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Rio Grande do Sul será o maior pólo leiteiro do País

A preocupação das lideranças da cadeia é com a pressa com que isso tem de ser feito para evitar que disputas internas


O segmento lácteo gaúcho está convicto de que a Região Sul, em especial o Rio Grande do Sul, por sua condição climática e capacidade de produção, será o maior pólo leiteiro do Brasil em poucos anos. Convencidas de que bacias como as de Minas Gerais, Goiás e São Paulo começam a definhar, algumas das principais indústrias do Centro do País migram para o Sul em busca de novas oportunidades, o que impõe um enorme desafio ao Estado: aumentar em muito a oferta para atender à demanda futura. A preocupação das lideranças da cadeia é com a pressa com que isso tem de ser feito para evitar que disputas internas por matéria-prima desarranjem a cadeia do leite. Preocupa, sobretudo, a passividade do governo que, até então, não formatou um programa sustentável de fomento à produção. Os entraves ao crescimento e o bom momento por que passa o setor foram debatidos pelo secretário-executivo do Sindilat, Darlan Palharini, pelo presidente da Associação Gaúcha de Laticinistas, Ernesto Krug, pelo presidente da Associação de Criadores de Gado Holandês (Gadolando), José Ernesto Ferreira e pelo diretor da Fetag, Nestor Bonfanti.

Jornal do Comércio - O Rio Grande do Sul está recebendo uma série de investimentos industrias na área de lácteos. No entanto, passamos por um momento de pouca oferta de leite. Se esses investimentos todos se realizarem, teremos oferta para a indústria?

Darlan Palharini - O que nós temos hoje é um recebimento nas indústrias lácteas gaúchas de 6,2 milhões de litros por dia. Essa é a média de 2006. Em 2007, acreditamos que essa média possa ter um aumento. Até o final de 2008, só para as plantas que já são associadas ao Sindilat, estimamos uma demanda de mais 2,125 milhões de litros por dia.

Para atender aos novos investimentos (Nestlé, Italac, CCGL e outras), nós teríamos que quase dobrar a nossa capacidade, ou, pelo menos, chegar próximo aos 10 milhões de litros por dia.

JC - Como chegar a esse número?

Ernesto Krug - Considerando as empresas que não estão dentro da Sindilat, eu diria que vamos precisar realmente de 12 milhões de litros de leite por dia. Ou seja, o dobro da capacidade hoje instalada. O desafio agora é saber onde buscar, como buscar e em quanto tempo conseguir isso nas atuais condições.

JC - Qual é a produtividade média do Estado?

Krug - Há produtores que têm médias muito boas, comparáveis ou até superiores a países desenvolvidos. Mas, quando se fala em vacas ordenhadas e produtividade, compara-se o total de vacas ordenhadas de um país ou de um estado. Nós giramos em torno de 6 milhões de vacas ordenhadas e temos o dobro da produtividade do País.

José Ernesto Ferreira - Eu acho que tem uma certa confusão de números também. Alguns censos não mostram a realidade. Nos rebanhos da Associação de Gado Holandês, que são rebanhos de vacas leiteiras mesmo, a média gira em torno de 25 litros por dia para cada animal. Há tambos que produzem em média 40 litros e há outros, com 18, 15, 12, dependendo do regime de pasto e confinamento. Depende, enfim, da maneira como o rebanho é manejado.

JC - Insistindo numa pergunta já feita: como vamos conseguir atender à demanda futura?

Krug - É difícil de chegar nisso, por várias razões. Como nós já temos uma produtividade alta, o nosso crescimento em produtividade não será tão rápido. Há duas formas de crescer: horizontalmente e verticalmente. Mas a verticalização é muito demorada. Ela não é rápida, porque os bons já estão em um nível superior.

JC - Então nós temos menos condições de crescer do que estados que estão com um nível mais baixo?

