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Ajuda alimentar


Argemiro Luís Brum
No momento em que a ajuda humanitária vem à tona com o ataque israelense a navios que estariam levando alimentos, remédios e outros produtos de apoio aos palestinos da Faixa de Gaza, importante se faz analisar alguns aspectos que envolvem a chamada ajuda alimentar.
A mesma, embora pareça ser conveniente para aplacar a fome de países com dificuldades para produzir e obter alimentos provoca, em termos de mercado, dois movimentos questionáveis:
1) os países (geralmente EUA e União Europeia) que possuem excedentes agrícolas, usam do artifício da ajuda alimentar para garantir mercados, interferindo na lógica da formação dos preços mundiais e criando uma dependência direta e constante dos ajudados para com eles;
2) os países que recebem tal ajuda se acomodam com a mesma, deixando de desenvolver alternativas de produção própria, ficando na dependência estrutural do alimento que vem do exterior.
Paralelo a isso, existe uma disputa ferrenha entre as grandes companhias agroindustriais visando garantir que seus produtos componham os carregamentos de ajuda alimentar, fato que leva facilmente à corrupção em muitos locais. Hoje, a ONU, através do Programa Alimentar Mundial (PAM) alimenta 90 milhões de pessoas no mundo unicamente com ajuda alimentar.
Esta ajuda acaba sendo uma maneira de escoar excedentes, de forma subsidiada, por parte dos países ricos aos países pobres. Os EUA, por exemplo, exigem que as cestas básicas de ajuda alimentar sejam compostas exclusivamente por seus produtos.    
Ajuda alimentar (II)
Segundo fontes norte-americanas, 65% do orçamento destinado a ajuda alimentar é consumido com custos de transporte. Em troca, os EUA, a título de compensação, prevêem gastar, entre 2008 e 2012, apenas US$ 60 milhões em compras de produtos gerados pelos países pobres que recebem ajuda.
Um volume irrisório quando o total previsto em despesas ligadas às compras agrícolas seria de US$ 8,8 bilhões no período. Ou seja, instala-se um sistema protecionista de mercado mesmo no contexto da ajuda alimentar. Ao invés de destinar dinheiro para comprar a ajuda alimentar junto aos produtores rurais dos países auxiliados, viabilizando a produção local e a custos bem mais baixos, os países ricos preferem destinar os recursos para desovar seus estoques e produção, garantindo partes de mercado.
Assim, o sistema de ajuda alimentar se transforma num processo comercial protecionista, que não estimula a produção do país auxiliado, e retira possibilidade de outros países produtores colocarem seus produtos, mesmo mais baratos. Este debate ganha proporções ainda maiores quando se sabe que o orçamento mundial destinado a combater a fome deveria ser multiplicado por 30 vezes para satisfazer as necessidades do planeta. Por outro lado, a elevação dos preços internacionais dos alimentos, na esteira da especulação financeira, em nada ajuda a busca de uma solução.
Assim, na maioria dos casos, a ajuda alimentar disfarça uma forma de se conquistar mercados e gerar dependência. O que menos interessa aí é aplacar a fome de quem a tem!     

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