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CNJ aperta o cerco contra TJBA por descumprir decisão

Decisão anulou transferência de 366 mil hectares a borracheiro no Oeste da Bahia


 
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou ontem, por unanimidade, a intimação do presidente do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), Gesivaldo Britto, para cobrar o cumprimento da decisão que anulou a transferência de 366 mil hectares de terra no Oeste do Estado a um único homem, o borracheiro José Valter Dias, em prejuízo de 300 agricultores. As terras, que chegam ao tamanho de cinco vezes a cidade de Salvador, foram entregues ao borracheiro pela Portaria 105, editada em 2015 pelo TJBA. 
 
O presidente da corte baiana terá 24 horas para informar o CNJ sobre os procedimentos para anular a Portaria 105, com o restabelecimento dos registros das terras dos agricultores e o cancelamento da matrícula de José Valter Dias.
 
O CNJ também determinou a remessa do caso à Polícia Federal para apurar vultosas transações em moeda estrangeira efetuadas pela holding JJF, constituída pelo borracheiro e outros dois sócios para administrar as terras. A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu o compartilhamento de informações do caso para fins penais.
 
O CNJ também determinou a intimação dos responsáveis pelos cartórios dos municípios de Formosa do Rio Preto e Santa Rita de Cássia para que cumpram a decisão em 24 horas, anulando a matrícula de José Valter Dias e restabelecendo as matrículas dos agricultores, sob pena de desobediência de ordem do conselho.
 
A decisão determina ainda a intimação da corregedoria do TJBA para que instaure procedimento disciplinar contra os donos dos cartórios, para apurar eventual intenção deliberada de descumprir a determinação.
 
ENTENDA O CASO
 
Em 2015 o TJBA editou a Portaria 105, que transferiu a propriedade de 366 mil hectares de terra ao borracheiro José Valter Dias. O ato administrativo anulou, ao mesmo tempo, os registros de terras de cerca de 300 agricultores que estavam no local. A desembargadora que assinou a portaria se aposentou poucos dias depois.
 
As terras ficam no município de Formosa do Rio Preto, no Oeste da Bahia, divisa com o Tocantins. Produtores rurais ocuparam o local na década de 1980 e construíram uma das áreas agrícolas mais prósperas do país, onde se planta sobretudo soja.
 
Ao perderem a propriedade das terras, em decorrência da portaria da corte baiana, os agricultores acabaram forçados a fazer acordos pelos quais têm que pagar parte de sua produção de soja à holding JJF, criada em nome do borracheiro e mais dois sócios, para que possam permanecer no local.
 
Em março de 2019, o CNJ anulou a Portaria 105 do TJBA, entendendo que ela causou “efeitos nefastos” na região. O conselho apontou que o ato administrativo transferiu a propriedade de 366 mil hectares de terra sem que os agricultores fossem sequer ouvidos. Porém, passados seis meses do julgamento do CNJ, o TJBA ainda não cumpriu a ordem de anular a portaria. 
 
“Entendo que a deliberação do plenário do CNJ está sendo manifestamente descumprida”, afirmou a conselheira Maria Tereza Uille Gomes, relatora do caso, ao apresentar na quarta-feira, 11, uma questão de ordem ao plenário do conselho. “Pedi informações à corregedoria da Bahia, que trouxe informações aqui de que até presente o momento não houve determinação da presidência do TJBA no sentido de determinar o restabelecimento das matrículas dos imóveis 726 e 727 [dos agricultores] em razão da anulação da portaria 105/2015 [do TJBA].”
 
Maria Tereza frisou que, logo depois que o CNJ anulou a portaria, a presidência do TJBA designou uma nova juíza, Eliene Oliveira, para atuar na região. A juíza então emitiu uma decisão em sentido frontalmente oposto ao do CNJ, anulando as matrículas dos agricultores e entregando toda a área novamente a José Valter Dias.
 
“Na prática, designaram uma juíza ad hoc”, afirmou o presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, ministro Dias Toffoli. A juíza deixou a localidade logo após dar essa decisão.
 
Durante o julgamento, o corregedor Nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, criticou o fato de juízes de primeira instância decidirem de forma contrária ao CNJ. “Fico preocupado quando vejo algumas decisões, muitas vezes juiz de primeiro grau desfazendo decisões do colegiado. Isso cria um desequilíbrio no sistema de Justiça”, alertou.
 
“É inadmissível que uma juíza de primeiro grau tome decisão contraria ao plenário do CNJ. A perdurar atitude dessa ordem, vira total bagunça no sistema judiciário”, afirmou o conselheiro Valtércio de Oliveira. 
 
O CNJ também determinou a intimação da juíza Eliene Oliveira para apresentar informações sobre as circunstâncias que a levaram a decidir em sentido contrário ao CNJ quando foi designada para atuar em Santa Rita de Cássia.
 

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