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CPDA: 31 anos de Desenvolvimento Agrícola


Marcos Marques de Oliveira

No final de 1976, iniciavam-se os trabalhos do atual Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ), instituição que abrigou, nesses 31 anos de história, completados em 2007, alguns dos mais destacados pesquisadores da questão agrária brasileira.

No evento comemorativo dos 30 anos do programa, realizando entre os dias 28 e 30 de novembro de 2006, um dos protagonistas dessa odisséia, cunhou a seguinte sentença: “Aqui eu vejo um sonho. Falamos muito em desenvolvimento sustentável. Mas o que é desenvolvimento sustentável, senão permanência no tempo. O CPDA, portanto, é um exemplo, um sonho sonhado realizado”, exprimiu Carlos Miranda, diretor do Departamento de Desenvolvimento Rural Sustentável do Instituto Interamericano de Cooperação Agrícola (IICA), um dos responsáveis pela criação do então Centro de Pós-Graduação em Desenvolvimento Agrícola (daí a sigla que ficou famosa!) da Escola Interamericana de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (EIAP/FGV-RJ).

Criado em plena ditadura militar, no final de 1976, o CPDA foi pensado por alguns integrantes do Ministério da Agricultura para ser o ponto culminante de um inovador sistema nacional de planejamento e ensino do setor agrícola brasileiro. No entanto, com a nomeação de um novo ministro, o economista Delfim Netto, em 1979, o centro enfrentou sua primeira grande crise. “O que tinha sido construído em anos foi liquidado em 48 horas, por falta de financiamento. Segundo o ministro, não era hora de planejar, mas de fazer. Mas, pergunto, como fazer sem pensar? O importante é que o CPDA sobreviveu e seu espírito permanece”, completou Carlos Miranda.

Acolhida na “Rural”
Fundamental para a continuidade dessa trajetória de sucesso foi a acolhida pela UFRRJ – também conhecida como a “Rural” do Rio de Janeiro – no Departamento de Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade do ICHS, ainda no início dos anos 1980. Mas esse processo, segundo uma de suas testemunhas, não foi necessariamente idílico. “Foi um período de muita tensão e conflito, inclusive entre nós, apesar do espírito de corpo. Por fim, não éramos nem FGV, nem Rural”, declarou Nelson Giordano Delgado, professor do CPDA, no mesmo evento acima citado.

Em sua fala, Delgado destacou ainda quatro aspectos que marcaram o percurso da instituição: a) a busca do equilíbrio entre um forte programa de História da Agricultura e uma Economia tradicional com “perfumaria” de Ciências Sociais; b) a busca de uma gestão democrática frente a uma diversidade de pressões (da FGV, do Ministério da Agricultura, etc.), contrabalançadas pela mobilização dos alunos, os quais são parcialmente responsáveis por essa história de sucesso; c) a legitimação do CPDA frente à comunidade acadêmica, especialmente pela qualidade de seu corpo docente e a participação de professores de fora, tais como Miriam Limoeiro Cardoso, Carlos Lessa e Otávio Velho; d) e a sua contribuição para a retomada do debate público no Rio de Janeiro, num esforço de democratização do qual participaram intelectuais como Jacob Gorender, Octávio Ianni e, entre outros, Chico de Oliveira.

Pedindo um aparte na explanação de Delgado, a historiadora Maria Yeda Linhares fez questão de lembrar que aqueles eram tempos difíceis, de vigência de um regime ditatorial, em que foi necessário usar “expressões neutras” e tratar do problema agrário como uma “questão técnica”. “Eu e meus companheiros de aventura pensávamos que estávamos criando alguma coisa, recriando o conhecimento brasileiro sobre o campo. Sentíamos que éramos poderosos e mergulhamos com entusiasmo nesse trabalho. Mas não podíamos falar muito e tomamos o discurso do desenvolvimento agrícola como motor para superação da miséria, do atraso. Não podíamos usar o termo ‘desenvolvimento agrário’, por exemplo. Dessa minúscula célula, surgiu um grande centro, que depois se perpetuou com a mesma sigla e novas missões”.

Buscando discutir idéias novas para transformar o país pela ótica do trabalho, esse pequeno grupo viajou para conhecer o Brasil, impulsionando uma nova historiografia sobre o rural. “Nosso idealismo, destacou Linhares, chegou a tocar as fibras de alguns setores, formando pessoas que tiveram expressão na vida brasileira” – entre as quais, afirmaria Delgado, se encontra a própria historiadora.

Assim, após “a passagem devastadora de Delfim pelo Ministério da Agricultura”, continuou Delgado, o inusitado programa de pesquisa interdisciplinar aporta na Rural – “caindo bem como um programa de pós-graduação” – e torna-se “mais aberto”, tratando as questões rurais de forma mais abrangente. “Estabeleceu-se uma nova institucionalidade e buscou-se aumentar sua qualidade, dividindo-se em duas áreas de concentração (‘Sociedade e Agricultura’ e ‘Desenvolvimento e Agricultura’) superando a ênfase inicial no desenvolvimento capitalista e abrindo-se em dimensões mais amplas”.

Conquistando uma nova sede no Centro no Rio de Janeiro, após um período em Seropédica (onde se localiza a UFRRJ), o CPDA adentra o período de democratização legitimando novos temas e ampliando parcerias com agências multilaterais e organismos governamentais. Nessa fase de consolidação acadêmica, a interdisciplinaridade se desdobra num diálogo crescente com a sociedade. “Não para ditar verdades, mas para aprender com o diálogo. Esse é o legado dessa trajetória, que aponta para a perpetuação do programa através da interação com outros centros acadêmicos, os movimentos sociais, as organizações não-governamentais e a sociedade civil em geral”, finalizou Delgado.

Parcerias
Um exemplo da validade dessas parcerias foi ilustrado por Aurélio Viana, diretor da Fundação Ford. Preparando-se para sua fala na sessão de abertura, Vianna afirmou que o apoio dado ao CPDA no início da década de 1980 marcou uma virada na forma de atuação da instituição que representa. “Atuando no Brasil desde 1962, até o final dos anos 70 a Fundação Ford apoiava projetos voltados para a ‘Revolução Verde’, que enfatizavam o aumento de produtividade no campo. Com a doação ao CPDA, para o PIPSA [Projeto de Intercâmbio de Pesquisa Social em Agricultura], mudamos de portfolio, reorientando uma série de investimentos. Isso mostra o quanto vocês são importantes para a nossa história”, agradeceu o diretor.

Parceiro mais recente, Caio França, então coordenador geral do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural (NEAD), também destacou a importância e a influência do CPDA sobre a entidade que representa, ligada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). “O centro é um padrão de referências para nós, devido ao papel que tem tido na formação de pessoas que cultivam uma tradição plural de pensamentos críticos sobre a questão agrária, o que vem propiciando a incorporação pelo Estado dos direitos das comunidades tradicionais e dos movimentos sociais. O CPDA, com essa postura militante, formula uma agenda política de renovação do pensamento democrático e, por conseqüência, contribui para a renovação das políticas públicas direcionadas para a área rural. Por tudo isso, é motivo de orgulho para todos os seus parceiros”.

Parabéns a todos que participaram desta bela história!

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