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Decisão do STF sobre o Funrural afeta mais de 5 milhões de propriedades no Brasil


RAFAELA AIEX PARRA

A recente decisão do STF sobre a constitucionalidade da cobrança do FUNRURAL tem causado revolta no setor agropecuário.
 
Este assunto é de grande interesse das pessoas físicas produtores rurais, principalmente dos pecuaristas, e em especial àqueles que comercializam matrizes, reprodutores, animais para cria, recria e engorda e dos agricultores, comercializadores de grãos, sementes e farelos.
 
Entenda o caso.
 
PARA COMEÇAR É NECESSÁRIO CONTEXTUALIZAR O TERMO “FUNRURAL”. AFINAL, DO QUE SE TRATA ESSA CONTRIBUIÇÃO?
 
É uma contribuição social destinada a custear a seguridade geral (INSS), cobrado pela RECEITA FEDERAL sobre o resultado bruto da comercialização da produção rural e descontado, pelo adquirente da produção, no momento da comercialização, devida tanto pelo empregador rural pessoa física (art. 25 da Lei n.º 8.212/91) quanto pelo produtor rural pessoa jurídica (art. 25 da Lei n.º 8.870/94).
 
COMPOSIÇÃO DO TRIBUTO:
 
Alíquota pessoa física: 2,3% (2% INSS; 0,1% RAT; 0,2% SENAR).
 
A PARTIR DE QUANDO O FUNRURAL PASSOU A SER COBRADO DO PRODUTOR PESSOA FÍSICA?
 
As operações acima citadas, entre criadores pessoas físicas, eram ISENTAS do denominado FUNRURAL, que é a contribuição social sobre a comercialização da produção rural, cuja alíquota é de 2,3%.
 
A tributação somente incidia e era exigida quando a comercialização era feita com empresas adquirentes, pessoas jurídicas, no caso dos pecuaristas: frigoríficos e cooperativas, que são os responsáveis pela retenção e recolhimento. E no caso dos agricultores as cooperativas, empresas de insumos e sementeiras, por exemplo.
 
A partir de 21 de setembro de 2008, com a entrada em vigor da Lei 11.718/2008, que revogou o § 4º do artigo 25 da Lei 8.212/91, que previa a isenção nas operações entre produtores pessoas físicas, estas operações passaram a compor o campo de incidência do Funrural, que passou a ser exigida dos produtores em todas as comercializações, por meio de Guia da Previdência Social – GPS.
 
O JULGAMENTO DO STF CONSIDERANDO A COBRANÇA INCONSTITUCIONAL, EM 03.02.2010
 
Por votação unânime, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, em 03.02.2010, a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei 8.540/92, que previa o recolhimento de contribuição para o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (FUNRURAL) sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural de empregadores, pessoas naturais.
 
A decisão, que beneficiou os fornecedores de bovinos para abate, foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 363852, interposto pelo Frigorífico Mataboi S/A, de Mato Grosso do Sul, e uma subsidiária sua. No recurso, elas contestavam acórdão (decisão colegiada) do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que manteve sentença proferida em Mato Grosso do Sul no sentido da constitucionalidade do dispositivo legal impugnado.
 
No mesmo julgamento, o Plenário do STF negou, por maioria, pedido da Advocacia Geral da União (AGU), que atuou em defesa do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para que a Suprema Corte modulasse os efeitos da decisão, aplicando-a com efeitos ex nunc, ou seja de forma não-retroativa (nesse caso não haveria devolução dos valores recolhidos, que simplesmente deixariam de ser cobrados). A negativa da Suprema Corte abriu a possibilidade de outros produtores ajuizarem ações pleiteando o mesmo direito obtido pelo Frigorífico Mataboi S/A, o que de fato ocorreu.
 
Os números nos indicam que haviam mais de 15 (quinze) mil processos tramitando, com liminares vigentes, desobrigando o produtor rural empregador de recolher a contribuição Funrural sobre receita bruta de sua comercialização (2,1%, visto que os 0,2 do SENAR permaneceram), com base na antiga decisão.
 
A decisão da época, a ementa, foi esta:
 
Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, conheceu e deu provimento ao recurso extraordinário para desobrigar os recorrentes da retenção e do recolhimento da contribuição social ou do seu recolhimento por subrrogação sobre a “receita bruta proveniente da comercialização da produção rural” de empregadores, pessoas naturais, fornecedores de bovinos para abate, declarando a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com a redação atualizada até a Lei nº 9.528/97, até que legislação nova, arrimada na Emenda Constitucional nº 20/98, venha a instituir a contribuição, tudo na forma do pedido inicial, invertidos os ônus da sucumbência. Em seguida, o Relator apresentou petição da União no sentido de modular os efeitos da decisão, que foi rejeitada por maioria, vencida a Senhora Ministra Ellen Gracie. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, licenciado, o Senhor Ministro Celso de Mello e, neste julgamento, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa, com voto proferido na assentada anterior. Plenário, 03.02.2010.
 
A DECISÃO DE 30/03/2017 QUE DECLARA CONSTITUCIONAL A COBRANÇA E AFETA TODOS OS PRODUTORES RURAIS DO BRASIL
 
Todavia, após 07 (sete) anos daquela decisão e, por forte pressão política, o Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos (6 a 5), no Recurso Extraordinário 718.874/RS-RG, reconheceu a constitucionalidade da contribuição exigida do produtor rural pessoa física empregador, nos termos do artigo 25 da Lei 8.212/1991, denominada de Funrural, fixando a seguinte tese: “É constitucional, formal e materialmente, a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela Lei 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção”.
 
