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Painel da legislação de adjuvantes na América Latina

Regulamentação de adjuvantes é muito pouco praticada no mundo; métodos de ensaio incipientes


Foto: AgrolinkFito

Até o ano de 2017 os adjuvantes no Brasil eram considerados regulados pela mesma legislação dos agroquímicos (Lei 7.802 regulamentada pelo Decreto 4.074) e, portanto, estavam submetidos ao mesmo processo de registro. De acordo com avaliação do pesquisador científico Hamilton Ramos, coordenador do Instituto Agronômico (IAC), isso “não era correto e não atendia ao problema da regulamentação”. 

“Isso porque os adjuvantes, por definição, são produtos ‘sem característica fitossanitária’, ou seja, não controlam praga alguma isoladamente. Também, o único teste agronômico exigido para registro era o de eficácia, ou seja, misturava-se o adjuvante com um inseticida, fungicida ou herbicida qualquer e avaliava-se a interferência no controle. Características típicas dos adjuvantes como efeitos tensoativos, compatibilizantes, penetrantes etc, não eram consideradas. Nesta fase, algumas empresas, visando contornar os elevados custos envolvidos no registro como agrotóxicos, passaram a registrar seus adjuvantes como fertilizantes foliares”, relembra ele ao portal especializado AgroPages.

Após 2017, com a queda da necessidade de regulamentação pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), o número de adjuvantes no mercado aumentou bastante, mas o problema continua. “Isso porque os adjuvantes, apesar de não possuírem característica fitossanitária, alteram as características da calda de pulverização (mistura do defensivo com a água) e podem resultar em efeitos benéficos ou deletérios à pulverização”, alerta. 

Por isso, de acordo com ele, “não é possível fazer uma recomendação adequada sem conhecer a funcionalidade dos adjuvantes, o que, por sua vez, não é possível sem uma regulamentação que permita conhecer tais funcionalidades. A regulamentação de adjuvantes é muito pouco praticada no mundo, existindo métodos de ensaio que podem ser considerados ainda incipientes”. 

A mais estruturada, segundo Ramos, é a desenvolvida pelo Council of Producers & Distributors of Agrotechnology (CPDA) nos EUA, conselho formado por fabricantes de adjuvantes, que entre suas atribuições possui o “Adjuvant Certification Program” que é um programa estruturado de certificação destes produtos. No entanto, o processo se parece muito com o registro de agrotóxicos no Brasil e, dos 17 passos necessários para a obtenção da certificação, apenas um se refere a certificação de funcionalidades. Os demais referem-se a aspectos toxicológicos e de atendimento a legislações americanas como a de transporte. Com relação as funcionalidades, a única exigência do CPDA é que estas sejam analisadas segundo normas da American Society for Testing and Materials (ASTM), quando métodos para isso estiverem disponíveis. E muito poucos estão.

“O problema, portanto, existe, é sério, e o Brasil, como um país agrícola, precisa inovar nesta área. É por isso que o Centro de Engenharia e Automação do IAC, órgão da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, já há mais de 20 anos vem propondo a classificação dos adjuvantes por funcionalidade, buscando desenvolver métodos para a avaliação de cada uma delas e, mais recentemente, lançou o Programa Adjuvantes da Pulverização, buscando sugerir as bases de um Programa de Certificação”, destaca o especialista.

Ele deixa claro que “não se pode analisar apenas uma ou duas funcionalidades por produto pois, como os anos de estudo mostraram, os adjuvantes podem não possuir apenas os efeitos benéficos, mas podem apresentar também os denominados efeitos colaterais. Por esta razão, os adjuvantes devem passar por toda a bateria de testes de funcionalidades, para que os fabricantes possam trabalhar não apenas seus pontos fortes, mas também seus pontos fracos durante o posicionamento do produto. Também, deve ficar claro que os resultados de laboratório sofrerão influência de características do uso no campo como produto a ser misturado, volume de calda aplicado etc., e que, portanto, os testes de laboratório não se destinam a substituir os ensaios de campo”.

