou perene.

Gustavo Trindade:
"Acredito que uma discussão sem radicalismo, sem ideologia, pode levar à busca de um meio-termo que siga atendendo interesse de proteção e da produção rural."

Trindade - A discussão do código florestal não pode se resumir em radicalismo, os bonzinhos e os malvados, os ruralistas e os ambientalistas. É possível, com a discussão adequada da legislação florestal, se conseguir regras que tenham o mínimo de proteção ambiental e ao mesmo tempo permitam a manutenção das atividades agrícolas. Essa conjunção entre proteção ambiental e produção agropecuária é fundamental para a sustentabilidade não só do setor rural brasileiro, mas também da própria sociedade brasileira e do próprio destino que o País vai ter. Então, acredito que uma discussão sem radicalismo, sem ideologia, pode levar à busca de um meio-termo que siga atendendo interesse de proteção e da produção rural.

Lessa - Vou citar uma música do João Chagas Leite, “Se os senhores da guerra mateassem ao pé do fogo, deixando o ódio para trás, antes de lavar a erva o mundo estaria em paz”. O Rio Grande do Sul começa a caminhar nesse sentido. Estamos aqui discutindo posições diferentes, isso é extremamente importante, posições contrárias buscando a convergência.

Heinze – A União terá que pagar pelos prejuízos, só que ela não tem recurso hoje para a saúde, educação e saneamento. Como fazer? Não pode só o produtor ser onerado. É fundamental chamar a comunidade internacional para ajudar a pagar a conta. Isso (a produção agrícola) vale mais que o pré-sal. Se o Brasil souber explorar convenientemente suas riquezas naturais e receber por isso terá ganhos. Eles (os estrangeiros) não têm que vir aqui dizer o que temos que fazer. Insisto que a sociedade internacional tem que participar. Eu não quero mais uma oneração para cima do produtor, eu defendo os interesses brasileiros.

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