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As vacas e o aquecimento global


Amélio Dall’Agnol

A sociedade está sendo frequentemente alertada de que o Planeta Terra corre riscos de sobrevivência por causa da insustentabilidade do modelo de desenvolvimento praticado pelos cidadãos, mundo afora. O principal risco à sua sobrevivência estaria vinculado às mudanças climáticas globais causadas pela queima dos combustíveis fósseis (carvão mineral, gás natural e derivados do petróleo), os quais emitem milhões de toneladas diárias de gás carbônico (CO2) na atmosfera. Individualmente, o CO2 é um dos gases que menos polui o ambiente, mas, dadas as grandes quantidades produzidas, é considerado o principal causador do aquecimento atmosférico. 

Os gases de efeito estufa (GEE) são assim denominados porque bloqueiam a passagem da radiação que busca o caminho do espaço sideral, após aquecer a terra, transformando a superfície desta numa espécie de imensa estufa. Embora a mídia geralmente associe o aquecimento atmosférico ao CO2, ele não é o único a causar este fenômeno. Há outros gases, individualmente muito mais poluentes, que não são muito lembrados porque embora mais tóxicos ao ambiente, eles ocorrem em quantidades infinitamente menores. Uma molécula do gás sulfidrila, por exemplo, utilizado na indústria do cimento, pode causar efeito estufa 20.000 vezes superior a uma molécula de CO2. 

O segundo mais importante GEE na atmosfera é o metano (CH4), 25 vezes mais poluente do que o gás carbônico, mas emitido em muito menor quantidade. Ele é produzido a partir da atividade de bactérias metanogênicas e liberado pelos pântanos, lixões, detritos animais e, principalmente – acreditem - pelo rúmen dos bovinos e outros ruminantes. A atividade agropecuária é considerada uma das principais responsáveis pela emissão de CH4 e 90% deste gás provem da digestão dos bovinos. 

O Brasil é detentor do segundo maior rebanho bovino do planeta (cerca de 220 milhões de cabeças), razão pela qual é questionado pela grande emissão de metano proveniente da digestão desses animais, que pode ser mais nociva para o aquecimento global do que as emissões de CO2 provenientes dos automóveis (15,4% dos bovinos contra 15,1% dos automóveis), de acordo com inventário do governo brasileiro. 

Segundo divulgou-se recentemente no Fórum Econômico Mundial realizado em São Paulo, brevemente estará disponível um suplemento alimentar inibidor da biogênese do metano produzido pelos bovinos, que uma vez ingerido na alimentação desses animais é capaz de reduzir em 1/3 a emissão desse gás. Quando isto se tornar efetivo, a preocupação com as emissões dos bovinos estará reduzida em mais de 30%. Uma boa notícia já que, por decisão própria, os animais nada farão para reduzir a flatulência! No entanto, devemos lembrar que a grande maioria dos bovinos no Brasil são criados a pasto, e desta forma seria difícil a adição do referido inibidor na dieta.

Deixar de comer carne para reduzir a emissão de GEE não é a solução. Isto até pode aumentar a concentração desses gases na atmosfera, visto que a ausência de bovinos reduz a produção do pasto, cujo desenvolvimento pode sequestrar mais carbono do que o emitido pelos ruminantes. 

A recuperação das pastagens degradadas é uma maneira eficiente de retirar o carbono em excesso retido na atmosfera. O governo brasileiro se comprometeu durante a 15ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 15), a reduzir voluntariamente as emissões de GEE entre 36% e 39% até 2020, prometendo, entre outras medidas, recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas. Desta forma o CO2, nocivo na atmosfera, estaria estocado no solo sob a forma de matéria orgânica, potencializando a produção das pastagens.

Deixemos o boi comer o capim. Nossa responsabilidade deve concentrar-se na prática de uma agropecuária sustentável, para o que, além de recuperar pastagens degradadas, precisamos aumentar o plantio de florestas, integrar a produção agrícola com a pecuária, incrementar o plantio direto na palha, promover maior inoculação das sementes de soja para reduzir a necessidade da adubação nitrogenada via maior fixação biológica de nitrogênio e aumentar o tratamento dos dejetos dos animais.

Uma pesquisa divulgada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) indicou que, no período chuvoso, onde bovinos costumam ser alimentados por rações de boa qualidade, a emissão de gás metano no meio ambiente é cerca de nove vezes menor do que no período seco, onde as pastagens são escassas. O resultado contrapõe pesquisas estrangeiras que apontavam a pecuária brasileira como poluidora ambiental. 

Os resultados foram obtidos na região dos Cocais Maranhenses e fazem parte da tese de doutorado de Marcílio Nilton Lopes da Frota, sendo apresentada no Programa de Doutorado Integrado em Zootecnia, na Universidade Federal do Ceará (UFC). Os dados obtidos por Frota indicam que a emissão de metano é relacionada a alimentação do animal, quanto menos fibroso e mais digestível for o alimento consumido, menos metano será produzido. 

O especialista também afirma que a quantidade de emissão de gases está ligada diretamente ao próprio sistema de produção. Segundo ele, sistemas silvipastoris, que apresentam pastos com maior valor nutritivo ao longo do ano ou mesmo a adoção do Sistema Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) com capim na fase ideal para consumo, pode quase anular essa emissão.  

“Foi emitido, em determinadas épocas do ano, 20% menos metano do que os organismos internacionais estão apontando. Temos que buscar resultados próprios nacionais para discutir no Brasil e no exterior e, assim, evitar que divulguem informações negativas sobre a contribuição da pecuária brasileira para a emissão de metano”, afirma.

Quanto a escolha de um sistema com ou sem árvores, Frota afirma que os dois são igualmente positivos e não apresentaram diferenças no que se refere a emissão de gases pelos bovinos durante a pesquisa. O desmatamento total de uma área com instalação de pastagem também não indicou ganhos de produtividade e se igualou a um sistema silvipastoril contendo 67 árvores de babaçu por hectare. 


 

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