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Sistema informatizado é novo aliado dos produtores no manejo do míldio

Software emite alertas diários aos usuários, customizados de acordo com a propriedade


Foto: Marcel Oliveira

A Embrapa Uva e Vinho (RS), a Cooperativa Vinícola Aurora e a startup Jahde Tecnologia desenvolveram um sistema informatizado para auxiliar os produtores de uva a prevenir os danos causados pelo míldio da videira, uma das piores doenças da cultura no País.

Denominado Crops – Módulo Míldio da Videira, o software emite alertas diários aos usuários, customizados de acordo com a propriedade, cultivares de uva e condições climáticas. Lançado comercialmente em dezembro de 2021, é o primeiro licenciamento comercial de software da Embrapa Uva e Vinho e já superou as expectativas iniciais: além da Serra Gaúcha, também está sendo utilizado na Campanha Gaúcha e no estado do Paraná, atendendo 70 viticultores que compartilham 41 estações de aviso.

Causado pelo patógeno Plasmopara viticola, o míldio da videira ocorre principalmente em regiões de alta umidade e temperatura amena, como a Serra Gaúcha, podendo afetar a planta de forma intensa. Em condições climáticas favoráveis, a doença pode ocasionar perdas de até 75% da produção. “O receio de prejudicar a produtividade pelos danos causados pelo míldio tornou a aplicação por calendário de fungicidas uma rotina nos parreirais”, afirma o pesquisador da Embrapa Uva e Vinho Lucas Garrido que coordenou os trabalhos de pesquisa para o desenvolvimento da tecnologia. Contudo, isso acarreta aplicações desnecessárias em anos secos e coberturas desuniformes em anos chuvosos.

Entre os benefícios do sistema, o pesquisador destaca o grande potencial de economia de recursos com insumos e de mão de obra, além da menor exposição dos aplicadores minimizando o impacto negativo na saúde dos trabalhadores, consumidores e meio ambiente. “Com o monitoramento automático e sistemas inteligentes, como o Crops, a viticultura pode reduzir o uso de agroquímicos, principalmente em anos secos, melhorar a sustentabilidade dos vinhedos e diminuir o custo de produção, dando segurança sobre o momento certo para o produtor fazer o manejo fitossanitário”, complementa. 

O sistema foi desenvolvido inicialmente para atender a uma demanda da Cooperativa Vinícola Aurora, principal cooperativa da América Latina que reúne mais de 1,1 mil famílias associadas. Maurício Bonafé, engenheiro agrônomo e coordenador agrícola da Cooperativa, acompanhou com a equipe técnica o processo de desenvolvimento e validação do sistema. Ele relata que a gestão da cooperativa identificou o uso rotineiro de sistemas semelhantes na Itália. Isso teria gerado uma demanda para desenvolvimento de uma tecnologia local, pois tentativas anteriores de introdução de sistemas importados foram falhos seja pela não adequação dos modelos de previsão ou dificuldades com a instalação e manutenção dos equipamentos.

“Com base nessa realidade, procuramos a Embrapa e conjuntamente identificamos uma startup para desenvolver um modelo similar em território nacional. Hoje estamos muito satisfeitos com os resultados e cada vez mais incentivamos os nossos associados a utilizar a tecnologia”, pontua.

Entre os benefícios percebidos ao longo dos três anos de validação do sistema, Bonafé destaca a importância de ter mais ferramentas para tomada de decisão no momento da aplicação, tornando o processo de aplicação de fungicidas mais assertivo e trazendo economia ao associado. “Essa ferramenta faz com que consigamos medir as principais influências climáticas para desenvolvimento do míldio, fazendo com que tenhamos base de dados para indicar uma aplicação de fungicida não sendo mais necessário calendarizar o processo”, complementa.

Para Adeliano Cargnin, chefe-geral da Embrapa Uva e Vinho, o desenvolvimento de novos sistemas que auxiliem os produtores na tomada de decisão sobre manejo de doenças de forma rotineira propriedade estarão cada vez mais presentes na agenda de pesquisa e inovação da Unidade. “Estamos investindo e apoiando tecnologias que facilitem a vida dos produtores e garantam a maior rentabilidade possível, minimizando despesas e garantindo a produção”, pontua.

Ele destaca a importante parceria com a empresa Jahde Tecnologia, uma startup liderada por Haroldo Tonetto, que trabalhou em conjunto com o pesquisador Lucas Garrido e com o apoio técnico da Cooperativa Aurora, para validar e viabilizar o Sistema Crops. “A Embrapa está aberta a parcerias com a iniciativa privada para oferecer as melhores oportunidades ao setor produtivo. Muitas vezes temos a visão técnica e a tecnologia em estado embrionário ou com reduzido nível de maturidade em desenvolvimento mas precisamos da agilidade e do apoio tecnológico do setor privado para dar continuidade ao desenvolvimento”, reforça Cargnin.

