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Canais de notícias: credibilidade e publicidade


Antonio Carlos Moreira

ANTONIO CARLOS MOREIRA*

Profissionais da mídia e empresas dos diversos segmentos do mercado comemoram o recente anúncio. E com razão. O lançamento, no Brasil, da CNN, pioneiro e o mais influente canal especializado em notícias do mundo. A chegada confirma a importância do país no cenário mundial de TV por assinatura. Mais significativo: a consequência imediata é que a nova emissora agregará valor, acirrando a disputa, neste segmento de mídia que se aprimorou no Brasil nos últimos anos.

Assiste-se, por exemplo, documentários com nível do melhor cinema; algumas séries de reportagens lembram as grandes coberturas que fizeram história na Imprensa tradicional. O problema é que o público telespectador representa um número ainda aquém do que mereceria a qualidade desses conteúdos.

Ou seja, os canais noticiosos, como as demais plataformas de comunicação, estão diante de dois gigantescos desafios. E a estratégia de como irão enfrentá-los prenunciará o menor ou maior grau de sucesso dos players de notícias que disputam no line up das operadoras de TV.

 

 Mídias digitais: equívocos nos dois extremos

Um primeiro grande desafio está na esfera do Jornalismo, propriamente. Afinal, nas pautas e coberturas estamos diante da irrefreável concorrência com as novas mídias sociais. Uma das consequências imediatas da explosão das redes online foi tornar mais complexo para o público separar o trigo da nobre missão jornalística do joio das fake news.

De fato, a disruptive innovation, a ruptura criativa provocada pelas novas tecnologias alterou, dramaticamente, o conceito de público, que a teoria clássica da Comunicação chamou de “receptor da mensagem”. Mais do que mero receptor, seus smartphones capturando, por exemplo, flagrantes de imagens, os tornam coautores anônimos das notícias.

O novo cenário vem confundindo as estratégias de produção jornalística e de conteúdos diferenciados - seja impresso, radiofônico ou televisivo. Se não há novidade nesta constatação, vale notar como editores erram ao subestimar a força impressionante da plataforma de internet.

 

Receita em alta - nas mídias online

O segundo desafio se justifica diante da preocupante crise financeira que atinge grandes conglomerados de comunicação tradicional, jornais e revistas, no mundo e não seria diferente no Brasil.

Por outro lado, os investimentos em publicidade digital no Brasil, no ano passado, alcançaram expressivos 25,6%, de acordo com a pesquisa Digital AdSpend 2018, realizada pelo IAB Brasil, que acompanha a evolução desse mercado. A receita da propaganda na internet saltou de R$ 11,8 bilhões, em 2016, para R$ 14,8 bilhões, no ano passado. 

Trata-se, na verdade, de um fenômeno mundial: cerca de 20% de todo o investimento em publicidade no planeta já estão nas mãos de Google e Facebook. Diante desses números, não há como fugir da questão: para onde avançará a guerra pelos investimentos publicitários? 

A resposta não está no tipo de “veículo” que sairá vencedor – digital, impresso, radiofônico ou TV por assinatura. O olhar estratégico está em outros dois planos. Primeiro: as plataformas não se excluem – ao contrário, deverão estar cada vez mais integradas. Segundo: o conteúdo jornalístico continuará decisivo. Inclusive como elemento de atratividade publicitária.

 

Jornalismo versus Publicidade

Um equívoco persistiu, ao longo de décadas, no interior das empresas de mídia: o muro alto que colocou jornalistas e publicitários em mundos opostos. As direções e gestores das companhias de comunicação não o perceberam – ou mesmo o sustentaram.

De um lado, os jornalistas nos arrogamos com a missão intelectual de refletir as grandes questões humanas, sociais e políticas – e, se possível, influir sobre elas. Já assim se jactavam os publicitários – cuja premiada série americana Mad Men tão bem traduziu: eram os profissionais que encantavam milhões de pessoas, popularizavam marcas e produtos e traziam o capital que sustentava a empresa – e os jornalistas!

Com tamanhas desavenças, com frequência ocorria o seguinte: o departamento Comercial do veículo desconhecia oportunas pautas que os editores discutiam; já a Redação não participava do projeto especial elaborado pelo Comercial, que gerava uma bela, e rentável, campanha de branded content. Tão criativa que impactava o grande público a ponto de... virar notícia!

 

Os criativos e o desafio mercadológico

Sem deixar de cumprir sua missão de interpretar o mundo, muitos Editores começaram a observar mais atentos ao que ocorre no trade, esse tal “mercado”. Conhecer melhor o que pensam os executivos e CEOs; apontar, com veemência, os erros mas também as inovações e posturas positivas, atitudes responsáveis social e ambientalmente, das empresas. Não porque possam ser anunciantes, mas porque assim esperam nossos leitores e telespectadores.

“Quanto mais os salários caem, mais próximos os criativos deveriam estar dos seus clientes, dos seus problemas mercadológicos, do consumidor”, argumenta o publicitário Ruy Lindenberg, que foi das agências Leo Burnett, W/Brasil e DPZ e hoje dirige a Mar Comunicação. “Com isso, trariam mais inovação à comunicação para compensar a queda das verbas.” Lindenberg se referiu aos publicitários, mas tomo, aqui, a liberdade de incluir, com a mesma linha de raciocínio, os colegas jornalistas.

 

Credibilidade admirada

Aos editores de conteúdos de publicações e programas – a quem me dirijo mais à vontade por conhecer bem esse papel, em minha vivência de Redação – cumpre-nos atentar para as mudanças na forma como o público se relaciona com os veículos.

As novas gerações, que já haviam reduzido a leitura de jornais e revistas, assistem pouco à TV, segundo observa o jornalista Luiz Moura: “Esses jovens são expostos a outras referências, especialmente em dramaturgia, muito mais sofisticadas que os melodramas das telenovelas e filmes repetidos à exaustão.” Moura analisa a reviravolta nessa área. “A ponto de um filme como Roma, lançado apenas em plataforma streaming, receber nada menos que dez indicações para o Oscar. No jornalismo não será diferente.”

Os editores dos canais de notícia precisarão acompanhar esse novo tempo. Isso inclui, por exemplo, a tarefa de prospectar oportunidades para projetos de conteúdos diferenciados que agreguem legítimos resultados financeiros à organização que nos emprega. Tarefa, esta, tão importante quanto manter a qualidade e a credibilidade do Jornalismo pelas quais nos tornamos admirados.

 

*ANTONIO CARLOS MOREIRA foi repórter nas revistas Manchete e Veja; é especializado em Economia pela FIA Business School, e pela FIPE, Fundação Instituto de Pesquisas, ambas associadas à USP/SP; foi professor universitário e gerente de Comunicação Corporativa; dirige a consultoria SOMA Estratégica - Comunicação Corporativa.

 

 

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