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Peste Suína: Francisco Turra, presidente da ABPA, projeta ganhos para a carne brasileira

“A competição com o mercado internacional deverá elevar o preço interno do produto”


Foto: Pixabay

Peste Suína Africana (PSA). Esta palavra domina o assunto do mercado internacional de carne suína nos últimos meses. O surto na China já levou ao abate de 3,338 milhões de suínos, de acordo com a FAO.  Até 30 de maio havia notificação de 504 mil suínos, o que demonstra o agravamento da doença. A China possuía o maior rebanho do mundo, com participação de 51% no mercado ou 54 milhões de toneladas por ano.

O que é a PSA?

A Peste Suína Africana (PSA) é uma doença altamente contagiosa, causada por um vírus composto por DNA fita dupla, pertencente à família Asfarviridae. A doença não acomete o homem, sendo exclusiva para suínos domésticos, javalis e cruzamentos com suínos domésticos.

Os sintomas iniciais da enfermidade baseiam-se principalmente na observação dos sinais clínicos de doença hemorrágica. Porém, o uso de técnicas laboratoriais, como as moleculares, são imprescindíveis para a confirmação do diagnóstico.  Ela se espalha por vias orais ou nasais de disseminação e exposição e também pode ocorrer a contaminação por picada de carrapato, escarificação cutânea, injeção intramuscular, subcutânea, intraperitoneal ou intravenosa.

É uma doença de notificação obrigatória aos órgãos oficiais nacionais e internacionais de controle de saúde animal, com potencial para rápida disseminação e com significativas consequências socioeconômicas, calculadas em cerca de 5,5 bilhões de dólares apenas no Brasil. Entre os problemas que causa no suíno estão lesões no baço, linfonodos, rins e coração. Na presença de um surto, os animais são abatidos e as carcaças destruídas. É igualmente essencial uma completa limpeza e desinfeção das instalações. As instalações não devem receber novos animais pelo menos durante 40 dias. 

Ainda não existe vacina contra a doença. A China informou que já realiza testes para uma vacina e que vai acelerar o progresso de um piloto e promover testes clínicos. O processo está sendo conduzido pelo Instituto de Pesquisa Veterinária de Harbin.

A única forma de prevenção da doença é impedir que o rebanho se torne positivo, sendo assim, um programa de biossegurança deve ser bem estabelecido e aplicado nas granjas.

Entenda o histórico de avanço da PSA

Na China os primeiros casos apareceram em agosto de 2018 mas o vírus da doença é antigo. A PSA surgiu na África, em animais silvestres no Leste e no Sul do Continente, no século XX. Em 1920 suínos domésticos do Quênia registraram a doença. No final da década de 50 chegou a Portugal por meio de restos de alimentos em aeronaves com derivados contaminados. A partir daí se espalhou por outros países da Europa como Espanha, Itália, França, Holanda, Bélgica e Malta e para a América do Sul e Caribe. No Brasil, o vírus foi identificado em suínos de subsistência, em Paracambi, no Rio de Janeiro, em 1978.

A PSA foi erradicada em todos esses países, inclusive do Brasil, que é considerado livre. 

A província chinesa de Liaoning registrou o primeiro caso e aumentou as inspeções em fazendas de porcos e mercados, reforçando o monitoramento do transporte. O governo provincial também aumentou a fiscalização e ordenou o fechamento do mercado vivo e matadouros. A China abateu cerca de 913 suínos perto de Shenyang, capital de Liaoning, e proibiu o transporte de porcos das áreas afetadas, após o surto.

Um segundo caso foi relatado em um matadouro de uma empresa alimentícia na região de Zhengzhou, província de Henan. O governo intensificou o controle nas regiões. 

No terceiro surto da doença no país 88 suínos morreram na cidade de Lianyungang. Medidas de emergência, incluindo abate e desinfecção de animais, colocaram o surto no distrito de Haizhou.

Casos passaram a ser relatados na Romênia, onde cerca de 100 mil porcos foram abatidos. Na Bulgária os testes confirmaram a PSA nos porcos e, como precaução, todos os 23 animais foram abatidos. Na Bélgica autoridades encontraram quatro javalis infectados. 

Em toda a Europa, mais de 4.800 casos da doença em suínos selvagens e domésticos foram reportados este ano, cerca de 700 a mais do que em 2017.

No Japão foram suspensas as exportações de carne de porco e javali. Também há casos nos países bálticos - Estónia, Letónia e Lituânia. 

No Brasil o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) determinou no final de setembro de 2018 o reforço na fiscalização da vigilância nos portos, aeroportos e fronteiras para diminuir os riscos do ingresso no Brasil da Peste Suína Africana (PSA). Os órgãos de vigilância e inspeção animal aumentaram a fiscalização sobre alimentos e bagagens, provenientes das áreas afetadas pela PSA. Também foi intensificado o cuidado nas emissões de autorização de importação de produtos como rações de animais que possam disseminar o vírus da doença. 

Carne suína: Brasil pode ganhar com os casos de PSA

Criadores são unânimes em lamentar os casos que levaram a prejuízos para a China mas também observam que a carne brasileira pode entrar nesse mercado. As exportações de carne suína brasileira para a China cresceram 41% em maio, com 67,2 mil toneladas embarcadas, conforme a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). Em receita foram US$ 143,8 milhões, alta de 54,6% em relação ao mesmo período do ano passado. A China comprou 21,1 mil toneladas em maio, o equivalente a 31,9% do total de embarques. 

