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Impacto do MIP em Pinus para o controle da vespa-da-madeira, no Sul do Brasil


Edson Tadeu Iede
Edson Tadeu Iede*
Wilson Reis Filho**
Susete do Rocio Chiarello Penteado*
 
As plantações de Pinus spp. no Brasil representam um importante recurso ambiental e socioeconômico atual e potencial para o Brasil, face a participação que têm na cadeia produtiva da madeira, na recuperação de áreas degradadas e na geração de postos de trabalho. Os plantios de Pinus spp estão concentrados em uma área de 1.840.000 ha, sendo que 1,2 milhões localizam-se na Região Sul e estado de São Paulo, o restante está distribuído pelos estados do Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia e Pará, entre outros).
A ampla variação na adaptabilidade e crescimento das espécies do gênero Pinus, permite ganhos elevados em produtividade. As espécies originárias do sul dos Estados Unidos (P. taeda e P. elliottii) estão sendo muito utilizadas na região Sul do Brasil. Na região tropical do Brasil, espécies como P. oocarpa, P. caribaea caribaea, P. caribaea hondurensis, P. caribaea bahamensis, têm sido plantadas com a finalidade de produzir madeira para serraria e laminação.
A existência de extensas áreas contínuas de plantios de Pinus spp., no Brasil, oferecem condições propícias para a adaptação de pragas nativas e para o estabelecimento e dispersão de pragas exóticas. Desta forma essa pragas vêm causando problemas fitossanitários de grande importância.
A vespa-da-madeira, Sirex noctilio (Hymenoptera: Siricidae), é um inseto originário da Europa, Ásia e norte da África, introduzido acidentalmente no Brasil em 1988. É considerada a principal praga das plantações de pinus no país, atingindo pequenos, médios e grandes produtores, provocando a morte de até 60% das plantas. Encontra-se distribuída no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná e mais recentemente foi detectada em São Paulo e Minas Gerais. Por tratar-se de uma espécie exótica, introduzida sem o seu complexo de inimigos naturais, tornou-se uma séria ameaça aos plantios de Pinus spp no país.
Para reduzir os prejuízos provocados por esta praga e conter a velocidade de dispersão, a Embrapa Florestas elaborou, em 1989, um protocolo de pesquisa para estabelecer um programa de Manejo Integrado de Praga. Também em 1989 foi criado o Fundo Nacional de Controle à Vespa-da-Madeira (FUNCEMA), mantido por empresas florestais e que tem por objetivo dar o suporte financeiro ao desenvolvimento de todas as atividades do PNCVM. A Embrapa Florestas, em parceria com o FUNCEMA, desenvolveu tecnologias para monitorar, detectar e controlar a praga, e em função da adoção dessas tecnologias pelos produtores, a dispersão da praga foi retardada. O controle biológico, associado ao manejo florestal adequado, demonstraram ser efetivos no combate à praga.
O objetivo geral do projeto foi o de desenvolver um programa para a detecção precoce da praga e para monitorar a sua dispersão, além de estabelecer medidas de controle baseadas em métodos de controle biológico e silvicultural. Visou também difundir essas tecnologias de controle, com o mínimo de impacto ambiental e social, evitando-se também perdas econômicas.
As fases de pesquisa, desenvolvimento e validação, foram realizadas nos locais onde a praga manifestou-se no início da década de 1990, sendo que a fase de implementação das tecnologias já ocorreu, em cerca de 350.000 ha, nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. A medida em que a praga avança para áreas indenes, o programa vai sendo implementado, como estará sendo feito esse ano, em São Paulo e Minas Gerais.
O Programa de Manejo Integrado da Vespa-da-madeira envolve as seguintes atividades: 
I. Monitoramento 
Essa é a fase mais importante do MIP, tendo em vista que o monitoramento permite a detecção precoce e o imediato uso dos inimigos naturais para o controle da praga.
a) Detecção precoce/mapeamento da dispersão
Como o inseto é atraído, preferencialmente, para árvores debilitadas, esta fase do programa incluiu a utilização de árvores-armadilha. Para isso foram realizados testes para estabelecer as épocas de instalação dessas árvores- armadilha e testes de eficiência com diferentes herbicidas para o estressamento dessas árvores. Para o monitoramento, são utilizados quatro grupos de cinco árvores a cada 100 ha de plantio. As árvores devem ser estresadas com herbicida entre os meses de agosto e setembro. Isso permite que se tenha um sistema de monitoramento para se fazer a detecção precoce da vespa-da-madeira, em novas áreas e a imediata utilização das medidas de controle biológico. A tecnologia serve também para mapear a dispersão da praga, sendo amplamente utilizada em todas as áreas atacadas pela praga. 