Krug - Tem outra coisa importante, que são os produtores médios e familiares. Eles têm um potencial de crescimento enorme. Segundo os meus cálculos, a produção do Estado pode duplicar, quadruplicar e até sextuplicar. Mas é preciso mexer em algumas variáveis. No momento que essas empresas chegarem aqui, vai surgir uma concorrência que não vai ser fácil. Isso vai ser ruim para a qualidade, que certamente vai piorar.

JC - Por quê?

Krug - Porque a empresa vai tolerando no recebimento. Mas eu acredito que não temos condições de chegar a essa produção em 2008 de forma alguma.

Ferreira - Nós não vamos conseguir duplicar até 2008. Eu acho que o Estado como setor público tem que entender que o Rio Grande do Sul está se desenvolvendo como um pólo produtor de leite e tem que criar uma política pública para auxiliar esse setor. O primeiro objetivo deve ser um crescimento organizado, porque esse é um dos problemas que nós temos nesse momento. Hoje nós temos uma euforia muito grande, com todos dizendo que temos que duplicar a produção de leite. Isso faz com que aventureiros entrem no setor, porque hoje existe um preço compensatório em relação ao dólar. Se nós não nos organizarmos, esse aventureiro pode estragar o nosso setor. Ele entra, acha que é uma maravilha e acaba se frustrando, podendo abandonar a atividade, deixando as indústrias e toda a cadeia completamente desorganizadas. Por isso, nós temos que ter muito cuidado com sanidade, para que o rebanho cresça de maneira horizontal. Também temos que trabalhar com a questão da verticalidade, ou seja, melhorar a produtividade, melhorar os alimentos para as vacas e melhorar a genética do rebanho.

Krug - E gestão da propriedade, que é fundamental.

Ferreira - Para isso, tem que existir crédito aliado à assistência técnica. Não basta, em um momento como esse, fornecer apenas crédito ao setor leiteiro. O crédito deve estar atrelado à assistência técnica.

Nestor Bonfanti - Eu vejo a questão assim: o aumento vai se dar se o comércio de grãos não avançar muito. Quem tem áreas maiores dificilmente vai para o leite, até porque operar com grãos é menos trabalhoso. E a agricultura familiar, que seria o foco principal, na maioria das vezes não tem nem área suficiente para aumentar a produção. A partir do momento que tem de aumentar a quantidade de vacas, precisa-se de mais pastagem. E a área que eles têm não é adequada para isso. Então, no meu entender, o produtor médio - aquele que tem até 40 hectares - vai se adaptar à produção leiteira. Mas aqueles que têm áreas maiores dificilmente vão optar pelo leite.

JC - Há outras alternativas além do grão. Estamos fomentando a produção de cana-de-açúcar, de girassol, de grãos que geram diesel. Isso significa que vamos ter uma concorrência predatória?

Ferreira - Nós temos, por exemplo, o setor de fumo, que é uma propriedade que sempre foi concorrente direta do leite em tamanho e mão-de-obra. Esse setor, com certeza, já está tirando o pé do acelerador.

Krug - Eu diria não só o fumo, mas o Rio Grande do Sul vai ter que pensar em trabalhar uma reconversão. Se analisarmos, por exemplo, na cultura extensiva - soja, trigo e milho para exportação -, percebemos que não tem viabilidade econômica para a pequena propriedade. Então, o Sul do Brasil tem que pensar em uma reconversão como um todo. Automaticamente isso vai acontecer. Eu estou há mais de 30 anos dizendo que o futuro do leite no Brasil não está em Goiás, Minas Gerais ou São Paulo. É a Região Sul, por suas condições climáticas, que tem condições de produzir e liderar a produção de leite.

JC - Mas, segundo as estatísticas, o Rio Grande do Sul perde até para o Paraná.

Krug - Nós somos hoje o terceiro produtor em termos de leite no Brasil.

Palharini - Mas, entre o segundo e o quinto colocado, a diferença é muito pequena.