O pesquisador científico defende que os critérios devem ser discutidos com fabricantes, pesquisadores e usuários em câmaras técnicas, como a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), transformados em normas para então ser adotados em um Sistema Oficial de Certificação, o que não é um processo muito rápido. “Pela urgência na ação, como forma de obter base técnica para sustentação de suas proposições e para fornecer uma orientação consistente à cadeia adjuvantes, é que o CEA/IAC optou por lançar um programa próprio e voluntário de certificação. Enquanto não houver uma regulamentação, continua a valer no mercado apenas o fator preço, e este tende a não refletir a qualidade nem as consequências ao controle, à saúde do trabalhador ou ao ambiente que o uso inadequado pode representar”, conclui.

Simplificação no Brasil acompanha legislação do Mercosul

João Antônio Ramos Castro, diretor da empresa Gran Agro Produtos Agrícolas, afirma que foi acertada a decisão tomada no Brasil de dispensar o registro de adjuvantes nos mesmos moldes dos agroquímicos. De acordo com ele, nos países do Mercosul – que inclui Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile – a legislação já era muito mais simplificada.

“Em 2017 o Brasil deu um passo no sentido de acompanhar o que já acontecia à sua volta, e com os Atos [Normativos] 104 e 108, do mês de Novembro, cancelou todos os registro e determinou que os adjuvantes já não precisariam mais dos mesmos registros exigidos para os defensivos agrícolas”, explica Castro.

“Isso não foi algo que o Brasil fez por si, mas reflete o que já era adotado no Mercosul, na Europa e nos Estados Unidos e Canadá. Há muito tempo o mercado já comentava que o Brasil deveria avaliar o que ocorria, como eram classificados os surfactantes em outros países. No Mercosul, há muito tempo a legislação já era como hoje é no Brasil, ou seja, apenas a assinatura do químico responsável pelo produto, o número do processo e a isenção de registro no MAPA”, ressalta o diretor da Gran Agro.

México segue os padrões dos Estados Unidos

Ainda de acordo com João Antônio Ramos Castro, as empresas mexicanas seguem muito de perto os padrões dos Estados Unidos. Nos dois países da América do Norte, não há necessidade de registro de adjuvantes, tal como ocorre na maioria dos países do mundo. Uma particularidade, tanto nos Estados Unidos como no México, é que o serviço de aplicação de agroquímicos é feita por uma empresa contratada, que em muitos casos já fornece os insumos. Em função disso, o produtor rural acaba por não comprar agroquímicos diretamente, e sim através de uma empresa aplicadora de defensivos agrícolas.

“No México há empresas que fornecem o serviço de aplicação de defensivos agrícolas, e portanto elas mesmas fornecem os adjuvantes. Não é como no Brasil, que o produtor rural tem seu próprio funcionário aplicador de agroquímicos. No México se contrata uma empresa para aplicar o pesticida como prestador do serviço”, explica.

Na avaliação dele, no México o mercado de adjuvantes é muito mais liberado e o uso desses produtos é muito mais intensivo, tal como acontece também nos Estados Unidos. “Há uma liberdade maior de uso, e portanto se desenvolve mais o produto, se pensa mais no resultado da aplicação. Olhando para esse exemplo, fizemos uma avaliação de como o Brasil possui potencial para aumentar esse mercado”, diz o diretor da Gran Agro. 

“Temos visto no campo que os produtores brasileiros têm usado cada vez menos água e cada vez mais formulações mais concentradas – que requerem mais água. Isso tem ocasionado problemas nas aplicações de defensivos. Isso mostra a falta de tecnicidade dos aplicadores, o que não ocorre em países onde prestadores de serviços são os responsáveis, porque esses profissionais vão usar o melhor produto, os melhores equipamentos e práticas agrícolas”, aponta.

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