Entenda o impacto da Moratória da Soja para o produtor
Debate reacende questões sobre a soberania agrícola

Uma moratória que nasceu como solução emergencial pode estar aprofundando desigualdades e ameaçando a soberania alimentar do Brasil. Criada em 2006, a chamada Moratória da soja foi celebrada como um pacto entre ONGs ambientais, tradings internacionais e governo, visando conter o avanço da soja sobre a Amazônia. Mas quase 20 anos depois, especialistas apontam que o instrumento se distanciou de sua proposta original — e hoje impõe barreiras ideológicas ao produtor rural brasileiro, mesmo àqueles que cumprem a legislação.
Em artigo assinado por Charlene de Ávila e Néri Perin, advogados com atuação no direito agrário, a crítica é direta: a moratória transformou a soja em símbolo de uma pauta ambientalista que ignora o Código Florestal Brasileiro e marginaliza quem produz dentro da legalidade.
"Não basta produzir com responsabilidade. É preciso provar que a terra foi convertida antes de julho de 2008, sob pena de ter sua soja rotulada como maldita", escrevem os autores. Segundo eles, o impacto é severo principalmente para médios e pequenos produtores, que são impedidos de acessar mercados internacionais mesmo tendo áreas regulares e certificadas.
O artigo aponta ainda que o controle ambiental virou um mecanismo privado, conduzido por interesses internacionais e travestido de compromisso ecológico. As consequências vão além da exclusão de produtores: há efeitos diretos na oferta de insumos para a pecuária, encarecimento de ração e risco ao abastecimento alimentar.
"A moratória da soja já não combate o desmatamento ilegal — tarefa que cabe à lei brasileira. Combate, sim, a liberdade do produtor rural", afirmam.
Essa crítica ganha força em um momento em que o Brasil apresenta ao mundo seu modelo de produção sustentável, baseado em legislações rigorosas, como o Código Florestal. A restrição imposta por protocolos privados, muitas vezes mais rígidos que a própria lei, escancara o paradoxo: a agricultura brasileira, legal e produtiva, pode ser sacrificada em nome de um ambientalismo performático — mais preocupado com a imagem que com resultados reais.
O debate reacende questões sobre a soberania agrícola, a justiça social no campo e a forma como as decisões globais impactam diretamente quem está na ponta da cadeia. Afinal, quem deve decidir sobre o futuro da terra: o agricultor que planta ou o investidor que julga a colheita pela capa da revista?