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A Sucessão Familiar nas Empresas do Campo - Breves Considerações


CLAUDIA SOUSA

 

Claudia Sousa1

Problemas relacionados a empresas familiares ocorrem e preocupam o mundo inteiro, ou seja, não é um privilégio brasileiro. Em qualquer tipo de empresa a sucessão familiar é de suma importância e traz inúmeros conflitos, e, não é diferente nas empresas do campo.

A harmonia familiar deve ser zelada para que a empresa se mantenha prospera e sustentável, no entanto, infelizmente, muitas das vezes o patrimônio familiar se perde, e, a falta do diálogo e de um planejamento sucessório são razões que precisam ser consideradas.

O Sebrae-SP [2] possui estatísticas onde mostram que de cada 100 empresas familiares, apenas 30 sobrevivem à transição da primeira para a segunda geração, e, ainda de acordo com o Sebrae, atualmente 90% dos negócios brasileiros são familiares. Diante disso, mostra-se necessário um planejamento de sucessão familiar para a sobrevivência do negócio.

Surge então um questionamento: O que pode ser considerado uma empresa familiar? Em linhas gerais, uma empresa familiar é aquela que é controlada por uma família. Os membros da família têm controle legal sobre a propriedade. É uma empresa que será transferida à geração seguinte, onde há de se verificar que existe um elo afetivo, pois é um projeto que pertence aos pais, aos avós. Lembrando que a empresa familiar pode ser microempresa, pequena empresa, ou mesmo uma multinacional.

Nessa perspectiva, encontramos três pontos que orbitam em torno da sucessão familiar, são eles: a) os conflitos familiares; b) o planejamento tributário; e c) a proteção do patrimônio.

De certo, que preparar a sucessão familiar de alguém que sempre se preocupou em deixar sua família segura, do ponto de vista financeiro, e que provavelmente foi centralizador, tem como efeito uma relação conflituosa entre os familiares. Sem deixar de mencionar que o planejamento sucessório é uma das colunas de sustentação para a formação da holding familiar.

A falta de diálogo e de clareza nas relações entre os familiares não podem ser deixadas de lado, pois os con?itos em família sempre existirão e devem ser administrados antes do problema acontecer. Principalmente, quando há bens e dinheiro envolvidos.

Nesse contexto, há outros fatores também que geram inúmeros conflitos, damos como exemplo: muitas das vezes os pais pensam que seus filhos irão sucedê-lo e não perguntam o que os filhos querem realmente fazer; o conflito de gerações também é outro ponto, hoje, a expectativa de vida é muito maior e podemos encontrar até mesmo três gerações em um mesmo negócio; a relutância em passar o comando da empresa para uma outra pessoa; o receio de falar no assunto, pois muitos entendem que estão falando da morte; a tecnologia, dentre outros.

Nessa perspectiva, quando se observa que a sucessão é planejada, o processo da sucessão é natural e fundamental para a proteção dos bens da família e a continuidade da atividade empresarial, pois há de se lembrar que não é só a família que está envolvida, mas todos os funcionários que certamente ficam inseguros e podem causar um pânico interno na empresa.

A nosso ver, trazer as ideias do mundo coorporativo para as empresas no campo e ainda sendo estas empresas familiares, de certa forma, traz inúmeros desafios, pois como se trata de uma empresa familiar deve ter entre eles a maior transparência, regras claras, pois, há uma junção da família com a empresa. Desta forma, deve haver uma somatória entre manter saudável as relações familiares e a continuidade da atividade empresarial.

Existe uma fórmula para preparar melhor a transferência de uma empresa para membros da mesma família? Como otimizar sua gestão? A transferência de uma empresa para membros da mesma família ou para um gestor de confiança, pode e deve ser bem planejada. Podemos identificar três pontos que podem ser considerados para essa transição.

Primeiro, identificar os potenciais dos membros da família. O empresário que ao planejar transferir a empresa para um dos membros de sua família deve identificar qual dos membros estão propensos a dar continuidade às atividades empresariais, de acordo com o potencial, desejos, e, deve ser feito o quanto mais cedo.

O segundo ponto é que uma vez que o negócio é transmitido, é fundamental saber como liberar as rédeas da administração. Quando há instruções contraditórias advindas da administração, gera de outra ponta uma insegurança até mesmo entre os funcionários. Como advogada, o meu conselho é fazer essa transmissão com a maior transparência possível, com muito diálogo, sempre antecipando o problema. As funções, do antigo gestor, podem ser reduzidas gradualmente, a título de exemplo: o antigo gestor sair do conselho da presidência e vai para a supervisão ou mesmo uma consultoria. Isso é importante, pois a transmissão será feita de forma tranquila e de outra ponta não caracteriza a morte social do antigo gestor. 

Alguns clientes me questionam:- e se ninguém da minha família não quiser dar continuidade às atividades? O que fazer? Os problemas de planejamento começam, pois inexiste o diálogo entre os membros da família. As regras devem ser transparentes sempre.

Terceiro, se não houver ninguém da família que não queira dar continuidade às atividades da empresa, a saída é encontrar alguém fora da família, onde esse novo gestor trará ares de inovação. Pode ser um antigo funcionário que já ocupe um cargo de gerência. No entanto, esse funcionário deve ser conscientizado no que tange a especificidade da gestão de uma empresa familiar, especialmente sua governança, cujo objetivo é garantir a sustentabilidade do controle familiar.

