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Pesquisa analisa a pecuária sustentável na Amazônia

Apesar do potencial alternativo da região, políticas públicas são ineficientes


Agência Fapesp - Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo. Segundo estudo da USP, apesar do potencial alternativo da região, políticas públicas são ineficientes.

O consumo mundial de carne bovina tem aumentado exponencialmente, levando o Brasil a produzir cada vez mais, para suportar tanto a demanda do mercado nacional quanto internacional. De acordo com pesquisa publicada recentemente na revista Nature, na última década, o país quadruplicou as exportações de carne bovina. A pressão contribuiu para que a pecuária assumisse um papel central principalmente na economia da Amazônia, com impactos ambientais negativos.

Uma pesquisa realizada por pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP) no município de Xapuri, Acre, concluiu que, em determinadas regiões, produtos alternativos poderiam atrair produtores e com isso reduzir a pastagem, diminuindo os danos à floresta. Para isso, seriam necessárias políticas públicas mais eficientes. Enquanto não vêm, as pastagens seguem ganhando terreno, segundo o estudo.

Coordenada pela professora Helena Ribeiro, do Departamento de Saúde Ambiental da FSP-USP, a pesquisa teve o objetivo de avaliar as motivações da crescente pecuarização em território acreano. Para isso, relacionou dados sobre desnutrição, consumo de carne bovina e desmatamento para criação de pastagens. Segundo a pesquisadora, cerca de 40% do abate bovino no Brasil – maior exportador mundial de carne – é proveniente da região amazônica.

“Nosso objetivo foi compreender a dinâmica da produção de gado na região. O consumo de carne vem crescendo aceleradamente no Brasil e no mundo e está associado ao aumento de doenças como obesidade e câncer colorretal”, disse Helena à Agencia Fapesp. Além do consumo, ela explicou que o estudou se baseou em informações sobre desnutrição e produção de alimentos no mundo do Escritório Regional da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).

O consumo de carne bovina também preocupa pelo lado ambientalista: a pecuária é apontada como um importante fator de desmatamento na Amazônia. Segundo Helena, em paralelo à pesquisa sobre dados indiretos, foi realizado um amplo trabalho de campo na reserva extrativista Chico Mendes, na região de Xapuri. O estudo comprovou que mesmo nessas áreas, criadas para a exploração de recursos naturais das florestas, o avanço da criação de gado é visível.

“O trabalho de campo permitiu compreender essa dinâmica”, disse a pesquisadora. O problema é que o crescente consumo gera um mercado cada vez mais robusto e impulsiona o valor da mercadoria. “No entanto, como alternativa alimentar, o consumo de carne é altamente ineficiente, aponta Helena. “Um hectare de terra utilizada para a pecuária produz 34 quilos de carne. Na mesma área é possível produzir 6.500 quilos de milho, ou 3.800 quilos de feijão”, acrescentou.

Por esses números, a pesquisadora defende que uma região de pastagens poderia alimentar uma parcela maior da população, “sem necessidade de desmatamento e ocupação de novas terras. Além disso, a dieta baseada em cereais diminuiria os impactos na saúde”, afirmou. O desafio, segundo ela, é criar alternativas econômicas à pecuária ao se falar em coibir o desmatamento da Amazônia.

A região de Xapuri também produz castanha-do-brasil. De acordo com a pesquisadora, apesar de a atividade ter atraído muitos produtores no início, não foram estabelecidas políticas públicas para criar um mercado. “Assim, o aumento da oferta derrubou o preço da castanha e a cooperativa que existia na região acabou fechando. Os produtores também foram atraídos pela atividade pecuária”, explicou.

Para os pequenos produtores, a criação de gado representa uma reserva de valor. “Cada vez que juntam um pouco de dinheiro, eles compram uma cabeça de gado. Quando há necessidade, eles vendem essa reserva. O plano da reserva extrativista permite que se tenha até 30 cabeças de gado por colocação. Mas vimos colocações com até 600 cabeças. Aos poucos, essa atividade vai avançando sobre a floresta”, disse Helena.

Para ela, as políticas públicas para valorização dos produtos amazônicos, que poderiam reverter esse quadro, são incipientes. “Um dos aspectos apurados pela pesquisa é a facilidade encontrada pelo pequeno produtor para escoar a produção de carne. Os frigoríficos buscam a mercadoria quando eles querem vender. No caso da castanha, da madeira e da borracha, ao contrário, é preciso se deslocar até a cidade para vender os produtos”.

A pesquisadora explica que o mundo produz mais calorias que o necessário para alimentar todos os habitantes do planeta, de acordo com dados da FAO. Ainda assim, pelo menos 850 milhões de pessoas sofrem com a fome. “Mesmo na Amazônia, a maior parte da carne produzida não é utilizada para alimentar a população local, mas enviada ao Sudeste ou exportada”, disse. A pesquisa, que teve apoio da FAPESP na modalidade Auxílio à Pesquisa.

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