Como aproveitar os benefícios “anti-tarifas”?
As medidas alcançam dois grandes grupos

O aumento das tarifas impostas pelos Estados Unidos às exportações brasileiras trouxe impactos significativos para diversos setores, levando o governo a adotar medidas emergenciais de apoio às empresas. Para esclarecer os pontos centrais desse plano, o advogado Marcelo Diniz Barbosa, sócio-coordenador da Andersen Ballão Advocacia, explicou quem pode ser beneficiado, quais os requisitos para acesso, os cuidados fiscais necessários e os reflexos esperados tanto nas cadeias produtivas internas quanto na competitividade internacional do Brasil.
1. Quais empresas se enquadram nas medidas?
As medidas alcançam dois grandes grupos:
1. Exportadores brasileiros de bens e serviços que vendem para os Estados Unidos e foram diretamente prejudicados pelas tarifas adicionais aplicadas pelo governo norte-americano.
2. Fornecedores diretos desses exportadores, mesmo que não exportem, mas que forneçam insumos, peças, embalagens ou serviços usados na produção dos bens exportados.
Também há regras específicas para:
• Empresas com drawback (regime aduaneiro especial que suspende tributos sobre insumos importados para exportação), incluindo fabricantes de produtos intermediários.
• Produtores de gêneros alimentícios perecíveis que deixaram de ser exportados e poderão vender ao governo em compras emergenciais.
2. Como seria possível acessar os benefícios anunciados?
Dependerá do tipo de medida:
• Linhas de financiamento com juros reduzidos (via FGE, BNDES e PEAC-FGI Solidário):
Será preciso comprovar enquadramento no público-alvo, assinar contrato com cláusula de manutenção ou ampliação de empregos e seguir os critérios que ainda serão definidos em portarias do Ministério da Fazenda e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
• Prorrogação do drawback:
O exportador deve pedir a extensão do prazo à Secretaria de Comércio Exterior (SECEX), apresentando documentos que provem que os compromissos de exportação para os EUA foram afetados pelas tarifas.
• Prioridade na restituição de créditos tributários e diferimento de tributos:
Só poderão ser solicitados quando for publicada a regulamentação específica do Ministério da Fazenda.
• Compras públicas emergenciais de alimentos:
Produtores e empresas poderão se habilitar para vender ao governo federal e a governos estaduais e municipais, seguindo requisitos que serão definidos em ato conjunto do Ministério da Agricultura e do Ministério do Desenvolvimento Agrário.
O aumento do REINTEGRA para 6% (micro e pequenas empresas) e 3% (demais empresas) não está no texto da MP. Trata-se de medida anunciada pelo governo que precisa ser regulamentada por decreto presidencial alterando o Decreto nº 8.415/2015.
Até o momento não houve publicação desse decreto, e ainda se aguarda definição sobre o alcance do benefício: se valerá para todos os exportadores ou apenas para aqueles que comprovem vendas para os Estados Unidos.
3. Quais cuidados fiscais devem ser observados para garantir conformidade com a Receita Federal?
• Documentar tudo: contratos de exportação, notas fiscais, registros de embarque, comprovação de impacto das tarifas e, no caso de drawback, intenção comercial e contratos preexistentes.
• Cumprir contrapartidas: quem receber crédito subsidiado deverá manter ou ampliar empregos. O descumprimento implica perda do benefício da taxa de juros.
• Respeitar prazos: benefícios como drawback e diferimento têm datas e condições específicas — atrasos ou uso indevido podem gerar autuações.
• Acompanhar regulamentações: algumas medidas só terão efeito prático depois de portarias e decretos complementares.
4. Quais são os efeitos práticos do plano para a competitividade dos produtos brasileiros?
• Redução de custos: indiretamente menos carga tributária sobre insumos (mais prazo drawback, evitando pagamento de tributos suspensos), devolução maior de créditos (REINTEGRA quando regulamentado) e financiamento barato ajudam a segurar ou reduzir preços de exportação.
• Proteção da produção: evita que empresas parem linhas de produção ou demitam em massa.
• Abertura de mercados: com menos pressão financeira, exportadores podem buscar novos clientes fora dos EUA, diversificando destinos.
• Mitigação de perdas imediatas: compras públicas impedem que alimentos perecíveis sejam descartados, garantindo receita a produtores.
5. Que reflexos tributários nas cadeias produtivas e nos mercados internacionais podem ocorrer?
Nas cadeias produtivas internas:
• O incentivo dado ao exportador final se espalha para seus fornecedores — empresas que produzem peças, embalagens, serviços de logística ou insumos industriais tendem a manter ou até ampliar sua produção, porque o cliente exportador continuará comprando.
• No caso do drawback, o exportador tem mais prazo para cumprir metas sem recolher tributos sobre insumos importados, o que indiretamente pode incrementar a demanda por insumos nacionais complementares.
Nos mercados internacionais:
• O custo menor ajuda a manter a competitividade dos produtos brasileiros mesmo com as tarifas dos EUA.
• Pode facilitar a abertura de novos mercados, especialmente em blocos como BRICS, onde o Brasil busca acordos comerciais.
• Existe o risco de outros países questionarem esses incentivos na Organização Mundial do Comércio (OMC) se entenderem que funcionam como subsídios incompatíveis com as regras internacionais.