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Recuperação de voçorocas na bacia do Rio Paraíba do Sul


Alexander Silva de Resende

Recuperação de voçorocas na bacia do Rio Paraíba do Sul

Alexander Silva de Resende, Eduardo F.C. Campello & Avílio Antônio Franco Pesquisadores Embrapa Agrobiologia

A bacia do Rio Paraíba do Sul estende-se na Região Sudeste por cerca de 55.400 km² em terras dos Estados de São Paulo (13.500 km²), Minas Gerais (20.900 km²) e Rio de Janeiro (21.000 km²). O Rio Paraíba do Sul nasce na Serra da Bocaina, no Estado de São Paulo, a 1.800 m de altitude e deságua no norte fluminense, no município de São João da Barra.

A bacia está inserida na área de abrangência do bioma Mata Atlântica, reduzido hoje a 7% de sua extensão original no território brasileiro, em função de ciclos econômicos sucessivos de exploração do Pau-Brasil, cana-de-açúcar, café e atualmente, pastagem. Esta última é responsável pela ocupação de cerca de 70% das terras, sendo a maioria em elevado estágio de degradação, provocado pelas freqüentes queimadas, pelo pisoteio do gado em fortes declividades e por falta de respeito a capacidade de suporte das pastagens.

Segundo o Plano de Recursos Hídricos da Bacia do Rio Paraíba do Sul, realizado pelo Comitê para Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (CEIVAP, 2002), em parceria com a Agência Nacional de Águas (ANA) e a Fundação Coppetec da UFRJ (COPPE – UFRJ), 20% da área da bacia do Paraíba do Sul encontram-se em terras com alta ou muito alta vulnerabilidade à erosão, o que significa mais de um milhão de hectares. A região compreendida pelo chamado Médio Vale do Paraíba, desde Cruzeiro e Queluz, no trecho paulista da bacia, até a região de Vassouras, no trecho fluminense, é das mais críticas quanto à ocorrência de erosão acelerada, com muitas ravinas e voçorocas ao longo das íngremes encostas cobertas por ralas pastagens. A produção de sedimentos para o rio Paraíba do Sul nessa região é significativa e os resultados podem ser vistos na turbidez do próprio rio, assim como nos problemas de assoreamento dos reservatórios de Funil e do Sistema Light, que captam água para o abastecimento de 70% da região metropolitana do Rio de Janeiro, afetando diretamente, cerca de 8 milhões de pessoas. A estimativa é que desemboquem cerca de 588 t km2 ano-1 de sedimentos, nesse trecho da bacia (CEIVAP, 2002). Esse valor é cerca de 10 – 20 vezes maior que a média do restante da bacia. Embora não haja um levantamento sistemático das ravinas e voçorocas que ocorrem na região, acredita-se que esse grande volume de sedimentos é devido a ocorrência elevada dessas duas formas extremas de degradação. Voçorocas e ravinas podem ser entendidas como sulcos profundos de erosão, causadas normalmente pela associação entre a falta de cobertura vegetal, solos pouco estruturados e declividades acentuadas, que acarretam em erosão hídrica acentuada, causando grandes "crateras" nos morros. Em levantamento informal, acompanhando a estrada de ferro da MRS Logística, foram mapeadas 164 voçorocas no trecho Barra Mansa – Japeri, mas acredita-se que em toda a região o número exceda as 1000 voçorocas. Somente para fazer uma contextualização da gravidade do problema, considerando que uma voçoroca de tamanho médio tenha 2.500 m2 de área e 15 m de profundidade, pode-se inferir que, numa estimativa grosseira, 37.500 m3 de solo foram retirados do morro e levados para os cursos do rio, sendo esse valor equivalente a cerca de 40 mil toneladas, ou cerca de 4000 caminhões de aterro. Imagine agora que essa situação pode ser repetida 1000 vezes no trecho mencionado... Seriam 4 milhões de caminhões de aterro depositados no rio Paraíba do Sul.