b) Avaliação dos níveis de ataque
Como parte de um sistema de monitoramento, a definição da área atacada é essencial no programa de controle deste inseto. Esta fase do programa objetivou auxiliar no planejamento das atividades de controle. Para isso foi desenvolvida uma metodologia baseada na amostragem sequencial, a qual leva em conta a grande extensão dos povoamentos de pinus, os níveis de ataque da praga, a praticidade de aplicação do método e os custos da atividade. Assim, na amostragem sequencial, a amostra é dimensionada no campo, em função dos níveis de ataque, de forma a não ocorrer falta de precisão com tamanhos reduzidos e nem desperdícios com tamanhos excessivos da amostra. Da mesma forma que o sistema de árvores armadilha, essa tecnologia é usada de forma ampla pelos produtores.
II. Controle 
a) Preventivo
Uma das formas mais adequadas de se evitar os danos causados pela vespa-da-madeira é a sua prevenção. Isto é possível pela manutenção da sanidade dos povoamentos através da realização de desbastes, que evitam a excessiva competição entre árvores e o consequente estressamento das mesmas. Nessa operação é importante também o desbaste seletivo, retirando-se árvores danificadas por fatores bióticos e/ou abióticos, que são extremamente susceptíveis ao ataque da vespa-da-madeira. Por este motivo, é fundamental a realização de inventários florestais contínuos, para que se evite a estagnação da floresta e consequentemente o ataque da praga.
O transporte de madeira atacada para regiões sem a ocorrência da praga aumenta a probabilidade de dispersão do inseto, desta forma foi fundamental o estabelecimento de medidas quarentenárias dentro do programa, para evitar a rápida dispersão da praga pelo país.
b) Controle biológico
Esta também é uma fase muito importante e de grande impacto do processo. O nematoide Beddingia siricidicola, que esteriliza as fêmeas da vespa-da-madeira é o principal inimigo natural da praga. As primeiras culturas desses nematóides foram importadas da Austrália entre 1989/1990 e a tecnologia para sua produção massal, foi adaptada pela equipe do projeto no laboratório de Entomologia da Embrapa Florestas.
Este nematóide apresenta dois ciclos de vida: um de vida livre , alimentando-se do mesmo fungo simbionte da vespa-da-madeira e outro de vida parasitária, dentro de larvas, pupas e adultos do inseto. Pelo fato de apresentar o ciclo de vida livre alimentando-se do fungo Amylostereum areolatum, pode ser criado em laboratório e liberado no campo, através de sua aplicação em árvores atacadas por S. noctilio, podendo atingir níveis de parasitismo próximos a 100%. Os nematoides são distribuídos aos produtores com plantios de pinus atacados pela praga, na forma de doses de 20ml. Cada dose contém cerca de um milhão de nematoides. Com cada dose é possível tratar, aproximadamente, dez árvores.
Os nematoides são inoculados nas árvores atacadas pela praga, com o auxílio de um martelo especial, com o qual se faz orifícios a cada 30 cm, no tronco. Para isso, os nematoides são misturados a uma solução de gelatina a 10% e introduzidos nos orifícios feitos no tronco, com o auxílio de uma seringa ou frasco de molho. Agindo pela esterilização das fêmeas do inseto, atingem um nível médio de eficiência de 70%, podendo chegar próximo de 100%.
Após a inoculação os nematoides penetram na madeira em busca do alimento, o fungo, e reproduzem-se dando origem a nematoides juvenis de vida livre. No entanto ao encontrar as larvas de Sirex, os juvenis se desenvolvem em formas adultas infectivas e penetram nestas larvas deixando um cicatriz no tegumento. Dentro da larva, dobram em tamanho e quando ocorre a pupação do hospedeiro, dirigem-se para seu aparelho reprodutor e penetram nos ovários, esterilizando as fêmeas de S. noctilio. A fêmea adulta infectada emergirá da árvore e colocará ovos em outra árvore, no entanto, os ovos são inférteis.
O controle da vespa-da-madeira é realizado também pela utilização de parasitóides. Uma das espécies, Ibalia leucospoides, foi introduzida naturalmente junto com seu hospedeiro, e por apresentar uma dispersão muito boa, é encontrada em todos os plantios de pinus atacados pela praga, chegando a um nível de controle de 25%.
O Programa de MIP visa fundamentalmente o controle da vespa-da-madeira através do uso de medidas que, além de manter a população da praga abaixo do nível econômico de danos, não agridam o meio ambiente, sendo a Embrapa Florestas a única instituição no país que fornece esta tecnologia para o monitoramento e controle desta praga. 
