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Produção animal no século XXI: velhos desafios


Julio Cesar Pascale Palhares

A fome no mundo, com diversas regiões onde a falta de alimentos e morte por desnutrição são fatos cotidianos, é um problema para vários governos. Em resposta a isto, diversas soluções são apresentadas desde o aumento das fronteiras agrícolas, em países onde isto é possível; melhor uso do espaço agropecuário, com o aumento dos índices de produtividade; utilização de culturas e animais geneticamente modificados; profissionalização do produtor rural, passando de uma estrutura amadora para a produção em grande escala, entre outras. Nota-se que destas poucas soluções citadas, todas apresentam agravantes ambientais e muito tem-se dito a respeito das conseqüências ambientais da agropecuária, principalmente em relação ao uso e depreciação dos recursos naturais. Talvez o grande desafio seja este: alimentar uma população de bilhões de habitantes preservando e conservando o meio ambiente no qual estes estão inseridos. Para isto, fatores produtivos, culturais, ambientais e econômicos devem ser considerados, ou seja, o desafio será vencido com a busca da sustentabilidade agropecuária.

 

Desconsiderando questões altamente importantes para a resolução do problema da fome, como a correta distribuição de alimentos nas diferentes regiões do globo e o reequilibro dos níveis de consumo pelas sociedades, pois a fome de muitos é conseqüência do desperdício de poucos, considerar-se-á somente a questão agropecuária para traçar uma linha de raciocínio entre o desenvolvimento desta atividade e seus conseqüentes problemas ambientais. Mais especificamente, as criações animais, geradoras de proteína de alto valor nutricional, mas potenciais impactantes do meio ambiente.

 

Nas últimas décadas, observou-se uma redução da margem de lucro dos criadores por cabeça produzida, em razão de diversos fatores sendo de destacada importância a concentração dos mercados beneficiadores das matérias-primas e comercializadores dos produtos nas mãos de poucas indústrias e empresas. A conseqüência no sistema produtivo está sendo o desaparecimento dos pequenos e médios produtores e o aparecimento de grandes criações, em sistemas cada vez mais intensivos, pois para contrabalancear as reduzidas margens de lucro aumenta-se o número de cabeças.

 

Não há dúvidas de que os sistemas intensivos apresentam maiores produtividades com altas produções de alimentos de forma a atender os mercados consumidores. Mas, paralelo a isto, estes sistemas geram uma grande quantidade de resíduos animais por unidade de área e são muito dependentes de recursos naturais e energéticos. Destaca-se a elevada dependência dos recursos hídricos utilizados para dessedentação dos animais e manutenção da higiene e sanidade do rebanho, entre outros.

 

Quanto ao manejo produtivo, diversas técnicas estão sendo estudadas e propagadas. Estas enfocam principalmente os aspectos nutricionais das criações com redução na eliminação de nutrientes pelas fezes e urinas até mudanças nas práticas de manejo com redução no uso de recursos naturais e energéticos. Mas, mesmo com estas modificações, a quantidade de resíduos gerados é elevada tendo estes alto poder poluente nas águas, ar, solos, biodiversidade, entre outros.

 

A partir deste momento faz-se necessário o uso de um correto manejo ambiental com o intuito de tratar e/ou aproveitar os resíduos gerados. Mas ao contrário das técnicas de manejo produtivo, o manejo ambiental de criações animais apresenta profundas carências. Estas carências compreendem o reduzido número de profissionais agropecuários que atuem nesta área, desconhecimento dos resíduos gerados em termos quantitativos e qualitativos para as diversas espécies e sistemas de criação, o desenvolvimento e aplicação de técnicas de tratamento e aproveitamento específicas para as criações animais, e não importadas de outras atividades e o monitoramento das conseqüências ambientais advindas das criações.

 

Considerando-se a água um recurso natural escasso e imprescindível à manutenção da vida de animais e vegetais e sendo as criações animais poluidoras desta, a avaliação dos efeitos quantitativos e qualitativos das criações na qualidade da água que utilizam compreendem um primeiro passo para decisões futuras sobre como minimizar o impacto. Se o desenvolvimento da cadeia produtiva animal continuar a ser dado da forma atual, sem considerar as conseqüências ambientais, e novos estudos e técnicas não forem realizados e praticados, problemas de ordem ambiental, social e econômica serão gravíssimos, propiciando um agravamento na já desgastada relação entre a produção de alimento e a conservação do ambiente.

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