Um aspecto que merece ser comentado diz respeito à barragem de Santa Cecília, no município de Barra do Piraí, cuja finalidade é atender ao desvio de 160 m3/s para o Complexo de Lajes - Light e ao sistema de captação de água do rio Guandu, que abastece a Região Metropolitana do Rio de Janeiro através do Sistema Light-Cedae. Informações locais registraram o já acentuado assoreamento a montante da represa, prejudicial ao bombeamento para a barragem de Santana, do complexo Lajes, no rio Piraí (CEIVAP, 2002). Segundo técnicos da Light, as dragagens no reservatório de Santana têm sua periodicidade aumentada em conseqüência do grande volume de sólidos transportados pelo bombeamento. Um assoreamento considerável do reservatório de Santana representa significativa perda de volume para amortecimento das cheias do rio Piraí. Assim, o relatório do CEIVAP (2002) recomenda o desenvolvimento de técnicas que possam minimizar o impacto da elevada produção de sedimentos na área, principalmente no que tange aos processos de ravinamento e voçorocamento. Em adição, este trecho apresenta-se como o mais vulnerável aos problemas relacionados à ocorrência de erosão, possuindo 50% de toda a área classificada com alta ou muito alta vulnerabilidade a erosão, destacando-se o município de Pinheiral com 88% da área total do município estando nas classes de alta ou muito alta vulnerabilidade a erosão, o maior índice entre todos os municípios fluminenses (CEIVAP, 2002).

Nesta situação fica claro que visando manter a qualidade da água a simples revegetação de matas ciliares pouco contribuirá para redução desse quadro, sendo necessário portanto, combater o principal problema que é a alta produção de sedimentos por estes processos erosivos. Em virtude dessa problemática, a Embrapa Agrobiologia em parceria com a Embrapa Solos e o Colégio Agrícola Nilo Peçanha, vem desenvolvendo há cerca de 5 anos, trabalhos de recuperação de voçorocas aliando técnicas físico-mecânicas (ordenamento de água e construção de paliçadas com material alternativo como pneu velho e bambu) com técnicas vegetativas (plantio de leguminosas arbóreas fixadoras de nitrogênio inoculadas com bactérias do gênero rizobium e fungos micorrízicos). A metodologia utilizada é simples e vem tendo resultados animadores após estes 5 anos e 2 voçorocas revegetadas. A redução da emissão de sedimentos por essas voçorocas é notória e o processo fica mais eficiente a cada ano, em função da maior cobertura vegetal e deposição de folhas e galhos depositados pelas árvores, que acaba formando uma espécie de "esponja", aumentando o tempo de permanência da água no solo e reduzindo os efeitos erosivos.

As seguintes espécies vem apresentando bons resultados na região: Acacia auriculiformis, Acacia holosericea, Acacia mangium, Mimosa bimucronata, Enterolobium contortisiliquum, Pseudosamaneae guachapele, Mimosa caesalpiniifolia, Mimosa artemisiana, Acacia farneziana, Schinus terebentifolium, Acacia angustissima, Mimosa tenuiflora, Mimosa velloziana.

Os custos envolvidos no processo de recuperação variam entre R$3.000,00 a 18.000,00 por voçoroca, dependendo do tamanho, necessidade de implantação de cerca para isolar a área da presença de bovinos e outros animais comerciais, dificuldade de acesso, mão-de-obra, distância do viveiro de mudas, área do entorno a ser revegetada, etc.

Os resultados do estudo vêm indicando que o uso do esterco bovino e da aplicação de fertilizantes pouco solúveis, aliado a manutenção de aceiros visando reduzir o risco de incêndios e combate a formiga são fundamentais para o sucesso da técnica. Já no primeiro ano é possível observar redução na emissão de sedimentos e a partir do terceiro obtém-se um efeito visual, reduzindo o impacto negativo da área degradada, pela presença de árvores que ajudam a dar um efeito paisagístico melhor ao local.

Reverter o processo e voltar o terreno ao formato original não é possível, mas a técnica impede que o processo continue a crescer, além de proporcionar uma cobertura vegetal tornando o ambiente bem mais harmônico.

Referências Bibliográficas

 CEIVAP – Comitê para integração da bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul – Diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos Volumes 1 a 8. Fundação Coppetec – UFRJ – Agência nacional das Águas (ANA). 1200p. 2002.

FRANCO, A.A.; RESENDE, A.S.; CAMPELLO, E.F.C. Introdução das leguminosas arbóreas na recuperação de áreas degradadas e na sustentabilidade de sistemas agroflorestais. In: SEMINÁRIO SOBRE SISTEMAS AGROFLORESTAIS E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, 2003, Campo Grande. Sistemas Agroflorestais e Desenvolvimento sustentável. Campo Grande: CNPGC, 2003. p. 1-24.

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