Ferreira - Essas empresas grandes que estão chegando não virão para se aventurar. Com certeza, elas enxergaram o que o Krug (Ernesto Krug) falou, e eu também falo isso: o clima para a produção de leite não é o tropical do Centro do País, é o subtropical. O pólo produtor de leite em nível mundial vai ser a parte de baixo do Mercosul - do Paraná para baixo, no Brasil, parte da Argentina e parte do Uruguai. Esse é o clima apropriado para a produção de leite. E indústrias visualizaram isso. Essa ascensão do Rio Grande do Sul mostra que nós vamos liderar a produção brasileira de leite no curto prazo. Nós temos condições para isso. Nós temos cultura de produção intensiva, que foi proporcionada pela colonização européia. Nós sabemos guardar alimento para as vacas melhor do que no Centro do País. Com a nossa cultura de produção intensiva, o leite gaúcho é o que tem mais qualidade no Brasil. A maior produtividade de leite do País por média de produção de cada vaca por dia é a do Rio Grande do Sul. A concorrência com o grão é uma verdade. Quando a soja dá um boom, alguns produtores matam as vacas de leite para plantar soja. Só que esse tipo de atitude já ressabiou muitos produtores. Quando a soja deu uma disparada, abateu-se muita vaca de leite no Estado. Hoje todos os produtores que fizeram isso estão arrependidos.

JC - O movimento dos aventureiros referido aqui sempre acontece?

Ferreira - Sempre acontece. Por isso, o setor deve se organizar. Nós vamos ter uma indústria forte. No momento em que se estabelecerem todas as indústrias, nós vamos ter uma concorrência que pode deixar algumas de fora. Isso é uma coisa que pode acontecer. E eu, como produtor, tenho uma preocupação com o sistema cooperativo. A cooperativa é importante no setor leiteiro porque é um balizador. Teoricamente, ela é dos produtores e é gerenciada pelos produtores. Então, ela tem a visão de que a indústria tem que ter lucro e retorno financeiro, mas ao mesmo tempo tem a visão de que o produtor, que é o dono da cooperativa, também tem que ter lucro e resultado financeiro.

JC - Nós corremos o risco de ter a desistência de algum desses grandes projetos industriais anunciados para o Estado?

Ferreira - Eu tenho medo que, com essa disputa, alguém saia perdendo.

Krug - Vai ser um jogo de grande competência. Mas há outro ponto que deve ser avaliado. Por que todas essas indústrias estão vindo se instalar aqui? Por que a indústria do Estado está ampliando a sua capacidade? Há três anos, o Brasil vivia um problema de falta de capacidade industrial. Em três anos, em função da expectativa que se tinha de grandes exportações, as indústrias ampliaram e se prepararam. Hoje o Brasil precisa produzir mais leite, porque a indústria realizou pesados investimentos e têm que buscar esse leite. A indústria tem que tratar bem o produtor; e o produtor tem que ser parceiro da indústria. Há o problema da manipulação de preços, compra de matéria-prima e há o problema das indústrias que vêm se instalar aqui como represália por ter tido o mercado do leite invadido. Essas são as jogadas estratégicas.

Ferreira - Se eu pudesse dar um recado para essas indústrias que estão chegando e também para aquelas que já estão instaladas, eu diria que o melhor investimento que uma empresa dessas poderia fazer nesse momento, porque daria retorno em muito pouco tempo, seria na área técnica. Se uma empresa seguisse o meu conselho e montasse um bom grupo de assistência técnica ao produtor, ganharia com tudo. Primeiro, na verticalização, pois aumentaria a produtividade. Segundo, aumentaria o número de interessados em entrar para o setor de leite. Terceiro, fidelizaria o produtor à indústria.

JC - Não existe mais a fidelização na entrega do leite?

