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Portuários capixabas fazem projeto de autovia marítima para expandir cabotagem no País

Autovia pode melhorar a cambaleante cadeia logística do País com serviços eficazes, regulares e frequentes


Evitar o aumento de pontos de estrangulamento nas rodovias e equilibrar a matriz nacional de transportes são missões que podem ser alcançadas a partir da implantação efetiva de uma autovia marítima na costa brasileira. A alternativa tem sido estudada intensamente pelo portuário e assessor técnico da Intersindical Portuária-ES, Luiz Fenrando Barbosa Santos. Em entrevista exclusiva ao PortoGente, ele garante que a autovia pode melhorar a cambaleante cadeia logística do País com serviços eficazes, regulares e frequentes. As primeiras ideias do projeto já foram passadas para o ministro dos Portos Pedro Brito, em sua recente visita a Vitória.

PortoGente – O que vem a ser a autovia marítima?

Luiz Fernando Barbosa Santos – O conceito de uma Autovia Marítima é uma visão expandida do transporte de cabotagem no Brasil, que permita evitar os pontos de estrangulamento existentes nas rodovias, no quadro de cadeias logísticas globais porta a porta, dentro de uma visão de melhoria do desempenho ambiental do transporte marítimo de curta distância, permitindo controlar o crescimento do tráfego de veículos pesados de mercadorias, reequilibrar a repartição modal e evitar os pontos de estrangulamento terrestre, além de concorrer para o desenvolvimento sustentável e para a segurança, reduzindo os níveis de acidente de trânsito nas rodovias. Ou seja, de uma forma geral, por cada tonelada transportada, o transporte marítimo é menos nocivo para o ambiente. A transferência modal para o transporte marítimo de cabotagem poderia contribuir, por exemplo, para satisfazer os objetivos do Protocolo de Quioto.

PortoGente – De onde surgiu a ideia de criar o projeto?

Luiz Fernando Barbosa Santos – A ideia surge dos debates ocorridos durante um seminário, promovido pela Câmara Municipal de Vitória, onde foram apresentados pelo Dr. Marcelo Perrupato os dados do Plano Nacional de Logística e Transportes (PNLT), estudo produzido pelo Centro de Excelência em Engenharia de Transportes (CENTRAN), onde nos mostrou os altos níveis de carregamento das nossas rodovias no sentido norte-sul e o baixíssimo carregamento no modal marítimo de cabotagem demonstrando, ainda, as tendências de crescimento deste tráfego, em muitos trechos já em níveis de saturação. A grande questão levantada é qual o custo da construção da ampliação dessa malha viária. Quais são os impactos ambientais dessa ampliação? Qual o custo social dos atuais e futuros acidentes rodoviários, caso a malha viária não seja expandida? Antes de se ampliar a malha viária, existem alternativas para a minoração dos níveis de tráfego? De todas as questões apresentadas, começamos a levantar se existiam ações em outros países que estivessem enfrentando, concretamente, o tema. Vimos que a Comunidade Europeia está conduzindo o Projeto Marco Polo, que tem as iniciativas de adotar a nível comunitário, nacional, regional e do setor marítimo, especificamente, para desenvolver o transporte marítimo de curta distância no domínio legislativo, técnico e operacional, que podem ser obtidas no sítio http://ec.europa.eu/marcopolo.

PortoGente – O que é Projeto Marco Polo?

Luiz Fernando Barbosa Santos – O projeto Marco Polo é um projeto desenvolvido pela Comunidade Europeia através do Regulamento n.° 1692/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de Outubro de 2006, que institui o segundo programa Marco Polo relativo à concessão de apoio financeiro comunitário para melhorar o desempenho ambiental do sistema de transporte de mercadorias (Marco Polo II) e tem por objetivo propor serviços eficazes, regulares e frequentes, que possam competir com os serviços oferecidos pelo transporte rodoviário, nomeadamente em termos de tempo de viagem e de preço.
PortoGente – O que o projeto, que está sendo gestado pelos trabalhadores, representa para o Brasil em termos de movimentação de mercadorias?

Luiz Fernando Barbosa Santos – Principalmente agora, que a crise global fez os países se voltarem para o potencial do seu mercado interno, haverá um maior tráfego de bens e mercadorias e, consequentemente, um aumento nos níveis de carregamento de tráfego nas rodovias, em função da predominância deste modal na matriz de transporte brasileira que em 2005, segundo os dados da Agência nacional de Transporte Terrestre (ANTT), eram de 58% do rodoviário, 25% do ferroviário e, somente, 13% do aquaviário.

PortoGente – O que esse incremento à cabotagem poderá gerar?

