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Educação rural: um debate necessário


Aldalgiza Ines Campolin

Considerando os altos índices do êxodo da juventude camponesa nas últimas décadas e entendendo a educação como prática social e histórica, repensar a formação de jovens rurais é uma necessidade para todos que estão comprometidos com a construção de uma sociedade sustentável. A sobrevivência das unidades de produção familiar está relacionada também à fixação da juventude no campo, tendo em vista que  os filhos seriam os responsáveis em dar continuidade às atividades agropecuárias da família. Isto nos leva a refletir sobre a relação teoria e prática, educação e trabalho e, ao mesmo tempo, resgatar o significado que tem o trabalho nas condições de vida de jovens rurais.

Discutir a realidade da juventude rural hoje, implica um olhar mais atento às suas lutas, sonhos e angústias. Significa pensar nos problemas e nas perspectivas possíveis para essa parcela de jovens que se vê na fronteira entre manter-se no campo ou migrar para os centros urbanos à procura de melhores condições de vida.   No entanto, se ficar no campo significa encarar uma dura realidade de privações e de falta de perspectivas, migrar para as cidades traz outras sérias conseqüências como enfrentar o crescente desemprego, a pobreza e a violência.  Há ainda que se levar em conta o despreparo das jovens e dos jovens rurais, em termos profissionais, para competir no restrito mercado de trabalho urbano.

A herança profissional exerce papel fundamental na formação de jovens rurais, cuja identidade se constrói com base neste “saber profissional”, enraizado na tradição familiar. Desta forma, a atividade agrícola permite que os jovens e as jovens rurais construam um saber que, fundamentado na atividade prática produtiva da família, se transforma em saber científico à medida que, na agricultura familiar, faz-se necessário maximizar a utilização dos recursos disponíveis na propriedade de modo a garantir a reprodução da unidade camponesa. Isso ocorre através de estratégias variadas que incluem desde o aproveitamento dos excedentes até a busca de melhores índices de produtividade.  Para tal, os jovens e as jovens rurais buscam também os meios intelectuais presentes tanto no conhecimento recebido dos pais, principalmente os relativos à natureza e sua interferência no trabalho da terra, quanto novos conhecimentos adquiridos em outros espaços educativos, formais ou informais.

Portanto, não se pode alegar que o saber camponês seja um saber eminentemente prático, uma vez que abrange conhecimentos de geografia (clima, nuvens, ventos, etc.); físicos (topografia, solos, água, etc.), aspectos referentes à vegetação; aos animais, fungos, além de questões relativas ao mercado, políticas agrícolas e aproveitamento artesanal da produção excedente.  Todo este corpo de saberes vai sendo aos poucos ampliado com os novos saberes adquiridos em palestras, reuniões, cursos e, no caso dos jovens, também na escola, mesmo que esta não direcione seus conteúdos à realidade rural, os conteúdos gerais são significativos para a elaboração de uma visão ampla do mundo local e da realidade global.
 
Concluiu-se então que a vivência no campo permite às jovens e aos jovens desenvolver um saber próprio, fruto principalmente de suas experiências de vida e trabalho, mas que também se mescla com a educação recebida na escola e outras instâncias (Igreja, palestras diversas, associações de agricultores, televisão), o que demonstra a existência de um saber heterogêneo que, apesar de estreitamente vinculado à vida prática, permite a construção de sua identidade cultural e social.  Essa consciência de que existe uma realidade diferente da rural, mas que interfere nas suas condições de existência, demonstram que a educação, em todas as instâncias, propicia à juventude uma visão mais abrangente do mundo como um todo.

Observa-se que os jovens e as jovens vêm ampliando sua visão de realidade e perspectivas através de um conhecimento teórico vinculado à prática rural e que, de certa forma, começam a questionar os limites da tradição no cultivo da terra.  Esta reflexão desenvolve sua capacidade de avaliar desde questões relativas ao mercado para seus produtos até políticas agrícolas e as técnicas de cultivo desenvolvidas pelos pais. Nesse processo, os jovens e as jovens rurais refletem a interferência e importância do saber científico no seu cotidiano, evidenciando que seu conhecimento prático busca fundamento nas pesquisas mais atualizadas em relação ao trabalho no campo.

A Embrapa Pantanal, reconhecendo o protagonismo da juventude no processo de desenvolvimento sustentável da região, reforça o entendimento de que o elo teoria-prática, educação-trabalho é fundamental na busca de alternativas para a melhoria das condições de vida da população rural.

Repensar, então, o espaço ocupado pelo trabalho no processo de elaboração do conhecimento é fundamental, tendo em vista que, ao produzir as condições materiais de sua existência, o ser humano produz também um conjunto de idéias e representações que expressam um saber e uma consciência de sua situação histórica.  Neste sentido, a pesquisa agropecuária comprometida com a sustentabilidade dos espaços rurais pode tornar-se uma ponte entre o conhecimento operativo e o conhecimento científico, de forma que à experiência cotidiana das jovens e dos jovens rurais se agreguem as conquistas da ciência, viabilizando a construção de um novo espaço rural no qual a juventude possa desenvolver plenamente todo seu potencial.

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