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Negociações internacionais e abertura de mercados agropecuários


Dante Scolari

O comércio internacional do agronegócio os últimos anos tem assumido papel relevante, com a conquista de novos e importantes mercados tanto nos países tradicionalmente importadores de produtos brasileiros e como também em países emergentes. Uma parte substancial destes mercados foi conseguida a partir do crescimento da demanda, em função do aumento da renda em vários países e de problemas de produção e comercialização em países tradicionalmente ofertadores de produtos agropecuários no mercado internacional.

Somente nos anos recentes tem havido uma maior agressividade por parte dos exportadores brasileiros na conquista e manutenção de novos mercados de produtos do agronegócio. O Brasil participa de negociações internacionais em foros multilateral (OMC), regional (ALCA) e bilateral (UE-Mercosul). A maioria dos acordos comerciais do Brasil é bilateral, envolve países da América Latina e foram firmados a partir do Tratado de Montevidéu, de 12 de agosto de 1980, que criou a ALADI (Associação Latino Americana de Integração) que substituiu a ALALC (Associação Latino Americana de Livre Comércio), com objetivos de criar um mercado comum latino-americano. A ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) ainda está longe de se tornar uma realidade.

A partir da chamada Rodada Uruguai, concluída em 1994 com a criação da OMC, quando foi assinado o Acordo Agrícola e introduzidas regras e medidas disciplinadoras do comércio agrícola mundial, visando reduzir as distorções existentes, a agricultura passou a ser negociada em um contexto multilateral. Mas os subsídios ao invés serem reduzidos foram aumentados de 305 bilhões de dólares no período 1986/1988, para 345 bilhões de dólares no período 200/2004. Como a cláusula da paz já expirou os subsídios concedidos podem ser contestados na OMC – foi o que o Brasil fez ao contestar os subsídios dados pela Europa ao açúcar e aqueles dados pelos Estados Unidos ao algodão. Neste caso, os custos da contestação do algodão foram bancados pela iniciativa privada.

O Brasil tem muito a ganhar com a liberalização comercial agrícola e com o acesso a mercados nos Estados Unidos e na União Européia, uma vez que grande parte das exportações destina-se a estes países, cujos mercados são muito protegidos. Algumas estimativas sinalizam ganhos adicionais da ordem de mais de US$ 2,0 bilhões anuais caso o país tivesse acesso a estes mercados e os apoios domésticos fossem parcialmente reduzidos. Mas, o país enfrenta muitas dificuldades para acessar estes mercados: a existência de tarifas elevadas (açúcar, carnes, suco de laranja, fumo); o uso de escaladas tarifárias conforme o grau de processamento dos produtos (soja, alimentos processados e café); regimes de importações discriminatórios, com esquemas de preferências para certos países (açúcar, carne bovina e algodão); medidas não tarifárias de caráter sanitário e fitossanitário (carnes). Para obter sucesso nas negociações comerciais o país precisa ter uma postura coerente, agressiva, profissional, ousada e claramente definida.

Só recentemente o país conseguiu definir prioridades e determinar recomendações aos negociadores brasileiros nos fóruns internacionais, principalmente nas negociações da OMC. A posição brasileira pode ser resumida em três grandes questões: acesso a mercados (pressupõe a redução das quotas estabelecidas pelos países importadores para uma série de produtos importantes da nossa pauta de exportação); redução e eliminação dos subsídios a exportação de produtos agropecuários atualmente existentes nos Estados Unidos, Comunidade Européia e Japão; redução e eliminação dos apoios domésticos praticados pelos países mais desenvolvidos (vários casos: algodão nos EEUU, lácteos e açúcar na Europa, arroz no Japão, etc.).

A rigor, os negociadores oficiais do governo brasileiro não estão devidamente preparados para discutir acordos comerciais para o agronegócio. O governo federal não possui equipes preparadas e com conhecimento suficiente em número e quantidade para atender todas as demandas atuais e potenciais de interesse para o país. Ao longo dos anos, a base da diplomacia brasileira não priorizou a questão comercial da agricultura e o Ministério das Relações Exteriores ainda não foi capaz de criar e consolidar um quadro técnico de adidos comerciais agrícolas nos principais mercados para os produtos agrícolas brasileiros. Praticamente não existe representação oficial comercial do Brasil nos principais países emergentes, grandes compradores de produtos agrícolas nacionais. Nestes mercados, as negociações tem sido realizadas pela iniciativa privada, com pouco apoio do governo. Os principais produtos agropecuários exportados nos últimos anos são carnes (bovina, suína e aves), soja e derivados (óleo e torta), açúcar, café, suco de laranja e fumo.

Na área privada, os esforços desenvolvidos ajudaram o país a conquistar novos mercados, principalmente de carnes. Mas em 2005 e 2006 muitos mercados proibiram a importação de carnes brasileiras devido a problemas sanitários nos rebanhos, que ocorreram por absoluta falta de fiscalização do governo federal.

O número de negociadores qualificados, multidisciplinares e especializados em diferentes mercados ainda é muito limitado. Somente nos últimos anos surgiram no país cursos superiores orientados para a formação de profissionais de comercio exterior. È uma área onde existe muita defasagem profissional e grandes oportunidades de crescimento para o país. A posição oficial do governo deveria ser orientada para fazer negócios e aumentar as relações de trocas com todos os países clientes interessados em comprar produtos brasileiros. No comércio não pode prevalecer posições partidárias de natureza ideológica – o que interessa é vender produtos nacionais para os consumidores de todo o mundo. Uma posição mais adequada para o país seria a busca de solução das controvérsias através de negociações em vários fóruns, com ênfase em negociações bilaterais e negociando-se também caso a caso, produto a produto. Esta estratégia com certeza aumentaria as chances de se conquistar e manter maiores parcelas no mercado internacional de bens e serviços agropecuários, gerando mais emprego e mais renda para o país. O setor agropecuário brasileiro pode ser muito competitivo na produção e exportação de muitos produtos, conquistando e mantendo também nichos diferenciados de mercado em vários países. Mas, como país, precisamos ter mentalidade de comerciantes vendedores, colocando "o pé na estrada" buscando novos clientes e novos mercados. Não existe mais tempo nem espaço comercial para ficar esperando aparecer compradores. A diplomacia brasileira deve rapidamente incorporar essa mentalidade comercial e estabelecer, conjuntamente com a iniciativa privada, uma estratégia de busca e conquista de novos mercados !



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