Na sexta-feira, dia 12 de setembro, o produtor Luiz Miguel de Oliveira, de Santo Ângelo, no noroeste do Rio Grande do Sul, viu-se diante de uma situação que lembrava um desagradável filme já assistido. Acostumado a receber todo dia 15 o pagamento pelo leite entregue no mês anterior, ele foi informado por uma carta enviada pela Parmalat que, a partir de outubro, o dinheiro só seria depositado na sua conta a cada dia 20.
Cinco dias a mais pode não parecer muito, mas o atraso anunciado a milhares de fornecedores da empresa no Rio Grande do Sul espalhou o temor de que os problemas de 2004 voltem a ocorrer.
Oliveira sentiu aqueles tempos difíceis na pele. Na época, quando a Parmalat quebrou após fraudes contábeis em sua então contradora italiana, Oliveira tinha um saldo referente a 1,3 mil litros de leite a receber, mas só foi ver a cor do dinheiro meses depois, em quatro ou cinco parcelas, lembra.
"Tenho contas para pagar no dia 15", diz o produtor, que já havia entregue 6,6 mil litros para a empresa neste mês e, por precaução, decidiu migrar para a Elegê, adquirida neste ano pela Perdigão. Segundo ele, que produz cerca de 500 litros por dia, o pagamento pelos 13,7 mil litros fornecidos para a Parmalat em agosto, ou o equivalente a cerca de R$ 7 mil, já atrasou, pois só estava liberado no banco no dia 16 de setembro.
Depois da crise da Parmalat em 2004, Oliveira passou a fornecer para outras indústrias e até maio estava trabalhando com a Bom Gosto. "Aí a Parmalat veio e ofereceu um preço melhor", lembra. Eram R$ 0,72 contra R$ 0,62 pagos na época pela Bom Gosto, mas desde então os preços praticados por todas as empresas não pararam de cair. Pelo leite entregue em agosto, ele recebeu R$ 0,55 por litro e agora conseguiu, com a Elegê, dois centavos a mais para o produto fornecido em setembro. "Mas para outubro o preço deve cair", prevê.
Segundo o presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul (Fetag-RS), Elton Weber, alguns produtores foram informados pela Parmalat que só receberão o pagamento a cada dia 25. "Ficamos surpresos e preocupados", diz o dirigente. "Esperamos que isso não seja um sinal de que a situação de 2004 vai se repetir, quando mais de mil produtores no Estado tiveram que recorrer à Justiça para recuperar os atrasados".
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Serafina Corrêa, no nordeste do Estado, Lírio Oldoni, diz que a maior preocupação é que o atraso comunicado agora seja "só o início" de uma crise mais grave. De acordo com ele, cerca de mil produtores de quatro municípios da região entregam em média 200 litros por dia para a Parmalat e alguns já começam a procurar outras indústrias para abastecer.
Em Casca, também no nordeste gaúcho, um produtor que fornece cerca de 150 litros por dia para a Parmalat e pediu para não ser identificado disse que a situação no município é de "desânimo". Em 2004, ele ficou um mês sem receber pagamento, e a empresa só saldou a dívida a partir de três meses depois, em três parcelas. Segundo ele, vários fornecedores da Parmalat na cidade já estão planejando suspender as entregas.
Agronegócio
Pecuarista gaúcho já teme que crise de 2004 se repita
Com a crise da Parmalat, produtores temem nao receber a tempo de pagar seus honorários
Por:
Valor Econômico