O Vietnã, outro mercado em que foram encontrados focos de peste suína, aumentou as compras de carne de porco do Brasil em 7.000% em maio, saltando de 26 toneladas há um ano para 1,82 mil toneladas.

Em entrevista ao Portal Agrolink, o presidente da ABPA, Francisco Turra, analisa este cenário. Confira a entrevista:

Portal Agrolink: Qual a atual situação da produção de proteína animal brasileira em relação a custos de produção e potencial de expandir mais? 
Francisco Turra:
O quadro do ano começou favorável ao setor produtivo, com boa oferta de milho e de soja, em cenário bastante rentável.  A guerra comercial entre China e EUA e as dificuldades enfrentadas pelos norte-americanos para o plantio (com as fortes chuvas) aumentaram a pressão sobre a oferta dos insumos, incrementando os custos de produção.  O impacto sobre o setor, entretanto, não foi suficiente para impactar drasticamente a capacidade competitiva.
 
Portal Agrolink: com a Peste Suína Africana na China os produtores brasileiros podem aumentar as vendas externas? Já tem alguma política trabalhando nesse sentido? Isso não pode encarecer o preço no mercado interno?
Francisco Turra:
a elevação das exportações de carne suína já é uma realidade.  Projeções do Rabobank indicam perdas de até 18 milhões de toneladas de carne suína, em um universo de 54 milhões de toneladas produzidas pelo país.  No mundo todo, são produzidas 113 milhões de toneladas de carne suína. O trade internacional total equivale a menos de 9 milhões de toneladas. Além disso, a Peste Suína Africana está também em outros 15 países na Ásia e em outros continentes. Este quadro indica um cenário altamente favorável ao comércio de carne suína, como também para carne de aves – imediato substituto diante da falta de produtos. Neste contexto, o volume exportado de carne suína para o mercado chinês aumentou 61% em abril, de 9,8 mil toneladas em 2019 para 15,9 mil toneladas no quarto mês deste ano. 

Frente a esta janela de oportunidade aberta para o setor produtivo brasileiro, tanto a ABPA quanto o Ministério da Agricultura estão empenhados em ampliar a capacidade de exportações do Brasil para o mercado chinês.  No início de maio, a Ministra Tereza Cristina liderou uma das mais efetivas missões já realizadas para o mercado da Ásia.  Bons frutos deverão surgir da ação, há grande expectativa. 
 
Fatalmente, a competição com o mercado internacional deverá elevar o preço interno do produto.  Será uma importante recuperação, após um período de preços relativamente baixos.

Portal Agrolink: em relação à sanidade temos granjas com questões rigorosas tanto em suínos quanto aves. Da mesma forma laboratórios do MAPA fazem o controle diário que apontou fraudes como a carne fraca, leite e queijo compensado. Como a associação observa esta questão? Brasil está bem neste quesito? 
Francisco Turra:
as ocorrências na Operação Carne Fraca foram pontuais, não generalizadas, e não se referem a estes critérios específicos.  Nossa estrutura de defesa sanitária é sólida, uma das melhores do mundo.  O reconhecimento de novos estados como livres de aftosa sem vacinação será um grande avanço para as exportações do setor, já que países como Japão e Coreia do Sul apenas importam produtos de Santa Catarina, que possui este status.

Portal Agrolink: os casos de Peste Suína Clássica, mesmo isolados lá no Nordeste, preocupam o setor de alguma forma?
Francisco Turra:
importante salientar que a ocorrência se deu em "área não-livre" e a área livre de peste suína clássica declarada  junto à OIE e controlada pelo Brasil, continua intacta e preservada na sua sanidade. O MAPA e as agências de defesa dos estados afetados estão empenhados para controlar o quadro sanitário.  Obviamente, qualquer situação sanitária gera preocupações, mas estamos confiantes na competência da execução das medidas implementadas pelos órgãos de defesa.
 
Portal Agrolink: a gente fala muito em agricultura 4.0 é mais recentemente em avicultura 4.0. Como ficam os pequenos produtores nesse esquema? 
 Francisco Turra:
o pequeno produtor é a base do sistema avícola brasileiro, especialmente na Região Sul, onde está mais de 70% das exportações nacionais.  Embora considerado pequeno, o avicultor de menor porte investe e acompanha as novas tecnologias para ganhar em produtividade, enxergando a rentabilidade e a otimização de custos.
 
Portal Agrolink: mesmo não sendo da alçada da ABPA mas muitos produtores de caprinos e ovinos estão apostando no potencial da carne ainda pouco explorado. Como isso pode ser trabalhado e gerar renda e alternativas para os produtores de aves e suínos?
Francisco Turra:
é fato que há um grande potencial para a ovinocultura e caprinocultura do Brasil.  Embora tenha melhorado nos últimos anos, a capilaridade de consumo ainda é restrita aos grandes centros. E o abastecimento interno ainda é forte dependente das importações, especialmente do Uruguai.  São produtos com excelente capacidade de agregação de valor.  Uma das vias para alterar positivamente este quadro seria a realização de ações junto aos consumidores, para ampliar o interesse sobre esta proteínas.  Existem iniciativas modelos no Brasil que servem de referência.  O consumidor precisa adquirir o hábito, e isto se dará essencialmente pela promoção do produto.

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