Krug - Não como existia aqui no Rio Grande do Sul, que sempre foi um orgulho, e essa era uma das razões por que se tinha uma qualidade maior. Isso desapareceu. Dentro desse novo quadro, as empresas vão ter que trabalhar com o produtor, com o crédito rural atrelado à assistência técnica, programas de profissionalização que envolvam gestão, registros contábeis e controle de custos. Essas indústrias vieram para cá da mesma maneira que algumas das indústrias daqui estão indo para outros estados. É uma pena que não tenham feito isso antes. Sempre lutei por isso, porque uma indústria fica muito vulnerável estando só no Rio Grande do Sul. Sempre defendi isso, mas agora aconteceu o inverso. De qualquer forma, temos que lutar. As empresas que já estão aqui já conhecem a realidade e, com a experiência que têm, podem ganhar espaço. Mas, na lentidão com que muitos andam, nós não conseguiremos chegar e ganhar. Nós estamos hoje em um momento ímpar. Estamos com fatores conjunturais favoráveis e estamos com fatores estruturais pela primeira vez acontecendo no mundo do leite. Mas por que essa euforia no mundo leite? Primeiro porque não existem estoques. Segundo por causa da queda dos subsídios da União Européia, que é um fator estrutural tremendamente importante que nunca houve, apesar de nós termos sempre falado. A metade dos subsídios agrícolas do mundo é para o leite. Desses, 90% é da União Européia que, por sua vez, participa no mercado internacional com 35%. Então, caíram os subsídios, automaticamente o produtor recuou, porque passou a não ter a mesma competitividade, tendo custos maiores para produzir. A prova de que isso é verdade é que, esse ano, não vamos ter crescimento da produção da União Européia. Temos um outro fato importante, que é o crescimento das economias em desenvolvimento. Isso faz com que haja um crescimento de consumo. Está havendo um aumento de aproximadamente 3% no consumo. Já a produção, na melhor das hipóteses, vai crescer 2%. No ano passado, cresceu em torno de 1%. Não há estoques, caíram os subsídios, a Argentina está com produção 12% inferior, o Uruguai com 14% menos. Na Argentina, inclusive, houve empresas com filiais lá e filiais no Brasil que subestabeleceram as suas cotas de exportação para o Brasil, o que provocou o início da corrida dos preços.

JC - Esse é mais um fator que poderia explicar o preço elevado do leite para o consumidor?

Krug - Preço justo, eu diria. O que acontece é que todos os planos econômicos do Brasil foram pagos pelo leite e pelo frango. Essa é a primeira vez que o leite obteve um preço razoável e justo. Os preços não vão ser nem os que foram no passado nem o que está sendo hoje. Vai haver um novo patamar.

JC - O preço do leite praticamente duplicou em menos de um ano. O que levou o produto a esse preço?

Palharini - Se pegarmos a inflação acumulada do Plano Real, percebe-se que o preço do leite foi atualizado agora. Até então, o preço sempre estava abaixo dos índices de inflação. Agora talvez esteja um pouco acima. Quando se coloca uma questão mundial de consumo, temos que lembrar que, do início do governo Lula para cá, nós temos um incremento do salário mínimo. Isso significa dinheiro no bolso. Então, há um aumento de consumo. Nós temos um avanço no Brasil inteiro de diminuição de produção de bacias importantes, que são Minas Gerais e Goiás. Nesses estados, a cana-de-açúcar é muito forte. São Paulo, por exemplo, também teve um recuo de produção, apesar do aumento da população.

No Brasil, há no máximo cinco estados superavitários em leite. O resto importa, não tem produção suficiente. A indústria gaúcha se projetou para que mais que 60% de seu produto lácteo seja para fora do Estado. Então, eu diria que o impacto internacional da falta de leite ainda não atingiu o Brasil. As nossas exportações ainda são muito irrelevantes. Hoje a questão de exportar o leite em pó, que saiu de um patamar US$ 2,3 mil a tonelada para US$ 5,5 mil dólares, mesmo com o dólar defasado chama a atenção.

