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Pesquisador faz palestra sobre recursos hídricos na Câmara Legislativa do DF

Pesquisador da Embrapa Cerrados proferiu uma palestra sobre a importância das questões ambientais em níveis mundial e local.


Em comemoração ao Dia Mundial do Meio Ambiente (5 de junho), o pesquisador Jorge Werneck, da Embrapa Cerrados (Planaltina, DF), proferiu uma palestra na Câmara Legislativa do Distrito Federal sobre a importância das questões ambientais em níveis mundial e local, focalizando a necessidade do planejamento na gestão dos recursos hídricos. O evento foi realizado pelo gabinete do deputado distrital Raimundo Ribeiro (PPS) e pela pesquisadora em meio ambiente e relações internacionais Débora Rodrigues, e contou com a participação de cerca de 50 pessoas, entre estudantes, professores e técnicos da área ambiental.

O pesquisador apontou os cinco grandes desafios da humanidade para os próximos 50 anos (energia, água, alimento, ambiente e pobreza), as tendências de crescimento de demanda (alimento, fibras, energia, mudanças de padrão de consumo, urbanização) e a capacidade de suporte do ambiente (água, solo, uso de solo, biodiversidade). "Em meio a tudo isso, temos o conceito importante do desenvolvimento sustentável, internalizado em todas as instituições e documentos. Mas isso nem sempre é cumprido", observou.

Para contextualizar o uso da terra no Brasil, ele apresentou dados de 2010, que apontam, de acordo com levantamento feito em 2010, que 61% do território nacional era composto por áreas públicas e privadas preservadas, 27,7% por áreas de produção agropecuária (59 milhões de hectares de lavouras e 170 milhões de hectares de pastagens) e 11,3% se destinavam a outros usos, como as cidades.

Werneck lembrou que o Brasil está entre os principais países responsáveis por alimentar a população mundial até 2030 e garantir segurança alimentar, juntamente com os Estados Unidos, a Índia, a Rússia e a China. "Temos, inclusive, uma condição favorável em relação a esses países, e queremos fazer isso de forma sustentável", disse, destacando o incremento da produtividade agropecuária brasileira nas últimas quatro décadas.

Recursos hídricos - em relação aos recursos hídricos, o pesquisador mostrou que o Brasil tem 13,5% da produção hídrica mundial (5.745 km³/ano somadas as vazões dos rios), sendo que, pelo fato de a maior parte do País estar águas abaixo da Amazônia, a disponibilidade hídrica é ainda maior (8.130 km³/ano ou 19% do total mundial). Cerca de 80% das águas brasileiras estão na Amazônia, onde vivem apenas 5% da população.
"A gente usa menos de 1% disso. Em termos de gestão, esses números grandes não querem dizer nada. A gestão de recursos hídricos é feita por bacia hidrográfica", explicou, acrescentando que existem bacias hidrográficas cujo uso está acima da capacidade de suporte, levando a conflitos. "Temos muitos conflitos e aqui no DF, então, eles são de toda sorte", apontou.

O pesquisador aproveitou a oportunidade para esclarecer que a agricultura irrigada utiliza 70% da água que é consumida no planeta, o que segundo ele também não tem importância do ponto de vista de gestão. "Muita gente acha que a irrigação consome 70% da água do mundo, o que é uma informação equivocada", afirmou.
Werneck destacou a necessidade de informações sobre onde a água é consumida, apresentando mapas do crescimento da área irrigada por pivôs centrais no Cerrado em 2002 e 2013, correspondente 5,2% ao ano. "O DF tem sua parcela de crescimento inclusive superior a essa", disse.

Ele apontou as oportunidades brasileiras de mercado interno e externo, a disponibilidade de terras agricultáveis e o potencial para a irrigação, salientando mais uma vez a necessidade de produzir alimentos de forma sustentável, com crescimento econômico aliado à responsabilidade social e ao respeito ao meio ambiente.

Também foram citados alguns dos compromissos internacionais do Brasil, como a redução do desmatamento, a recuperação de pastagens degradadas, implantação de sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), expansão do sistema Plantio Direto, fixação biológica de nitrogênio, plantio de florestas, tratamento de dejetos animais e o incremento da siderurgia de carvão vegetal oriundo de florestas plantadas. "Temos um grande plano para executar esses compromissos, que é o Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono)", afirmou Werneck, citando a iniciativa do governo federal.

O pesquisador comentou sobre o mais recente relatório da ONU, que traz 17 objetivos do desenvolvimento sustentável para o milênio, com 169 metas que tratam de pessoas, prosperidade, paz, parcerias e planeta de forma equilibrada. "Esse documento é muito interessante e pode balizar nossas políticas públicas".

