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Liberalizar versus proteger


Amélio Dall’Agnol

É recorrente a queixa veiculada em boa parte da mídia nacional sobre o exagerado protecionismo da economia brasileira, que a faz uma das mais fechadas do mundo (130º colocação) e uma das mais difíceis para se fazer negócios (128º posição). Desde os anos 80, quando a globalização ganhou força, os índices de crescimento da nossa economia têm estado consistentemente abaixo da média mundial, em boa medida, consequência das restrições que o Brasil impõe à entrada de pessoas, capitais, bens e serviços. 

O novo governo brasileiro, empossado recentemente, promete abertura da economia para melhorar os negócios do País. Mas, apesar do aparente consenso da comunidade empresarial sobre a necessidade de acabar com privilégios na economia e de integra-la às demais cadeias globais de valor, o novo Ministro da Economia provavelmente enfrentará resistência de parte de alguns empresários viciados em protecionismo, que concordam com as restrições, desde que aplicadas aos concorrentes.

A reserva de mercado é um mecanismo que prejudica os negócios de qualquer país, pois evita a competição com outras economias, prejudicando-o por proporcionar sobrevida a produtos carentes de competitividade. Sem o desafio da competição, o empresário pode não ser estimulado a buscar maior eficiência na sua produção. Evitar a competição é não acreditar no próprio potencial. 

Quem não se recorda dos anos 70, quando os brasileiros foram forçados a comprar computadores fabricados no Brasil - caros e ultrapassados - por causa da proteção contra a concorrência dada à indústria da informática nacional, que proibia a importação de máquinas mais modernas fabricadas no exterior! Patinamos no atraso dessas geringonças por anos, até que houve reconhecimento do desastre que tal política representava para o desenvolvimento do País e o mercado finalmente abriu-se para que os brasileiros pudessem desfrutar dos avanços das novas tecnologias da informação.

E os automóveis! Eram verdadeiras carroças, conforme reconhecia o próprio Presidente da República da época, que abriu o mercado para que os brasileiros pudessem desfrutar da modernidade sobre rodas. As “carroças” resultaram do protecionismo dado à indústria automobilística nacional, mas, também, por causa do alto custo das modernidades embutidas nos novos automóveis, que poucos brasileiros tinham condições de bancar.

O agronegócio, hoje o setor mais competitivo da economia nacional, só evoluiu a partir do fim dos subsídios oficiais dos anos 60 a 80.

Os subsídios castigaram os bons produtores rurais, forçados a competir com agricultores que pouco investiam em tecnologias de produção, dada a opção de reclamar junto ao banco financiador ao final da safra, pela falta de produção. Com o térmico desse mecanismo e a disponibilidade de insumos modernos, a produtividade da agricultura brasileira deslanchou e sua atual eficiência é reconhecida e admirada pelas nações mais desenvolvidas do Planeta. O Brasil era importador de alimentos na década de 1970 e atualmente figura como 2º ou 3º maior exportador mundial, com produção suficiente para alimentar 1,2 bilhões de pessoas: 5,7 vezes a nossa população.

Mesmo reconhecendo a capacidade competitiva do Brasil na produção agrícola, temos representantes do setor defendendo barreiras para importar e proteção para exportar commodities agrícolas. Apenas para exemplificar, em 2018, as exportações do agro brasileiro foram quase nove vezes superiores às importações (US$ 102 bilhões exportados, ante importações de apenas US$ 14 bilhões).

Desfrutando de tamanha vantagem, nossos empresários não poderiam reclamar da competição do leite importado da Nova Zelândia, do etanol trazido dos EUA ou do trigo importado da Argentina, pois configuraria uma atitude onde se exige liberalização do comércio para os produtos com os quais o Brasil é competitivo, e se quer levantar barreiras à entrada de produtos com os quais o Brasil ainda carece de competitividade.

Eventualmente, pode haver necessidade de algum tipo de proteção sobre produtos sensíveis do nosso portfólio, até que os mesmos se estabeleçam no mercado em condições de competir. Entretanto, essa proteção deve ocorrer em casos excepcionais. 

É hora de o setor produtivo brasileiro se desapegar da proteção comercial do governo e buscar apoio para ganhar competitividade, via maiores produtividades e menores custos, através, principalmente, do uso racional dos insumos de produção e das modernas práticas culturais. Na agricultura, há uma considerável base tecnológica para se reduzir custos e riscos, e aumentar a produtividade e a regularidade produtiva. Esta base tecnológica abrange práticas de manejo dos sistemas voltados para as boas práticas agrícolas (manejo das pragas, das doenças, do solo, da cultura...). Sem critérios científicos atualizados, os insumos disponibilizados para defesa das plantas contra pragas e doenças são usados com maior frequência do que o necessário, com reflexo nos custos e sem aumento da produtividade. Por outro lado, a produção por vezes tem planejamento, manejo e análise fragmentados, com foco em uma única safra, de uma única cultura, ao invés da estruturação e integração dos sistemas de produção no médio e longo prazos. Assim sendo, são desconsideradas ações baseadas em conhecimentos e práticas culturais, principalmente as que independem da majoração no uso de insumos. Portanto, antes de buscar a proteção comercial, o produtor tem o dever de buscar o acesso à base tecnológica já disponível e servir-se dela racionalmente. 
 

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