JC - As indústrias têm dado preferência para a exportação? Qual é o percentual de exportação hoje?

Krug - Apenas 1,5% da produção brasileira é exportada. Temos que chegar a 10%.

JC - Como está o preço para o produtor?

Bonfanti - Para o produtor, já melhorou. Mas tem que melhorar mais. Hoje está em torno de R$ 0,64 o litro.

Krug - Se analisarmos os dados, verificamos que os preços, a partir de maio, superaram anos anteriores. Até ali, foi apenas recuperação. Agora é que o preço vai se manter em um nível satisfatório em agosto e setembro. Há ainda um outro aspecto relativo ao comportamento da produção. Acredito que o consumidor tenha chegado ao seu limite, porque ele está comprando menos. Isso não é só no Brasil. Amigos meus da Europa dizem a mesma coisa.

Bonfanti - E tem outra questão também. Hoje faltam matrizes no Estado para aumentar a produção.

Krug - Nessa semana pessoas de Brasília, Goiás e Minas Gerais me ligaram pedindo animais. Não há animais.

Ferreira - Eu gostaria de falar sobre cruzamento, uma coisa importante para nós aqui do Sul do Brasil. Nós trabalhamos com raças puras de produção de leite. Lá no centro do País, eles estão com um modismo, que é o cruzamento do Gir com Holandês. Isso encurta o período de lactação e diminui a produtividade. Pode dar um ganho em rusticidade para eles que têm um clima quente. Mas para nós não serve. Aqui a nossa vaca tem mais produtividade e uma lactação de dez meses.

Krug - Eu fui conselheiro e sou ainda da Embrapa. Há anos atrás, eles não queriam saber de raça pura, a tal ponto que nas segundas-feiras eu recebia muitos telefonemas do Rio Grande do Sul de pessoas querendo Gir. Hoje há uma outra consciência, mas isso deu muito trabalho. Por outro lado, a Embrapa passou a trabalhar com gado puro.

Ferreira - Agora, com a melhora do preço do leite em relação ao dólar, no centro do País estão voltando a criar Holandês e Jersey.

JC - Como está o ensino rural técnico no Estado?

Ferreira - Nós temos também um déficit muito grande em relação à mão-de-obra técnica. Eu tive a oportunidade de promover um encontro da Associação Gaúcha dos Professores Técnicos Agrícolas. O Rio Grande do Sul já foi modelo em escolas técnicas agrícolas, que formam aquele profissional de nível secundário. Não é o profissional de nível superior, mas também é uma mão-de-obra muito qualificada que serve para a ampliação do setor do agronegócio. Mas as nossas escolas técnicas hoje são museus em atividade. Hoje os alunos aprendem o que não deve ser feito, porque não têm mais estrutura. As escolas fazem festas, jantares beneficentes para poder manter os alunos. Isso seria hoje um fator no qual o Estado poderia contribuir, porque estaria auxiliando a educação, estaria auxiliando na formação técnica de nível secundário, de mão-de-obra para trabalhar nesse setor. Esse é um setor que está sucateado. O que eles tinham foi reduzido com o passar dos anos e dos governos. Foi sucateada a mão-de-obra no ensino secundário técnico-agrícola do Estado, que poderia auxiliar muito no desenvolvimento desse setor.

Bonfanti - As escolas técnicas para a formação do agricultor não existem mais. Além disso, ainda passam aqueles ônibus, no Interior, que levam todos os alunos para estudar nas cidades. No momento em que o jovem se forma, ele não fica na propriedade. Nós temos poucos exemplos de jovens que se formaram e voltaram. A maioria se forma para fazer concurso público.

JC - Qual é a média de cabeças leiteiras na agricultura familiar?

Bonfanti - Na verdade, na agricultura familiar, hoje, há muitos animais nas propriedades. Mas a produção é muito baixa. Falta um gerenciamento.