Desafios - Werneck elencou desafios envolvendo água e agricultura, como aumento da produção sem a abertura de novas áreas; aumentar a produtividade da terra; recuperar pastagens degradadas – estima-se que no Cerrado entre 60% e 70% dos pastos apresentem algum grau de degradação, e que a solução do problema viabilizaria a produção da mesma quantidade de carne com a liberação de 50 milhões de hectares de área para outros usos; aumentar a produtividade de terras abertas respeitando as questões ambientais, com a observância do novo Código Florestal Brasileiro e a viabilização do Cadastro Ambiental Rural.

A respeito da irrigação, o pesquisador observou que ela pode ser um problema se empregada em excesso onde não há disponibilidade de água. "Mas existem regras, e se elas forem cumpridas, conseguimos utilizá-la. Para o Cerrado, a irrigação é interessante, uma vez que temos um longo período de seca. Para garantir a produtividade e a produção ao longo do ano nas áreas já abertas, isso também ajuda a evitar a abertura de novas áreas", apontou. Estudo mostra que a irrigação representa 8% da área plantada no Brasil, 20% da produção e 43% do valor da produção.

A necessidade de aumento da eficiência do uso da água foi outro ponto salientado pelo pesquisador. Ele mostrou dados de um estudo que indica a possibilidade de redução de até 50% do consumo em determinados meses do ano com o uso das técnicas corretas. Werneck apresentou um gráfico mostrando o excesso de água empregada em sistema de irrigação por gotejamento por produtores da bacia do Pipiripau, no DF. "Não adianta mudar o sistema de irrigação, tem que haver manejo, senão o próprio sistema por gotejamento pode ser pior que o pivô central", explicou.

Outro problema a ser atacado é o custo de erosão agrícola no Brasil, estimado em US$ 4,2 bilhões ou cerca de US$ 19 por hectare. "Temos diversas técnicas conservacionistas e elas têm dado base a programas no DF como o Produtor de Água e o Descoberto Coberto", disse, citando a construção de barraginhas, o sistema plantio direto, o controle de erosão em estradas e a ILPF.

A transformação de rejeitos em subprodutos, que até o momento conta com poucos programas, é mais um desafio para a agropecuária nacional. O pesquisador exemplificou que os dejetos da suinocultura podem ser usados na produção de bioenergia e biofertilizantes, gerando mais riqueza para o produtor e o País. "Precisamos ter planejamento", afirmou o pesquisador, ao apresentar mapas das bacias do Descoberto e do Pipiripau mostrando a capacidade de suporte em relação à terra, a aptidão agrícola e para outros usos e a susceptibilidade à erosão.

Também mostrou mapas de zoneamento de aptidão para cana-de-açúcar, dimensionando a disponibilidade hídrica versus a demanda por água, bem como mapas de erosão de diversos Estados em diferentes escalas, inclusive de bacia, cuja célula é de 30 metros. "Aí podemos fazer a gestão do território de forma adequada. Precisamos desse tipo de informação para não gerar conflitos, além de preservar o meio ambiente e obter o desenvolvimento", argumentou.

Políticas públicas - em seguida, o pesquisador apresentou dados para apoio a políticas públicas. Ele apresentou o mapa da classificação dos rios quanto à qualidade da água desejada no futuro, que faz o enquadramento dos recursos hídricos no DF. O documento foi aprovado pelo Conselho de Recursos Hídricos do Distrito Federal. Werneck apontou alguns rios marcados em vermelho (classe 4, a pior classificação) no mapa.

"Isso significa que estamos aceitando que eles sejam esgoto, porque não foi feito um planejamento de ocupação territorial adequado. Os rios do DF são pequenos, com baixíssima capacidade de suporte. Mesmo que a gente trate com a melhor tecnologia possível, esses rios continuarão sendo esgoto das pessoas que moram nessas bacias", afirmou. Outro mapa apresentado mostra a mancha urbana do DF sobreposta ao enquadramento dos recursos hídricos, evidenciando a correlação quanto à qualidade da água.

Quanto ao uso da terra no DF, segundo levantamento de 2015 do pesquisador, 47% da área ainda é preservada, 38% se destina à agricultura, 12% são áreas urbanas e os 3% restantes são áreas com solo exposto, de reflorestamento ou corpos d'água. "Mas em termos de qualidade da água, não dá para comparar o que acontece na área urbana com o que acontece na área rural", disse, apontando as diferenças da qualidade da água nos rios Sobradinho (área urbana) e Jardim (área rural).

Werneck lembrou que o DF recebe em média 60 mil novos moradores a cada ano. "Precisamos dar um jeito nisso, pois o DF não suporta. Não adianta querer transformá-lo em São Paulo, que tem muita água, mas tem muito mais gente do que poderia ter. Aqui, já estamos chegando a essa condição", declarou.