Para Ricardo Fonseca Araújo, Coordenador de Inovação Digital da Secretaria de Inovação e Negócios da Embrapa, o Crops é um importante ativo por ser o primeiro licenciamento comercial de software da Embrapa Uva e Vinho, formato no qual a inteligência da Embrapa foi embarcada. Isso exigiu estudo detalhado para definir um modelo de negócios adequado às características da solução desenvolvida. “O modelo foi estruturado de forma a maximizar os recebíveis e com adoção de cláusulas de performance, com maior retorno para Embrapa”, destaca.

Sistema utiliza inteligência artificial para otimizar controle da doença

O Módulo Míldio da Videira faz parte do Crops - Sistema de Monitoramento de Doenças, desenvolvido pela Jahde Tecnologia para auxiliar os produtores no manejo de enfermidades e na gestão mais sustentável da produção de uvas, com foco inicial nas vitis labrusca (grupo de espécie de uvas mais rústicas, como Isabel e Niágara), mas que já contempla as vitis vinífera (variedades como Merlot, Tannat e Chardonnay).

No caso do míldio, o sistema se baseia nas condições climáticas, biologia do patógeno, no tipo de fungicida disponível e a resistência do cultivar plantado para determinar a época ideal de controle, além de estabelecer a quantidade e frequência de pulverizações. O sistema também prevê o período de controle residual, conforme o fungicida aplicado e o nível de resistência da cultivar, que inicialmente. Para isso, é usado um algoritmo, desenvolvido pela Jahde Tecnologia, de análise e interpretação do modelo de prognóstico de doenças desenvolvido pela Embrapa. “O algoritmo está inserido em um sistema maior, que solicita, organiza, guarda e faz tratamento de dados de estações meteorológicas, cruzando diariamente as informações oriundas dessas estações com o modelo de prognóstico”, explica Haroldo Tonetto, proprietário da Jahde Tecnologia.

Ele complementa que os dados das estações meteorológicas são coletados de 30 em 30 minutos, contendo a média da temperatura interna do parreiral, precipitação e a umidade foliar, fatores relevantes para a evolução da doença na cultura da uva, que são informados no Crops.

O sistema foi validado desde 2018, totalizando três safras. No primeiro ano apenas a cultivar de uva Isabel foi monitorada, e já nos anos seguintes, outras cultivares americanas, híbridas e europeias foram incorporadas. “Não houve nenhum dano ou perda em relação a vinhedos manejados convencionalmente, mas sim um ganho com a economia em aplicação de produtos, pois com o Crops foram realizadas menos aplicações, reduzindo para dois a quatro tratamentos”, complementa Tonetto.

O sistema é também alimentado pelos dados inseridos pelo usuário-assinante sobre as aplicações de defensivos agrícolas feitas na cultura, que servem como base para o cálculo, ao gerarem uma proteção contra a doença, descrita em dias. O sistema recebe essa informação, adiciona ao banco de dados uma data, a qual será contabilizada como inicial para o cruzamento dos dados e emissão do sistema de alerta. O algoritmo de modelagem, ao considerar o índice de chuvas do local associado à temperatura, ajusta o período de proteção do tratamento, informando a necessidade de nova intervenção ou não.

Assinatura é anual e contempla kit de tecnologias

Essas informações são disponibilizadas em um site na internet e exibidas em um aplicativo de celular para os assinantes do sistema, que podem tomar decisões sobre a aplicação dos defensivos no parreiral em momento adequado.

A assinatura do sistema é anual e contempla um kit de equipamento (disponibilizado em consignação), com estação meteorológica e painel solar, que pode cobrir uma área de até 30 hectares, atendendo até quatro produtores (contratos individuais), em áreas com a mesma exposição solar e de altitude similar. A área de monitoramento coberta necessita ser ajustada de acordo com as condições de cada propriedade A contratação inclui a instalação de uma estação meteorológica com sensor, mensagens diárias e manutenção do sistema. Os equipamentos são disponibilizados aos produtores de forma consignada.

Desenvolvido inicialmente para a Serra Gaúcha, o Crops já foi ajustado para executar a previsão nas localidades com assinantes, como a Campanha Gaúcha e o estado do Paraná. A equipe também já está construindo novos modelos que serão validados na próxima safra para monitorar outras doenças da videira com foco inicial na Glomerella, também conhecida como podridão-da-uva-madura, e no Oídio, contribuindo assim para a ampliar a sustentabilidade da vitivinicultura brasileira.

 

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