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Quanto custa para se produzir arroz?


Fernando Lopa

Nascido e criado no Rio de Janeiro, para mim arroz, carne, leite e farinha de trigo “davam” no supermercado, nunca, naqueles quase 32 anos, me perguntei como esses produtos chegavam no balcão.
Há seis anos atrás, quando cheguei, para trabalhar na atividade primária no Alegrete/RS, tinha a impressão, que trazia do Rio. O agronegócio comercial era a atividade mais rentável e prazerosa que podia existir, grandes propriedades, camionetes, cavalos, casas grandes, etc. e com sólidos conhecimentos que tenho na área administrativa e gerencial pensei: ”Vai ser barbada”.
No 1º mês fiz um levantamento de todo o negócio e comecei a perceber que a canoa do agronegócio era grande e confortável, mas que fazia água e não se podia tapar o buraco, apenas retirar a água que entrava. Daí, sem me alongar muito, comecei a querer saber o quanto custava para tocar o agronegócio, e no caso do artigo em questão, quanto custa para produzir arroz? Logo vi, que essa atividade primária é mais mecanizada e tecnificada do que as outras. Somas vultuosas de dinheiro são envolvidas e o retorno depende do bom humor do mercado, dos governos, dos fornecedores de insumos, da indústria, da justiça do trabalho, da Fepam.....
 Veja bem, para se entrar, hoje, no negócio, com alguma chance de ter retorno, você precisa plantar no mínimo 100 hectares (ha) e ter uma condição mínima de maquinário (sendo quase tudo já usado). Então, pegamos, como dizem, compramos uma lavoura e pagaremos, num bom negócio, com o produto da safra que ainda nem plantamos, pelo equipamento usado já existente.
Uma colheitadeira (R$ 120.000,00), um trator arrozeiro 125 hp (R$ 45.000,00), um trator 85 hp arrozeiro (R$ 25.000,00), uma plantadeira (R$ 10.000,00), um levante elétrico e canos (R$ 30.000,00), um “pacote de ferros” (grades, entaipadeira, valetador,  ferramentas...) R$ 25.000,00, 2 casas de madeira e um galpão pequeno (R$ 10.000,00) . Num total de R$ 265.000,00 para iniciar o negócio. Opa, já ia me esquecendo, a maioria desse maquinário foi usado na safra passada e precisa de uma revisão (R$ 15.000,00 no mínimo) e da “famigerada” camionete (R$ 20.000,00). Passamos então para R$ 300.000,00 . É isso mesmo! E só com material usado de mais de 5 safras.
Agora é só adquirir os insumos, contratar pessoal e tocar o negócio. Na safra 2004-2005, tivemos um custo mínimo por hectare de R$ 2.800,00, o que dá um total de R$ 280.000,00.
Bom, se plantar no tempo certo, se a chuva não atrapalhar, se o trator não quebrar, se não der frio na flor, se não der tormenta, se o raio não queimar o transformador, se a plantadeira não quebrar, se não faltar água, se não der granizo, se não der praga, se não der arroz vermelho, se não der causa trabalhista,... poderemos colher uns 7.000 kg/ha secos , disponíveis para venda (a média do RS gira em torno de 5.500 kg/ha). O que dá um total de 14.000 sacos de 50 kg para vender a R$ 20,00 (ou R$ 2,00 o saco de 5kg, do mesmo arroz que o consumidor, hoje paga R$ 6,00), gerando R$ 280.000,00 de receita. E como pagar os R$ 300.000,00 do investimento? Como buscar dinheiro para a próxima lavoura? E se o preço do arroz no próximo ano safra continuar baixo? E se a lavoura der problema? Peço aos leitores que me respondam...
Aprendi rapidamente que a lavoura de arroz exige competência técnica, sorte, política agrícola e uma boa gestão, nesse último caso, uma grande falha do produtor, ou melhor, do Brasileiro, afinal quantos negócios se abrem e se fecham todos os dias no Brasil por problemas de gestão. Ao arrozeiro, devido ao grande volume de recursos envolvidos (afinal o arroz é o grão que exige o maior valor de recursos por ha dentre todos os outros grãos) só resta “chorar”, pois seu negócio exige que ele esteja sempre alerta e constantemente fique a retirar a água da canoa (“fique a chorar”).
Na safra 2003-2004, até deu para pintar a canoa, colocar equipamentos novos, melhorar as acomodações, mas nessa safra a água começou entrar mais rápido do que se pode retirar e a canoa está querendo afundar.
No final de minha análise, tive que me render aos fatos e chegar a seguinte conclusão:
O arroz, como todos os grãos, é sinônimo de risco, mas é alimento de subsistência, por isso é um produto altamente protegido pelos governos em todo o mundo, se não plantarmos aqui e gerarmos emprego e renda, iremos trazer de fora pagando o que for necessário para obtê-lo,  hoje barato , amanhã... não sei!!!.
No Brasil... gostamos de ver artistas, jogadores de futebol, modelos, grandes banqueiros e industriais desfilando em carrões, roupas de grife e tirando férias no exterior, é lindo, usamos a sandália da fulana, o desodorante do ciclano, o cigarro do beltrano e achamos que estamos na moda. Não há sem-terra que não goste de ver um “Ratinho”, ver uma novela das oito, ter uma geladeira, assistir uma partida de futebol, um som, um carrinho, etc... Boa parte desse dinheiro reverte para os mesmos artistas, jogadores de futebol, modelos, grandes banqueiros e industriais, como prêmio (e com todo mérito) por nos ter dado satisfação ou tornado nossas vidas mais felizes. Porém, os que produzem alimentos, condição essencial para existência humana moderna, devem, no conceito de muitos, andar de pés descalços, roupas modestas e, de preferência, só sair da propriedade para comprar comida e os insumos necessários para produzí-la.
 Talvez seja hora, de dar o devido respeito aos que produzem, deixarmos de lado os preconceitos que tínhamos fruto dos anos 70/80, procurar estudar ou conhecer o setor, já se foi o tempo que se ganhou muito dinheiro no negócio, a globalização e abertura comercial impedem altas sucessivas do produto e a inflação aumenta a cada ano o custo do negócio.
É hora de ver que se quebramos os arrozeiros estaremos dando nosso dinheiro para os arrozeiros de outros países. Precisamos decidir se queremos deixar de fazer circular quase 50% do ICMS gerado nos municípios da Fronteira Oeste, com reflexo para o comércio e serviços municipais, se queremos aumentar a legião de desempregados, ou se devemos nos juntar aos Arrozeiros e brigar pelo direito de nossas cidades não ficarem mais empobrecidas.
Quanto custa para se produzir arroz? Acho que muito mais do que pensava antes de escrever esse artigo!!!!!

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