Tributação das LCAs é “um tiro no pé”, diz Ivan Wedekin, ex-secretário de Política Agrícola
Tributação das LCAs pode comprometer o crédito rural

A proposta do governo federal de aplicar uma alíquota de 5% de Imposto de Renda sobre os rendimentos das Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) acendeu um sinal de alerta entre especialistas do setor. Um deles é Ivan Wedekin, ex-secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, com atuação no mercado financeiro — com passagens como diretor da BM&FBovespa, CEO da Bolsa Brasileira de Mercadorias e consultor de empresas. Para ele, a medida é contraditória, ameaça a atratividade desses papéis e pode ter reflexos diretos sobre a oferta de crédito para o agro.
“Essa proposta é um tiro no pé, porque ela é contraditória. Em maio, o próprio governo aumentou a exigência para os bancos investirem em LCAs. Agora, vem com essa ideia de tributar, pressionado pelo descontrole fiscal. Isso afeta uma das maiores indústrias do país”, avaliou Wedekin em entrevista ao Portal Agrolink.
Criadas em 2004, durante a gestão de Wedekin à frente da Secretaria de Política Agrícola, as LCAs nasceram com o objetivo de ampliar as fontes privadas de financiamento do agronegócio, atuando de forma complementar ao crédito rural oficial. Posteriormente, passaram a integrar o Sistema Nacional de Crédito Rural e, hoje, são responsáveis por cerca de 35% do total financiado ao setor. Segundo ele, a proposta do governo pode ter efeitos de médio e longo prazo sobre esse volume.
“Quando o investidor deixa de ver vantagem nesses papéis, os bancos tendem a emitir menos LCAs. E, se houver menos emissão, haverá menos crédito disponível no campo. Isso atinge não só o custeio e a comercialização, mas também investimentos em aumento de produtividade”, alertou.
Wedekin também aponta que a mudança pode prejudicar a competitividade da LCA frente a outros ativos, como os CDBs. “Um grande banco, como o Itaú ou o Bradesco, faz a comparação entre produtos da própria carteira. Se o CDB paga 100% da taxa e tem liquidez diária, enquanto a LCA exige seis meses de carência e agora poderá ser tributada, a tendência é que ela perca atratividade. Intuitivamente, vai haver uma demanda menor pela LCA”, explicou.
A preocupação ganha ainda mais peso diante da proximidade do lançamento do Plano Safra 2025/26, previsto para as próximas semanas. Wedekin considera que a proposta de tributação pode encarecer ainda mais o custo do financiamento agrícola, que já enfrenta o desafio das taxas de juros elevadas. “O governo está diante de uma sinuca de bico. Não pode afetar negativamente o setor que mais cresce, que mais gera divisas e que mais investe em tecnologia e produtividade”, disse.
Para ele, o Congresso Nacional deve exercer papel fundamental nesse debate. “Acredito que haverá resistência no Legislativo. É uma medida que não faz sentido e que vai na contramão do fortalecimento do agronegócio”, concluiu.
O debate sobre a tributação das LCAs ocorre em meio às tentativas do governo de recompor a arrecadação e conter o avanço da dívida pública, mas o custo político e econômico dessa proposta pode ser alto — especialmente para um setor que responde por parcela expressiva do PIB, das exportações e da geração de empregos no país.