Gripe aviária: Juarez Morbini esclarece riscos, mutações do vírus e prevenção em granjas
Brasil confirma primeiro caso de gripe aviária em granja comercial

O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) confirmou, na quinta-feira (15), o primeiro caso de influenza aviária de alta patogenicidade (H5N1) em uma granja comercial no Brasil. A detecção ocorreu em um matrizeiro no município de Montenegro, no Rio Grande do Sul. Embora o vírus já circule globalmente desde 2006, principalmente na Ásia, África e Europa, esta é a primeira vez que atinge a avicultura industrial brasileira. A confirmação mobilizou técnicos, produtores e especialistas em sanidade animal. Em entrevista ao Portal Agrolink, o engenheiro agrônomo Juarez Morbini comenta detalhes técnicos sobre o vírus, o cenário epidemiológico e os cuidados que a população deve adotar a partir de agora.
“Vírus não respeita fronteiras”
Segundo Morbini, a entrada do H5N1 no país era uma questão de tempo, mesmo diante da excelência do sistema de defesa sanitária brasileiro. “Nós estivemos livres da influenza aviária por muito tempo, mas esse vírus já apresenta casos no mundo todo desde 2016. Não vivemos numa bolha. Somos suscetíveis às migrações de aves silvestres, que podem estar contaminadas e, ao interagir com aves domésticas de fundo de quintal, transmitir o vírus”, alerta.
O especialista reforça que, independentemente das barreiras sanitárias, os vírus evoluem e se adaptam. “Não há como garantir que um vírus nunca vá atingir nosso plantel. Eles se propagam independentemente de fronteiras ou cuidados. A única forma de impedir seria se vivêssemos em total isolamento, o que não é possível.”
Entenda o H5N1
A influenza aviária H5N1 é composta por duas proteínas: a hemaglutinina (H) e a neuraminidase (N), que sofrem mutações constantes. “Essas proteínas dão nome ao vírus. Temos, por exemplo, o H1N1, H1N2, agora o H5N1. Quando há bloqueio da atividade viral, ele tende a sofrer mutações nessas proteínas e se torna novamente um agente patogênico”, explica Morbini.
O engenheiro agrônomo destaca que novas cepas podem surgir a qualquer momento, e o Brasil deve estar preparado. “Outras influenzas ainda vão surgir. Esse ciclo de infecção se repete: onde houve contaminação anterior, pode haver uma nova mutação, e o vírus volta com força. Tivemos um longo período de proteção, mas agora chegou a nossa vez.”
Montenegro: foco isolado
O caso registrado em Montenegro foi rapidamente identificado pelas autoridades. “Ainda não temos informações sobre a quantidade de aves nem sobre a granja exata, pois o Ministério não divulga esses dados neste momento. Mas o corpo técnico já esteve no local, identificou o foco e implantou um raio de proteção de 10 quilômetros”, informa Morbini.
Segundo o protocolo do Plano Nacional de Contingência, todas as aves remanescentes no foco devem ser eliminadas, e as instalações, desinfetadas. “Esse processo deve durar pelo menos 90 dias. Só após esse período, e na ausência de novos surtos, será possível retomar a produção nas granjas afetadas”, completa.
Carne de frango e ovos continuam seguros para consumo
Uma das principais preocupações da população é o risco de contaminação por meio da carne de frango ou ovos. Morbini é enfático: “O consumo de carne de aves e de ovos é totalmente seguro. Mesmo que a ave estivesse contaminada, a ingestão não transmite o H5N1 para o ser humano. A população pode ficar tranquila.”
O Ministério da Agricultura reforça que o risco de infecção humana é extremamente baixo e limitado a profissionais que mantêm contato direto com aves infectadas. Não há registro de transmissão por alimentos no Brasil.
Alerta à população: não toque em aves mortas
Um ponto importante, segundo Morbini, é a conscientização da população para casos suspeitos em aves silvestres ou de fundo de quintal. “Se alguém encontrar uma ave morta, com sintomas respiratórios, nervosos ou de descoordenação, a orientação é clara: não toque no animal e acione imediatamente o Ministério da Agricultura.”
Caso seja necessário manipular a ave, os cuidados devem ser rigorosos. “Use luvas, coloque o animal em saco plástico hermético e feche bem. Depois, chame os serviços veterinários oficiais para recolhimento e análise. É fundamental lavar bem as mãos e roupas utilizadas nesse contato, pois o vírus pode se propagar por meio de superfícies ou tecidos.”
Morbini alerta ainda sobre práticas inadequadas que devem ser evitadas. “Não se deve enterrar, queimar ou descartar a ave no lixo. A conduta correta é comunicar as autoridades sanitárias, que vão recolher a amostra e tomar as medidas necessárias.”
Vacinas em teste: esperança para o setor avícola
Apesar da gravidade do momento, Morbini destaca que há avanços no combate à doença. “Já estão sendo desenvolvidas vacinas contra o H5N1, e isso traz esperança. Com uma vacina eficaz, poderemos voltar a ter uma produção livre do vírus, ao menos temporariamente.”
O especialista ressalta, no entanto, que mesmo com vacinas, o monitoramento sanitário deve ser contínuo. “O vírus continuará sofrendo mutações. Teremos novos desafios pela frente. Precisamos manter a vigilância e a responsabilidade coletiva.”
Defesa sanitária brasileira é exemplo mundial
A rápida resposta ao caso de Montenegro comprova a solidez do sistema sanitário brasileiro. Desde os anos 2000, o país tem adotado uma série de medidas preventivas que conseguiram manter a avicultura nacional livre da influenza aviária por quase duas décadas.
“As ações de vigilância de aves silvestres, monitoramento de granjas, capacitação de técnicos e fiscalização em pontos de entrada de animais foram cruciais”, destacou o Ministério da Agricultura em nota oficial. Essas estratégias permitiram não apenas retardar a entrada do vírus, mas também minimizar os impactos com uma ação coordenada e técnica diante do primeiro foco confirmado.
A notificação foi enviada à Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) e a parceiros comerciais, garantindo a transparência do país nas ações de sanidade animal.