Esta decisão causou enorme insegurança em todo o setor, que pode ter um déficit de produção de até 25% ao produtor rural, o que é muito ruim para a economia nacional, principalmente nesta fase de recuperação.
 
Recentemente o secretário de Política Agrícola do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Neri Geller, disse durante a abertura do Fórum do Agronegócio "O desafio de alimentar o mundo", na ExpoLondrina 2017, que o setor terá "um problema sério pela frente" ao comentar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito da cobrança do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). [1]
 
Vale lembrar que ainda há incerteza na aplicação da decisão, principalmente em relação a possíveis efeitos retroativos. Quanto ao tema, a Frente Parlamentar da Agropecuária adiantou-se e afirmou que irá cobrar formalmente, através de seus representantes legislativos, posicionamento do Supemo, enaltecendo a jurisprudência que havia se formado por conta da decisão anterior.[2]
 
Conclusão.
 
Estima-se que no Brasil, segundo dados do INCRA, existam mais de 5 (cinco) milhões de propriedades rurais cadastradas, entre pequenas, médias e grandes. Esta decisão do STF atinge a todos os produtores que fazem comercialização de produtos oriundos do agronegócio.
 
Assim, considerando que mais de 80% da capacidade produtiva vem de agropecuária familiar, esta decisão do Funrural vai afetar drasticamente todos os envolvidos (pessoas físicas empregadores) e, além de trazer enorme insegurança jurídica, afetar a economia de toda a cadeia produtiva de um país inteiro.
 
Há uma forte luta social e política, capitaneada pelos representantes legislativos da bancada ruralista, visando reverter a decisão judicial e seus impactos. Há também uma mobilização da classe rural, do agronegócio, para encontrar meios legais de reversão ou, ao menos, mitigação dos efeitos dessa decisão.
 
Muitos representantes da classe produtora rural pronunciaram-se em discordância à dita decisão e, principalmente, ao efeito negativo – em cascata – que pode gerar a toda a sociedade.
 
O Presidente da Sociedade Rural Brasileira, Marcelo Vieira, fez um discurso preocupado ao comentar a decisão do STF, enaltecendo as taxas de juros, inflação, aumento de custos de folha de pagamento aos produtores agrícolas, complexidade de leis trabalhistas, custos de adequação à legislação ambiental e, por isso, mais este impacto financeiro ao setor, poderia acarretar um problema ao país, que é o maior produtor de matéria prima agrícola para o mundo.[3]
 
Os advogados habilitados no processo do Recurso Extraordinário 718.874/RS-RG, representantes da Sociedade Rural Brasileira e demais entidades representativas do agronegócio, que são partes no processo, afirmaram que irão opor Embargos de Declaração, com o escopo de modular a decisão e alterá-la. [4]
 
Mas, cumpre-nos salientar a todos os produtores, que este manejo processual não vai suspender a decisão do STF do ultimo dia 30.03.2017 e tampouco terá prazo para ser analisado.
 
A exemplo do discurso proferido para mais de 180 (cento e oitenta) pessoas durante o I Ciclo de Palestras em Direito Ambiental e Agronegócio, realizado em 05.04.2017, durante a Expo Londrina, faço posicionamento, enquando advogada do Escritório ADVOCACIA RP, no sentido de avaliar a decisão do STF como a personificação da palavra INSEGURANCA, fazendo o apelo de que o Governo precisa auxiliar o produtor da “porteira pra fora”, para que o setor possa continuar crescendo e ajudando a manter estável a economia do Brasil nos próximos anos.
 
Por isso é importante que sejam tomadas certas precauções:
 
1    Produtores que não tenham se beneficiado de medidas liminares e cuja retencão seja feita por cooperativas e frigiríficos por exemplo, que cobrem destes a regularização, comprovação de retencão;
2    Produtores beneficiados com medidas liminares para não recolhimento do Funrural, que aguardem as devidas intimações no processo para que retomem os pagamentos contributivos;
3    Produtores cujas liminares judiciais sejam para depósito em conta vinculada ao processo, que continuem fazendo os respectivos pagamentos;
4    Produtores que não tenham ajuizado ações sobre o Funrural na justiça, que continuem fazendo o recolhimento da contribuição normalmente.
 
Por todas as brechas da lei, de discussões que ainda podem ser suscitadas judicialmente, o tema do Funrural para o setor do agronegócio ainda está longe de uma solução definitiva, cabendo aguardar os próximos capítulos.
  
[1]http://www.folhadelondrina.com.br/economia/para-secretario-decisao-sobre-funrural-compromete-producao-974176.html
 
[2]http://www.fpagropecuaria.org.br/destaques/para-fpa-decisao-stf-sobre-funrural-vai-gerar-impacto-significativo-no-setor-e-no-pib-brasileiro#.WOrK0cf26gQ
 
[3] http://www.srb.org.br/marcelo-vieira-comenta-cobranca-de-funrural-no-terraviva/
  
[4] http://www.srb.org.br/publicacoes/funrural-orientacao-do-conselho-juridico-do-ipa/
 
 

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