Usuários do Programa
Os usuários deste processo são produtores de pinus, representados por cerca de 120 empresas florestais localizadas nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná que fazem uso desta tecnologia para o controle da praga, Essas empresas oferecem também assistência técnica aos seus fomentados, constituídos por pequenos e médios produtores rurais. Além dos produtores nacionais, o processo foi comercializado para a Argentina e Chile. Algumas empresas do Uruguai têm adquirido doses de nematoide e também contratado os serviços da Embrapa Florestas, para a realização de treinamentos e consultorias. Além disso, um contrato entre Embrapa Florestas e o Serviço Florestal Americano garantiu o repasse de recursos ao programa da ordem de U$ 85,000.00, em um programa de quatro anos. Atualmente um dos pesquisadores é membro do Comitê Científico dos Estados Unidos para o Controle de Sirex.
A equipe do projeto ministra, periodicamente, treinamentos a técnicos de empresas florestais, professores universitários e de nível médio, alunos, técnicos de órgãos públicos ligados à extensão e fiscalização, sobre técnicas de monitoramento e controle da vespa-da-madeira. São treinadas cerca de 300 pessoas anualmente.
Impacto ambiental
Em função da tecnologia constituir-se na eficiente forma de controle biológico da vespa-da-madeira, em todo o conjunto dos indicadores componentes do Ambitec-Agro¹, os impactos são positivos e ecologicamente desejáveis.
Merecem destaque o alcance da tecnologia nos aspecto da abrangência e influência, influência tecnológica, conservação ambiental, recuperação ambiental e, principalmente, na qualidade do produto que é a madeira de pinus para os diferentes fins. O comportamento favorável desses indicadores proporcionam um índice geral de impacto ambiental da inovação tecnológica de 2,15 que é ambientalmente desejável.
Conforme a avaliação do impacto econômico é importante ressaltar que o manejo integrado de pragas para a vespa-da-madeira, que envolve o monitoramento e o controle biológico associado ao controle silvicultural reduz a incidência de árvores atacadas pela praga representando retornos econômicos significativos aos silvicultores. Neste trabalho, com a metodologia desenvolvida por Avila e na área total abrangida pelo programa e informações de empresas florestais considerou-se que o manejo integrado evita uma perda média mínima de cerca de 5 árvores/ha que estimadas a 1,2 m3/árvore resulta numa produtividade média de 6 m3/ha. Essa produtividade pelo preço R$/m3 resulta no ganho unitário.
O programa iniciou em 1996 com a adoção da tecnologia em 150 mil hectares, e essa área aumentou até o ano de 2001 quando se estabilizou em 350 mil hectares até o ano de 2006.
No período de 1996 a 2006 o benefício do programa totaliza o montante de R$ 710.345,00 mil correspondendo ao retorno de 126,62 vezes o custo de R$ 5.610,00 mil . Cabe ressaltar dos respectivos benefícios econômicos 50% são atribuídos à Embrapa Florestas e 50% às Empresas Florestais parceiras do Programa.
Com mais produtividade e madeira de melhor qualidade, a tecnologia proporciona impactos sociais positivos nos aspectos do emprego, renda, gestão da administração no que se refere a assistência técnica, associativismo, filiação tecnológica o que, através das planilhas do Ambitec-Social, gera um índice de impacto social positivo de 2,4.
Apesar da tecnologia do manejo integrado da vespa-da-madeira não ter “Patente Protegida” apresenta impacto positivo nos demais indicadores relacionados ao conhecimento com destaque no nível de intercâmbio de conhecimento, palestras, cursos, treinamentos, técnicos e produtores treinados, publicações e o desenvolvimento de Teses de Mestrado e Doutorado.
Destaca-se que essa tecnologia passou a ser uma referência mundial no monitoramento e controle da praga em plantios de pinus. A Embrapa Florestas, foi destacada pelo Comitê de Sanidade Vegetal do Cone Sul (COSAVE) como o centro de referência para o monitoramento e controle de Sirex noctilio na regiâo. Com isso a tecnologia foi transferida para a Argentina e Chile e também foram enviadas doses de nematóides para o Uruguai. Em janeiro de 2006, a Embrapa Florestas, foi convidada à participar do Painel de Consultores Científicos de Sirex noctilio, do Serviço de Inspeção e Proteção de Plantas e Animais, do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA-APHIS).