Krug - Eu fiz um levantamento em 15.535 propriedades de leite. A área média era de 28,8 hectares, havia 17 animais em média nas propriedades e 11 vacas em lactação e secas. O problema normalmente é um longo período entre um parto e outro.

JC - Se a agricultura familiar é uma das saídas para aumentar a produção, como isso será feito se falta todo esse gerenciamento?

Bonfanti - Não é só o gerenciamento. Falta mão-de-obra, falta infra-estrutura na questão da energia elétrica, falta assistência técnica. E hoje temos problemas em algumas regiões dos próprios freteiros. O produtor acaba vendendo o leite sem saber para qual indústria está indo.

Krug - Quando nós criamos a CCGL, a maior briga que eu arranjei foi com o comprador de leite, porque eles eram picaretas, compravam o leite do produtor, procuravam tirar do produtor o máximo, fraudavam o leite, eram os maiores químicos do Rio Grande do Sul. Essa figura está voltando com muita força por causa da falta de leite.

JC - O que se pode esperar das indústrias que estão chegando em termos de fomento?

Palharini - Na verdade, estamos comentando aqui esse momento favorável ao Rio Grande do Sul, que deve ser aproveitado. A questão da sanidade é importante, a parte de fomento é importante. Temos trabalhado com o governo do Estado. A Fetag e a Farsul têm sido nossas parceiras, tentando mostrar a preocupação não com a vinda de novas indústrias, mas sim como fato de que nenhuma delas deixou claro o plano de fomento. Sugerimos que o governo do Estado peça a essas novas indústrias que forneçam o seu plano de fomento. Quando se fala nessas indústrias que estão se instalando perto de Passo Fundo, estamos falando de uma demanda de aproximadamente 2 milhões de litros em um raio de, no máximo, 100 quilômetros. O primeiro prejudicado nesse processo, se não existir uma área de fomento, será a pequena indústria. Não estou dizendo que um plano de fomento tenha que ser mostrado ao Sindilat, e sim ao governo do Estado. Isso evitaria o desequilíbrio que talvez vá ocorrer nos primeiros anos. Depois, evidentemente, vai equilibrar.

JC - Mas é possível que uma multinacional como a Nestlé, por exemplo, se instale em uma região sem um plano de fomento?

Palharini - Até agora, nada veio à tona.

Bonfanti - Ela não vai inventar produtor de leite aqui no Estado? Vai tirar daqueles que estão produzindo?

Palharini - Acho que nesse ponto entra um fator importante do próprio governo, que deve criar uma política para regular essas entradas para que não haja um desequilíbrio. O que pode ocorrer, se essa área de fomento não estiver clara, é uma euforia na parte de produção. O que se desenha em nível mundial é que esse mercado deve ficar aquecido por um período razoável. É claro que passa pela sanidade, pela busca de novos mercados, pela melhoria da qualidade. É um caminho longo. A exportação de lácteos não acontece com um estalar de dedos. A dificuldade de entrar no mercado da China e da Índia, por exemplo, comprova que a qualidade é muito importante. Então, a grande preocupação do sindicato das indústrias é a de que o fomento não está claro.

JC - Essa preocupação tem sido levada para o governo?

Palharini - Nós estivemos em uma audiência com o governo do Estado mostrando essa situação. No mês passado, tivemos uma audiência com a Secretaria da Fazenda em que a Farsul e a Fetag foram ouvidas em relação a esse problema. Falamos na questão do fomento porque acho que nem o governo se deu conta disso. Nós mostramos essa preocupação para a Fiergs também. É muito preocupante. Estamos trazendo uma indústria de transformação e não se pensou de onde vai sair esse produto.

JC - Então de onde vai sair essa demanda?

Krug - Depende de muito crescimento. No ano passado, tivemos um crescimento aqui no Estado em torno de 17%. Esse ano, estamos com 15% até agora.

JC - Qual vai ser o percentual até o final de 2007?

Krug - Eu acredito em um crescimento de aproximadamente 10%.

