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Papilomavírus infecta 60% do rebanho bovino


O Brasil tem cerca de 60% de seu rebanho contaminado por pelo menos um, dos seis tipos de vírus da papilomatose bovina, popularmente conhecida como "verruga" ou "figueira". Isso significaria que 100,5 milhões de cabeças, de um total de 167,5 milhões, estariam contaminadas. Esta foi a conclusão a que chegaram pesquisadores do Laboratório de Genética do Instituto Butantã, que há 25 anos pesquisa a doença, quando o Prof. Dr. Willy Beçak, ex-diretor do laboratório e seu atual coordenador-científico, deu início a estudos pioneiros sobre as conseqüências deste tipo viral.

Um panorama da situação foi apresentado na quarta-feira passada, no Fundo de Defesa da Pecuária do Estado de SP (Fundepec), na capital. Segundo a diretora do laboratório, Dra. Rita de Cássia Stocco dos Santos, chegou-se a esta porcentagem por progressão estatística. "Coletamos, ao longo desses anos, amostras em todo o País, analisamos em laboratório e, com base nisso, pudemos fazer o cálculo estatístico."

A papilomatose é considerada, até pelos pecuaristas, uma doença de importância secundária e não merece, por parte dos governos federal ou estadual, nenhum tratamento específico - ela não é doença de notificação obrigatória, como é a aftosa, por exemplo. Sua notificação pode ser feita, mas é voluntária. "Não se trata de doença econômica ou que afete o ser humano; não é considerada ameaça à saúde pública", diz o diretor do Departamento de Defesa Sanitária da Secretaria de Agricultura de SP, Otávio Diniz. "Não há nenhum plano de atacar diretamente o problema", conclui.

No Ministério da Agricultura, o chefe do Serviço de Informação Zoosanitária do Departamento de Defesa Animal, Gerson dos Santos Garcia, diz que a papilomatose não é objeto de programa específico e que os números de que o ministério dispõe "não refletem a situação real do campo". "Não é uma doença de tanta importância quanto outras, como aftosa ou brucelose", diz Garcia.

Saúde pública - Rita de Cássia alerta, porém, que a doença deveria ser considerada de importância econômica e de saúde pública, pelo risco de infecção cruzada, ou seja, a possibilidade de o vírus da papilomatose ser transmitido a outras espécies. "Nossos estudos, no Brasil, ainda não são conclusivos quanto ao risco ao ser humano. Mas na Grã-Bretanha há estudos comprovados, em que funcionários de abatedouros foram contaminados. Quanto a outras espécies, há comprovação de que o papiloma bovino tipo 1 contamina eqüinos e provoca a sarcóide eqüina, que causa a perda do animal."

Quanto às perdas econômicas no rebanho, é comprovado, segundo Rita de Cássia, que, instalada no animal, a infecção por papilomavírus se transforma, em conseqüência da baixa no sistema imunológico, na "porta de entrada" para outros tipos de infecções virais, como a leucose e a rinotraqueíte bovina, doenças nem sempre relacionadas à presença do papilomavírus. "Além disso, o consumo da samambaia-das-taperas pelo gado provoca neoplasias (câncer) nos sistemas urinário e digestivo dos animais, quando infectados pelo papilomavírus", diz Rita de Cássia. "Os papilomas provocam, também, perdas no couro do animal e interferem no rendimento das vacas leiteiras."

Vírus no organismo - Outras conclusões sobre a doença foram divulgadas este ano, por intermédio da tese de doutorado do veterinário Dr.Claudemir de Carvalho, da Universidade de Taubaté e também participante do grupo do Butantã. Carvalho chegou à conclusão de que as maneiras de transmissão do papilomavírus não se limitam apenas ao contato direto de animal para animal ou para algum objeto infectado, como se acredita. "Além da pele de bovinos, os vírus do papiloma foram detectados em espermatozóides, colostro, urina, placenta, líquido amniótico e sangue", diz Carvalho. "É possível, até, a transmissão vertical, ou seja, da vaca para o feto." Risco maior ainda de disseminação está no sêmen. "Neste caso, elevamos à progressão geométrica a capacidade de transmissão", diz Rita. Sob este aspecto, a pesquisadora alerta as centrais de inseminação, que podem estar usando sêmen contaminado sem saber e estar espalhando a doença.

Diante da gravidade do problema, Rita de Cássia insiste que deveria haver um acompanhamento mais efetivo da doença por parte do governo. "O Ministério da Agricultura deveria começar com a obrigatoriedade de notificação", sugere Rita de Cássia, acrescentando que testes podem ser disponibilizados a curto prazo, para serem feitos no campo. "Esses testes não se limitam apenas ao teste visual, mas também ao laboratorial, que detecta o vírus no animal, mesmo que ele não apresente papilomas", diz. "Como é inviável fazer testes em todo o rebanho, porém, sugerimos que pelo menos os reprodutores de centrais de inseminação sejam analisados, dado o potencial de transmissão do vírus pelo sêmen", completa. Outra medida importante seria a aplicação de uma vacina preventiva realmente eficaz, que, entretanto, ainda não existe no mercado. "Ela está sendo pesquisada pelo nosso grupo e será polivalente, ou seja, poderá imunizar os animais contra todos os tipos de papilomavírus, mas ainda está em estudo", explica Rita de Cássia.

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