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Coronavírus: observações econômicas (Final)


Argemiro Luís Brum

O mercado já considera “que devemos nos preocupar mais com o governo do que com o coronavirus”, sendo que há avaliações de que o mercado tenha caído “na real” quanto a capacidade do governo (leia-se o ministro Guedes) em avançar nos ajustes econômicos, pois a presidência da República atrapalha decisivamente o processo (cf. BBC News).

Dito isso, é importante salientar que nossa moeda está “hiperdesvalorizada”. Ou seja, considerando o cálculo de Paridade de Poder de Compra, que leva em conta a inflação dos EUA e do Brasil em determinado período de tempo, para manter o poder de compra do Real de junho de 1999, seis meses após a nossa entrada no sistema de câmbio flutuante, o Real deveria estar valendo hoje (já incorporando os efeitos políticos internos), ao redor de R$ 3,20 por dólar.

Caso encurtarmos o período e tomarmos o mês de janeiro de 2009, alguns meses após o estouro da grande crise de 2007/08, nossa moeda deveria estar hoje em R$ 3,70 para manter seu poder de compra de 11 anos atrás. Portanto, o que se vive no momento está fora da realidade cambial, muito alimentado pelo próprio governo, que parece desejar um câmbio nesta dimensão.

Uma terceira observação ligada ao evento do coronavirus é o fato de que a economia mundial, e a brasileira obviamente, devem crescer bem menos do que o esperado em 2020, com todas as consequências que advêm de tal performance. No caso mundial, a China já projeta um PIB de “apenas” 4,9%, após 6,2% em 2019.

A Zona Euro, também impactada pelo Brexit, ficará com tão somente 0,8% (nela, a Itália cresceria 0%). Os EUA recuariam para 1,9%, enquanto o conjunto da economia mundial ficaria em 2,4% (cf. OCDE). Em outras palavras, a economia mundial pode ter o pior ano desde 2009. Ou seja, a economia real também está sendo fortemente atingida, com a paralisação de indústrias mundo afora, sem falar na desorganização das cadeias de suprimentos e do setor de serviços (o turismo e o transporte aéreo são dois dos mais atingidos).

Neste contexto, o preço das commodities recuam igualmente, atingindo a economia de seus exportadores. E agora, acaba de estourar o conflito petrolífero entre Arábia Saudita e Rússia. Neste contexto, o PIB brasileiro, para o corrente ano, já está sendo revisto para baixo. Das expectativas iniciais de algo entre 2% e 2,5%, passados apenas dois meses do novo ano, já se cogita algo entre 1,4% e 1,9%. Decididamente, a saída da crise em que nos colocamos a partir de 2011, e que gerou a maior década perdida de nossa história, vai se confirmando muito lenta, devendo levar ainda alguns anos, endossando nosso sentimento de cinco anos atrás, quando a recessão eclodiu por aqui. E tudo isso, esperando que não se confirmem os prognósticos internacionais, cada vez mais evidentes, de que uma nova recessão mundial venha a se instalar em algum momento entre 2020 e 2024. 
 

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