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MG: produtores e especialistas celebram a qualidade das uvas colhidas na safra de inverno 2020

A chegada destes vinhos de qualidade diferenciada no mercado não é imediata, devendo ocorrer a partir de 2021


Foto: Marcel Oliveira

Vitivinicultores das regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil comemoram a melhor safra em qualidade desde o início da produção dos vinhos finos de inverno. As uvas, colhidas em 2020, alcançaram alto nível de sanidade, acúmulo de açúcares, equilíbrio de acidez e concentração de antocianinas e taninos, compostos responsáveis pela cor e estrutura do vinho.

As condições climáticas, que tanto têm afetado o desenvolvimento de outras culturas, foram essenciais para esse desempenho, como explica a enóloga Isabela Peregrino, da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), vinculada à Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa). “O principal fator a contribuir para a qualidade especial da safra 2020 foi a longa estiagem deste inverno. De maneira geral, o manejo da videira em dupla poda, com a colheita das uvas no inverno, já se beneficia dessa característica climática presente no Sudeste e Centro-Oeste do Brasil. Contudo, neste ano, a estiagem começou mais cedo, em abril, e seguiu firme por todos os meses até o final da safra, em setembro”, explica.

Outra característica do inverno, que colaborou para a maior qualidade das uvas, foi a amplitude térmica. “Os meses de outono e inverno, além de bem secos, tiveram temperaturas noturnas bem baixas, o que foi determinante para a sanidade e, principalmente, para a qualidade das uvas”, avalia o presidente da Associação Nacional de Produtores de Vinho de Inverno, Murillo de Albuquerque Regina. “Um período de maturação longo, com essas condições de dias ensolarados, noites frescas e solo seco, é extremamente importante para a maturação plena das uvas, em especial, para a maturação fenólica da casca da uva para vinhos tintos. Resultando em bom teor alcóolico, boa acidez, intensidade da cor, boa estrutura e maciez dos taninos”, acrescenta.

Os resultados poderão ser sentidos em vinhos brancos e tintos que devem chegar ao mercado a partir do próximo ano. “Para os brancos, as noites intensamente frias do início do inverno favoreceram a manutenção de acidez elevada, mesmo com alta concentração de açúcares, o que propicia equilíbrio adequado aos vinhos em relação ao frescor e ao teor alcoólico. Para os tintos, o fator que mais chama a atenção é a elevada concentração de cor dos vinhos, além dos taninos muito maduros, o que propiciará o bom amadurecimento desses vinhos em barricas de carvalho e, posteriormente, o bom envelhecimento em garrafas”, analisa Isabela Peregrino.

A enóloga esclarece que o tempo de descanso dos vinhos varia e que, por isso, a chegada ao mercado não é imediata. “Os vinhos brancos e rosés poderão estar disponíveis a partir do primeiro semestre de 2021. Os tintos, entretanto, necessitam de mais tempo de descanso e devem chegar ao mercado a partir do segundo semestre de 2021 ou no primeiro semestre de 2022. Os vinhos tintos que serão barricados deverão começar a aparecer do segundo semestre de 2022 em diante. Mas a espera do consumidor será recompensada, pois a qualidade promete”, finaliza.

Qualidade reconhecida

A produção de vinhos finos de inverno no Sudeste brasileiro teve início nos anos 2000, por meio da adoção da metodologia de dupla poda da videira, difundida pela Epamig. Desde as primeiras safras, esses vinhos têm destacado nos circuitos gastronômicos e em premiações nacionais e internacionais.

Murillo Regina, responsável pelo desenvolvimento da tecnologia no Brasil, diz que a safra colhida em 2020 deve resultar nos melhores vinhos produzidos em todo este período. “Pelo que pude acompanhar dos vinhos ainda em elaboração, em diferentes regiões que empregam a dupla poda, essa safra deve ser, sem dúvida alguma, a melhor desde o início do emprego desta técnica”, garante.

Os vitivinicultores também demonstram satisfação com as uvas colhidas. “Foi um ano muito bom, com chuvas normais no início do ciclo e um inverno mais longo e seco como não tínhamos há anos, o que resultou em uma produtividade alta com qualidade espetacular”, opina Guto Carbonari, sócio da vinícola Villa Santa Maria, no Vale do Baú, em São Paulo.

Na propriedade, administrada junto com o irmão Marco, são cultivadas as variedades Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Merlot, Sauvignon Blanc, Syrah, Viogner e Chardonnay. A vinícola, em atividade desde 2004, conta com um circuito em enogastronômico e conquistou em 2018 a medalha de prata no Concurso de Bruxelas com o vinho Syrah, safra 2013.

Ricardo Baldo, engenheiro agrônomo, responsável pelo projeto da Vinícola Terras Altas, em Ribeirão Preto (SP), afirma que essa percepção sobre qualidade diferenciada das uvas tem sido compartilhada entre os produtores da região. “Nas conversas com outros vitivinicultores, o tom tem sido o mesmo. As uvas da safra 2020 foram fantásticas em termos de qualidade. A sanidade foi fora da curva. Isso nos chama atenção para uma safra que, sem dúvida alguma, será icônica para os vinhos do Sudeste brasileiro”, opina.

A vinícola, que iniciou as atividades em 2016, está na segunda safra. Atualmente, são produzidas uvas Syrah e Cabernet Sauvignon. A partir de 2021, serão colhidas também as variedades Cabernet Franc, Marselan, Grenache e Viogner. A propriedade é aberta a visitação com circuito enoturístico e de queijos artesanais.

No município de Andradas (MG), o produtor José Procópio Stella, responsável pela vinícola Stella Valentino, considera esta a melhor safra, em termos qualitativos, desde o início das colheitas em 2007. “A produtividade média foi mantida e a qualidade das uvas foi excelente, a melhor que já experimentamos”, revela o vitivinicultor, que, dentro de um ou dois anos, pretende inscrever os produtos em concursos de qualidade. Na propriedade, que também é destinada ao enoturismo, são produzidas as variedades Syrah, Tempranillo e Sauvignon Blanc.

O produtor Ronaldo Triacca colheu, em 2019, as primeiras uvas da propriedade Villa Triacca Eco Pousada e Vinhos, localizada a 60 Km de Brasília (DF), que deram origem ao primeiro vinho fino da região. “Vinificamos na Epamig em Caldas e, apesar de ter sido feito com uvas de plantas super jovens, o seu Claudino Syrah, foi bastante elogiado”, lembra.

Ronaldo integra um grupo de dez produtores rurais que se uniram para construir a Vinícola Brasília, que deve entrar em funcionamento no segundo semestre de 2021. “Temos pouca experiência ainda, na prática foi nossa segunda safra, mas foi excelente. O que nos chamou a atenção foi que tivemos um período frio mais prologando que o do ano passado, com mais dias com amplitudes térmicas maiores e, com certeza, isso refletiu na qualidade das uvas colhidas. Estamos bem otimistas quanto à qualidade dos vinhos que estão sendo elaborados”, conta.

O projeto contempla a área da vinificação e o enoturismo. A ideia é que, além de rótulos próprios, seja criada uma marca coletiva reunindo produtores do Planalto Central num raio de até 300km da Capital Federal. “Nesta safra, além da Villa Triacca, mais dois produtores do grupo, Ercoara Cordeiro e Vinho e Toscana do Cerrado, colheram uvas Syrah. As três marcas devem produzir 8 mil garrafas próprias e um blend de 3 mil garrafas com a marca Vinícola Brasília”, adianta.

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