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Lei de transgênicos é alvo de polêmica


A burocracia ainda predomina nas discussões sobre os produtos transgênicos. A lei de Biossegurança recém-aprovada na Câmara foi considerada como um pequeno avanço pelos agricultores, para quem houve melhoria em relação às pesquisas. No aspecto de plantio e comercialização de produtos alterados geneticamente, porém, ainda predominam os entraves. "As questões relacionadas ao plantio e venda de transgênicos ainda estão muito burocratizadas", diz Flavio Turra, técnico da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar).

Para Luiz Hafers, líder rural e ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), as forças contrárias à liberação dos transgênicos lutam muito para ganhar tempo, mas cedo ou tarde o Brasil acabará cedendo à tecnologia. "Ninguém segura a modernidade", diz. Em sua opinião o setor precisa deixar de lado as discussões radicais e políticas para passar para os temas técnicos e de impacto social.

Na opinião de Flavio Turra, a comunidade científica recuperou parte de sua importância em relação às discussões sobres os avanços tecnológicos. "A palavra final em relação ao material a ser pesquisado será da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio)", afirma o técnico. Mas em relação à comercialização, a decisão ficará a cargo do conselho Nacional de Biossegurança (CNBS), constituído por 15 ministros.

"Moratória branca"

O Departamento de Genética da Escola de Agricultura Luiz de Queiroz (DG/Esalq) tentará recuperar um atraso de quatro anos nas pesquisas com plantas geneticamente modificadas. A instituição espera a votação do projeto de lei de Biossegurança no Senado e a sanção do presidente da República para apresentar pelo menos quatro projetos paralisados há quatros anos.

A indefinição sobre o papel da CTNBio, o que a comunidade acadêmica chamou de "moratória branca", paralisou qualquer licenciamento para pesquisas e levou à perda de variedades geneticamente modificadas de cana-de-açúcar, batata e maracujá. Todas pesquisas buscavam melhoramento genético para dar resistência a doenças, a pragas e ampliar a produtividade destas culturas.

Uma pequena parte de plantas foi mantida em estufas durante o período de quarentena deste tipo de pesquisa, mas a maior parte foi destruída. "Vários genes foram perdidos. O atraso chega a quatros anos", diz Marcio de Castro, professor do Departamento de Genética da Esalq e um dos cientistas que estiveram durante a semana passada em Brasília para discutir o texto votado na Câmara.

Pesquisas paralisadas

"A lei restabeleceu a atuação da CTNBio", diz Elibio Rech, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Segundo ele, pesquisas transgênicas com feijão, mamão e batata resistentes a doenças estão paralisadas e poderão ser retomadas. O cientista informa são produtos com importância econômica para o mercado brasileiro e não - como muitos criticam - lavouras exportadoras como a soja. "Há oito anos o mundo consome soja e milho transgênicos e nunca foi detectado qualquer problema."

O professor de entomologia da Unesp/Jaboticabal (SP), Odair Aparecido Fernandes, tem a mesma opinião. "O retorno das pesquisas com transgênicos será de muita utilidade para o avanço biotecnológico", afirma o especialista.

Órgão consultivo

Na opinião de Marcio de Castro, professor da Esalq - que representou, nas discussões com os parlamentares, a Sociedade Brasileira de Melhoramento de Plantas e a Sociedade Brasileira de Genética -, a principal vitória foi a restituição do poder deliberativo à CTNBio. "Houve um ganho ao devolver à comissão o poder de deliberar sobre projetos e não apenas servir de organismo consultivo", afirma Castro.

Mas esta vitória ainda não é definitiva, alerta o cientista. Dois aspectos envolvendo a comissão preocupam a comunidade científica, segundo ele. O primeiro é o crescimento desta. Pelo novo texto, o organismo passa de 18 para 27 pessoas, mudança que ampliou a presença de membros não-técnicos. "Isso consiste numa contradição em relação ao próprio nome da CTNBio", diz. O número de cientistas subiu de 8 para 12, o de representantes dos ministérios de 7 para 9 e o de membros da sociedade civil de 3 para 6.

Para atender à comunidade científica criou-se então uma regra para inclusão de membros não-técnicos na comissão: todos deverão ter doutorado. "Essa decisão foi paliativa. Para uma comissão técnica defendíamos a presença exclusiva de cientistas com representatividade", afirma Castro. A preocupação dos cientistas é de que a CTNBio assuma um papel menos técnico do que deveria ter para deliberar sobre a manutenção ou não de pesquisas.

Para isso, a própria lei criou o Conselho Nacional de Biossegurança, um colegiado formado por 15 ministros que decidirá sobre projetos que tenham divergências entre a avaliação da CTNBio e os pareceres dos organismos técnicos dos ministérios da Saúde, do Meio Ambiente ou da Agricultura. "Há ainda dúvidas importantes sobre com que está a soberania para decisão. Isso terá de ser esclarecido, caso contrário não se define corretamente o marco regulatório para a pesquisa", afirma.

Para ele, a questão da comercialização dos produtos desenvolvidos também deve estar contemplada neste marco regulatório. Estas dúvidas deverão inibir investimentos privados para pesquisas com OGMs. "Nenhuma empresa irá investir em pesquisas caso corra o risco de enfrentar uma decisão final sobre o projeto não seja técnica, mas política", afirma.

Na Europa

O Reino Unido recebeu na última semana um parecer favorável para o cultivo de milho geneticamente modificado tolerante a herbicida. A liberação ocorreu após a divulgação, efetuada em outubro de 2003, dos resultados das Avaliações do Cultivo Comercial (Farm Scale Evaluations) realizadas com plantas geneticamente modificadas durante mais de três anos, segundo fontes do mercado.

De acordo com as pesquisas efetuadas pelo governo britânico, não há evidências de risco para o meio ambiente decorrentes do plantio do milho transgênico, em comparação ao convencional. Defensores dos transgênicos alegam que nos EUA, há muitos anos, as plantações de milho transgênico convive com o tradicional.

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