A equipe do projeto interage com o curso de Pós-graduação em Entomologia, da Universidade Federal do Paraná, pela co-orientação de teses de mestrado e doutorado; com várias outras universidades, através do treinamento de alunos, pelo sistema de estágios, tanto de curta duração (um mês), como estágios de longa duração (dois anos); com o FUNCEMA, que representa o interesse de mais de uma centena de empresas; com órgãos públicos, como a Secretaria Nacional de Defesa Sanitária Vegetal, Secretarias Estaduais de Agricultura dos 3 estados do sul do Brasil, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente, Empresas de extensão Rural; com a Associação Gaúcha de Reflorestadores, Associação Catarinense de Reflorestadores e Associação Paranaense de Reflorestadores e com Sindicatos de madeireiros.
Em nível internacional, existe o intercâmbio com a Austrália (CSIRO, Universidade da Tasmânia e New South Wales Forest Comission) o Instituto de Controle Biológico-CAB da Inglaterra, com o USDA Forest Service, FAO-Roma, Chile (Servicio Agrícola y Ganadero, Corporaccion Nacional Forestal, Compania Controladora de Plagas Forestales), Argentina (Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuaria, Servicio Nacional de Sanidad Agropecuaria).
Na avaliação dos impactos sobre a capacitação e aprendizagem, a tecnologia apresenta-se altamente favorável em todos os indicadores componentes deste item. Isso se reflete positivamente nos aspectos da concepção do programa, parcerias, capacidade da equipe, capacitação externa, treinamentos, produção e entrega do nematoide proporcionando grande nível de satisfação aos produtores de pínus nesses 17 anos de trabalho participativo e conjunto da Embrapa Florestas e o setor florestal do Sul do Brasil. Outras evidências da importância da tecnologia sobre a capacitação e aprendizagem são o desenvolvimento de teses e as publicações sobre o controle biológico da vespa-da-madeira.
Impactos político-institucionais
É inegável o grande envolvimento e reconhecimento dos produtores florestais de pínus da região Sul sobre a importância do monitoramento e controle da principal praga que compromete a produção desse gênero florestal. Esse entendimento fica solidificado através das opiniões de conhecedores da tecnologia e que participaram dessa avaliação. Nessa avaliação constata-se que a tecnologia apresenta impactos muito positivo nos indicadores relativos a mudança no marco institucional da Unidade, serviu de base para a formulação de uma política pública que foi a criação do FUNCEMA, fortaleceu a cooperação entre a Embrapa Florestas e o setor florestal solidificando a melhoria da imagem da instituição que favoreceu a capacidade de captação de recursos tornando assim a tecnologia e a Unidade como referência em programas de monitoramento e controle da praga.
As ações governamentais necessárias para enfrentar essa praga com o estabelecimento do Programa Nacional de Controle a Vespa-da-madeira, permitiu que S. noctilio, fosse considerada uma praga quarentenária A2, ou seja uma praga com distribuição restrita e sob controle oficial. A implantação do sistema de monitoramento e controle e por medidas legislativas de inspeção e vigilância, propiciou o fortalecimento da defesa agropecuária e florestal brasileira, evitando-se perdas econômicas, ambientais e sociais, que poderiam ocorrer com os danos potenciais da praga. 
Para essa tecnologia ainda não se vislumbra qualquer alternativa de substituição por outra e, portanto, a continuidade de sua adoção depende do nível de controle da praga. Após o estabelecimento dos inimigos naturais e a adequação dos tratos silviculturais, especialmente os desbastes, o controle da praga se estabelece por toda a rotação e área onde foram aplicados os nematoides. Está sendo comprovado que em cerca de 90% da área onde a praga está presente, que com o estabelecimento dos inimigos naturais e a melhoria da silvicultura do pínus, há uma tendência do ecossistema tornar-se estável.
Ficou demonstrado que os benefícios econômicos são altamente significativos ao setor florestal e à sociedade. Os impactos ambientais e sociais do programa são positivos e, portanto, ambiental e socialmente desejáveis. A análise agregada dos impactos sobre o conhecimento, capacitação e político-institucionais na grande maioria dos indicadores, a tecnologia apresenta impactos altamente positivos e, portanto, desejáveis colaborando com a manutenção das parcerias e melhoria da imagem da Unidade. Adicionalmente cumpre ressaltar que a tecnologia além de ser uma referência no controle biológico da praga faz parte da relação de ações do Balanço Social da Embrapa.
¹Sistema de avaliação de impacto ambiental da inovação tecnológica agropecuária, desenvolvido por pesquisadores da Embrapa Meio Ambiente, que propõe avaliar impactos ambientais de inovações tecnológicas agropecuárias.

*Pesquisador da Embrapa Florestas
**Pesquisador da EPAGRI-SC/Embrapa Florestas

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