Uma empresa familiar não funciona como qualquer outra, por isso, é importante ter tempo para explicar aos outros membros da família a estratégia implementada, os objetivos que devem ser alcançados, e, assim há a necessidade de fazer relatórios regulares, organizar reuniões onde todas as partes interessadas serão convidadas.

Nesse trilhar, podemos observar que alguns objetivos são alcançados quando se faz o planejamento da sucessão familiar: a) manter e proteger o patrimônio contra a interferência de terceiros ; b) contribuir para o crescimento da empresa e a continuidade da atividade empresarial; c) minimizar as disputas judiciais, como também a redução dos custos da transmissão do patrimônio; d) e manter as relações familiares.

Em um planejamento sucessório, o planejamento tributário é também da mesma forma muito importante quanto minimizar os conflitos familiares. Quando olhamos para uma empresa familiar, podemos perceber três aspectos: a) a família; b) a propriedade; c) o negócio.

Alguns clientes me perguntam, por que devo fazer a divisão dos meus bens em vida? Simples. O inventário, além de oneroso, ou seja, muito caro, é burocrático, há inúmeros conflitos e dispende de tempo.

A título de ilustração, o ITCMD (Imposto Transmissão Causa Mortis e Doação), é devido aos Estados nos casos de heranças, legados e doações, ou na mera transferência de bens, como valores depositados em contas correntes ou aplicações financeiras, acima de determinado montante.

A alíquota em São Paulo é de 4%, e este tributo é devido quando o bem tem valor superior a R$ 40 mil. Em outros Estados, a alíquota chega a 6%, e, o porcentual máximo permitido é de 8% do patrimônio. Insta salientar, que circula no Senado o projeto de lei que tem como proposta o aumento das alíquotas do ITCMD e ainda de acordo com a mesma, a alíquota máxima passaria de 8% para 25%.

Neste contexto, pode ser feito o inventário administrativo conforme disposição na Lei 11.441/07, pois as custas cartorárias são bem menores e com um prazo mais curto. Se os herdeiros forem capazes, estiverem todos de acordo e se não houver testamento, seja ele particular ou público, o inventário administrativo é a melhor opção.

A criação de uma holding diminui os custos tributários, e, dependendo do perfil da empresa (s) e da família é uma excelente opção, pois constitui uma estrutura societária e assume a titularidade dos bens, direitos e créditos, bem como a própria titularidade e atividades negociais. [3]

No entanto, somente criar a holding não resolve o problema. De certo que a holding familiar assegura o controle da família blindando o seu patrimônio, mas deve haver a junção com o planejamento tributário do patrimônio em vida fazendo a cessão das quotas, antecipando-se a legitima, com divisão do patrimônio empresarial, e, como consequência, tornando a empresa e seus bens permanentes, o patrimônio da família cresce e os conflitos familiares podem até ser dirimidos.

Nesse trilhar, é importante sempre ter alternativas para que, na sucessão, ou seja, as gerações futuras estejam preparadas para enfrentar os custos altos de um inventário, e, se possível, consigam reduzi-los licitamente.

O seguro de vida é algo que quase ninguém pensa, mas fazer uma apólice de seguro de vida em nome dos herdeiros pode ser uma alternativa para gerar recursos e facilitar o processo sucessório. O prêmio do seguro não entra no inventário, e, portanto, não se submete ao imposto de transmissão. A transferência dos recursos para os herdeiros é bem rápida e livre de burocracia.

Havendo a credibilidade entre os familiares, uma outra opção é manter uma conta conjunta com os pais ou irmãos ou ainda entre o casal. É uma medida importante que tem por objetivo viabilizar que esses valores possam ser movimentados sem a necessidade de alvarás após a falta do patriarca ou matriarca.

Outra alternativa que pode evitar inúmeros aborrecimentos, pois também não entra no inventário e nem se submete ao imposto de transmissão, assim como o seguro de vida, é o plano gerador de benefícios livres (PGBL) e o vida gerador de benefícios livres (VGBL).

As tentativas de blindagem do patrimônio como: a criação de holding familiar, a doação em vida, o testamento, dentre outros, são de grande importância e utilidade na gestão dos grupos familiares, mas de nada adianta se não houver regras claras entre os membros da família. A transparência é de suma importância para que o patrimônio fique seguro.

O que encontramos no dia a dia do escritório é uma dificuldade ao diálogo, muitas empresas são compradas por outras organizações, pois como não houve nenhum planejamento, as empresas familiares acabam por perecer.

Pelo exposto, podemos evitar inúmeros problemas se o planejamento, como até mesmo sugeri o nome, for feito antes da crise; respeitar as diferenças entre os familiares, ter um ambiente transparente, onde todos possam se manifestar e acima de tudo entenderem que além da família existe uma empresa com inúmeros funcionários que precisam de seus empregos para sustentarem suas famílias. 

1. Adogada. Mestre em Direito. Atua nas áreas do Agronegócio. Securitário. Tributário

E-mail: [email protected] / Site: claudiasousaadvocacia.com.br

 

[2]Sebrae-http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ufs/ap/artigos/como-planejar-a-sucessao-familiar,9b7313b1bd0af510VgnVCM1000004c00210aRCRD

[3] Mamede, Gladston Holding Familiar e suas vantagens – Planejamento jurídico e Econômico do patrimônio e da Sucessão Familiar, pág 09, Editora Atlas, 8ª edição atualizada, São Paulo – SP, 2016.

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