JC - Há empresas fazendo o caminho inverso. Estão mantendo a sua base aqui, mas começando a atuar fora do Rio Grande do Sul também. Seria para fugir um pouco dessa concorrência?

Krug - É uma válvula de escape.

Palharini - Vamos estabelecer uma diferença: quando uma empresa daqui vai para outro estado, ela assume uma planta que já está produzindo. Aqui no Rio Grande do Sul, nós estamos incrementando novas indústrias. O governo tem condições de reunir em uma mesa-redonda os setores que estão envolvidos juntamente com as indústrias para pensar no que vai acontecer.

Krug - Nós tivemos várias audiências com o governo do Estado e pedimos que fosse ouvido o setor. De certa forma, foi ouvido, mas não foi atendido. Sempre quisemos fazer debates com o governo anterior e com o atual. O Ministério do Desenvolvimento Agrário está se mexendo bastante na área da agricultura familiar, é verdade. É a primeira vez que está havendo preocupação com o leite, tanto no aspecto de crédito e de assistência como de organização.

Feira é vitrine para produtos gastronômicos diferenciados

Ana Esteves

A Expointer pode ser considerada como a feira da diversificação gastronômica. A mostra funciona como uma vitrine para a apresentação de novos produtos, que muitas vezes não costumam ser encontrados nas prateleiras dos supermercados convencionais. Um dos destaques neste ano fica por conta dos embutidos de carne de avestruz, como o presunto, o patê e o pastrami, produzidos pelos criadores da Cooperativa dos Criadores de Avestruz do Rio Grande do Sul (Cpars).

Outra iguaria, que também pode ser conhecida no estande da Associação dos Criadores de Avestruzes do Estado (Acars), na Expointer, são os cortes de carne, oriundos desta ave. "Trata-se de um alimento muito rico em ferro, ômega 3 e com baixíssimos índices de colesterol, cujo quilo do filé custa em média R$ 16,00", informa João Carlos Machado, diretor vice-presidente da Acars.

Segundo ele, o fornecimento da carne, que pode ser preparada na grelhada ou no espeto, como churrasco, ainda se restringe a restaurantes e hotéis,. "Apesar de tratar-se de uma ave, a carne é vermelha, com aspecto muito semelhante a de bovino." Na feira da agricultura familiar, um dos destaques é o spray de cachaça, uma garrafinha da bebida equipada com uma bombinha que esparge o produto na boca. "Há quem diga que é bom pra dor de garganta, outros aconselham para gripe. Na verdade é apenas um jeito novo de beber cachaça", explica o proprietário do alambique Fonte Imperial, Antônio Carlos Brito. A idéia, segundo ele, já é bem difundida em São Paulo.

Para quem prefere seguir uma linha de alimentação mais natural, a opção é conhecer as variedades de feijão cultivadas pelo agricultor Alceu Prime, do Grupo Ecológico Santo Antônio. Há cinco anos, ele trabalha com as variedades japonesas Moyashi, que se assemelha a um grão de soja escuro e que pode ser preparado ensopado ou transformado em broto e o feijão selvagem Azuki. "Pode ser usado para sopa. Exportamos esta variedade, para Rio de Janeiro e São Paulo", disse. Prime também trabalha com a batata yacon ou batata diet, oriunda dos Andes, que contém em sua composição mais de 85% de água e oligofrutose, um tipo de açúcar que não pode ser absorvido pelo corpo, o que lhe confere baixas calorias e conserva baixos os níveis de glicose do sangue. "Quem tem diabetes compra muito esse tipo de tubérculo, e muitos ficam tempo sem precisar fazer insulina. O alimento se parece com mandioca e deve ser consumido cru", explica.

A mandioquinha salsa também se destaca entre os produtos exóticos cultivados pelo agricultor que participa da feira. Originária da região andina do Peru, é muito recomendada, segundo Prime, para uso na alimentação infantil.

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