Para ilustrar o trabalho de monitoramento de bacias hidrográficas do DF, ele mostrou o exemplo da bacia do Rio Jardim. Em 2004, a vazão mínima na bacia era de 700 litros por segundo, em 2013 era de 350 litros por segundo, em 2014 registrou 170 litros por segundo, e atualmente está em torno de 300 litros por segundo. "Era para ser de 800 a 900 litros por segundo. Não sei o que vai acontecer quando chegar outubro. Provavelmente, não terá água", alertou, informando ainda que 40% dos pivôs centrais da bacia do Rio Preto, também no DF, terão os equipamentos desligados por falta de água na região.

Dados colhidos em 60 pontos no DF sobre chuvas, recarga e vazão auxiliam o pesquisador a explicar a situação. Segundo Werneck, o nível dos lençóis freáticos, responsáveis por 90% da vazão dos rios (os outros 10% vem da água que escoa na superfície), baixou cerca de dois metros na região centro-leste do DF. De um ano para outro, a vazão do Rio Jardim, por exemplo, foi à metade, somente em função da chuva, pois não houve mudança significativa no uso do solo nos últimos 30 anos. Também na bacia do Pipiripau, foi relacionada a diminuição da vazão do rio com a diminuição do volume de chuvas nas últimas décadas. Outro trabalho, realizado em parceria com pesquisadores alemães, mostram a mudança no padrão de chuvas do DF. "Estão havendo cada vez mais pancadas de chuva. Antes chovia todos os dias em dezembro e janeiro. Agora, quando chove, é pancada (em vez de invernadas de dois ou três dias)", observou.

Ao mostrar um gráfico sobre o cadastro de outorgas da Adasa, o pesquisador apontou que as linhas de demanda hídrica e de outorgas de uso de recursos hídricos se cruzaram em 2016. "Neste ano o Lago Descoberto só verteu em março, e isso também é um sinal. Cheio, ele aguenta um ano, mas se continuar desse jeito, no ano que vem ele verterá quando?", indagou. "Não é à toa que já estamos buscando água em Goiás, no reservatório de Corumbá IV, e está em licitação o projeto de captação no Lago Paranoá. Quem gostaria de ter um lago urbano como fonte de abastecimento de água? Nossas fontes começam a se esgotar. Temos que fazer um pacto nacional para resolver a questão no DF", completou.

Werneck destacou as contribuições da Embrapa, da Companhia de Saneamento do DF (Caesb), da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do DF (Adasa) e da Secretaria de Estado de Meio Ambiente para o Zoneamento Ecológico e Econômico (ZEE) do DF. "A Câmara Legislativa do DF tem importância fundamental na discussão desse zoneamento, e ele tem que basear o PDOT (Plano Diretor de Ordenamento Territorial), que vai dizer onde pode e onde não pode. E se pode, custa mais caro ou mais barato para instalar as pessoas", apontou.

O pesquisador apresentou ainda um mapa sobre a relação entre a vazão outorgável e a relação já outorgada no DF, mostrando a existência de áreas onde não deve mais haver outorgas. "É uma decisão difícil, mas que em algum momento tem que ser tomada, porque não há capacidade de suporte. Ou então definir como dividir o pouco (de água) que tem, lembrando que os regimes de chuva e de vazões estão mudando", alertou, apontando ainda a existência des rios que sofrem o lançamento de efluentes das estações de tratamento de esgoto e não têm capacidade de diluir o esgoto tratado.

Outros estudos - ele apresentou o mapa de vulnerabilidade à erosão do DF, com células de 30 metros, e um gráfico apontando as piores bacias em termos de erosão. "O DF não tem grandes problemas de erosão, mas há algumas pequenas bacias como do Rodeador, a do Descoberto e a do Pipiripau que têm problemas", apontou.

Werneck ainda citou estudos que buscam integrar uso do solo e recursos hídricos para mapear a situação das bacias hidrográficas no DF e entender os serviços ecossistêmicos. Ao final, ele elogiou o programa Produtor de Água, que envolve 18 instituições parceiras, entre elas a Embrapa. "É um grande modelo que deve ser seguido, tem funcionado no Distrito Federal", disse, lembrando que Brasília sediará o 8º Fórum Mundial da Água, que será realizado de 18 a 23 de março de 2018.

Também participaram do evento a ex-governadora do DF, Maria de Lourdes Abadia; o secretário-adjunto de Meio Ambiente do DF, Carcius Santos; o superintendente-executivo de políticas públicas e relações externas da WWF Brasil, Henrique Lian; a responsável pelo setor de sustentabilidade do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do DF (Senac-DF), Heloísa Helena Borges; o presidente da comissão de sustentabilidade da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal (OAB/DF), Rodrigo Figueiredo; e Francisco Carlos de Freitas, engenheiro da Infraero.

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