Luiz Fernando Barbosa Santos – Diminuição dos custos de transporte no Brasil e, consequentemente, uma maior competitividade da indústria nacional frente à invasão de produtos importados, que buscarão o mercado brasileiro como estratégia de sobrevivência frente à diminuição da demanda nos Estados Unidos da América (EUA), Europa e Japão. Pode se converter em uma ação anticíclica da crise global.

PortoGente – O que representa (econômica e politicamente), para o País, a troca do transporte rodoviário pelo marítimo?

Luiz Fernando Barbosa Santos – Representa de início um questionamento sobre a quantidade de recursos que serão poupados na construção e/ou duplicação de rodovias existentes para suportar o aumento dos níveis de serviço e, complementarmente, na dimensão política, o ganho social da diminuição dos acidentes de trânsito, envolvendo o transporte de carga e o de passageiros. Finalmente, na dimensão ambiental, a preservação de biomas ao longo dos eixos rodoviários existentes e/ou a se construir.

PortoGente – Qual o modelo ideal de integração modal no que se refere à movimentação de mercadorias em território nacional?

Luiz Fernando Barbosa Santos – Fica difícil se falar em modelos, mas um maior equilíbrio da matriz de transportes é o desejável. Talvez o indicativo do PNLT, já citado, possa ser um referencial uma meta a ser atingida no longo prazo, ou seja, 33% rodoviário, 32% ferroviário e 29% aquaviário.

PortoGente – Quais os incentivos tributários e fiscais para o incremento da autovia marítima?

Luiz Fernando Barbosa Santos – Não seria uma política, somente, de incentivos financeiros, mas de ações legislativas, técnicas e operacionais mais abrangentes a serem implementadas. No campo das ações legislativas, seria interessante quanto às formalidades de declaração exigidas dos navios de cabotagem à chegada e/ou à partida de portos, quanto às exigencias de controle aduaneiro, controle fito-sanitário, dentre outros de controle estatal que deveriam ser mais simplificados. É lógico que uma política de incentivo tributário e/ou fiscal para as cargas que fossem transportadas por via marítima seria importante por um tempo determinado, tendo em vista que esses incentivos não poderiam ser eternos, o que poderia incentivar o desperdício.

PortoGente – Qual o diferencial desses incentivos entre a cabotagem e o comércio exterior?

Luiz Fernando Barbosa Santos – Os incentivos não podem ser excludentes. São louváveis os incentivos existentes ao comércio exterior, mas não devemos nos esquecer da busca de se utilizar, de forma otimizada, a infraestrutura portuária. Existem portos de pequeno porte que poderiam constituir uma rede de portos organizados, com uma política concertada no tráfego de cabotagem. Creio que uma política nacional de articulação dos Conselhos de Autoridade Portuária (CAPs), fazendo-os atuar, mais ativamente, na consolidação de ações voltadas à atração de cargas, seria muito importante.

PortoGente – Especialistas apontam que sul e sudeste, em breve, serão regiões voltadas para a cabotagem e que o comércio exterior irá se estabilizar nas regiões norte e nordeste. Você concorda com essa previsão?

Luiz Fernando Barbosa Santos – Depende sobre qual corrente de comércio exterior estaremos debatendo. Se for as commodities agrícolas ou mínero-metálicas, vejo a assertiva com um alto grau de procedência, em virtude dos investimentos do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) nas hidrovias, portos e ferrovias interligando a nova fronteira agrícola brasileira e apontando para a saída norte. Se nós compreendermos as repercussões da ampliação do canal do Panamá, veremos que haverão ganhos de escala com o aumento do porte dos navios que se utilizarão dos benefícios da ampliação aproximando, mais ainda pelo viés econômico, a região norte e nordeste dos mercados asiáticos, que terá um novo dinamismo no pós crise global. Quanto ao Sul e Sudeste, as exportações terão preponderância das cargas conteinerizadas, em virtude da região ter uma alta concentração do parque industrial brasileiro.

PortoGente – Você vê a necessidade de o Brasil contar com portos específicos para a cabotagem?

Luiz Fernando Barbosa Santos – Sim, principalmente os de pequena profundidade ou com dificuldade de acesso aquaviário, que seriam antieconômicos aprofundá-los e/ou adequá-los para as modernas embarcações, que demandam maiores profundidades. Seria importante, não somente a designação de portos específicos, mas também, nos portos maiores, instalações dedicadas ao transporte de cabotagem, com normas de atracação e operação diferenciadas das de longo curso, de se constituir no âmbito das Autoridades Portuárias balcões administrativos únicos, com o objetivo de simplificar as formalidades relativas à chegada, partida e desembaraço dos navios, ou seja, limitar o número de autoridades administrativas que sobem a bordo dos navios para efetuar controles ou, pelo menos, coordenar as suas atividades, tornando-se uma atividade mais concreta do que o programa de harmonização de atividades que necessita de aprimoramento.

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